Giovanna, a filha Luana e o saquinhos de doce que serão distribuídos nessa sexta (27)Arquivo pessoal
Publicado 26/09/2024 20:01 | Atualizado 28/09/2024 11:17
Rio – Dois santos, duas datas e uma só fé. Enquanto católicos compareceram à Paróquia de São Cosme e São Damião no Andaraí, Zona Norte do Rio, nesta quinta-feira (26), data que a religião reservou para tributos aos padroeiros, umbandistas e candomblecistas já pensavam nos doces, fosse para buscar ou distribuir nessa sexta (27), dia em que seguidores de religiões afro-brasileiras homenageiam as mesmas divindades — entenda as diferenças entre as datas no fim da página.
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Giovanna Palheta está na expectativa por mais um 27 de setembro, quando procura repetir o ritual de sempre para celebrar Cosme e Damião: "De manhã, antes de sair de casa, acendo uma vela com um copo d’água ao lado, encho um prato com doces e um copo de guaraná. Junto, coloco a imagem deles e as imagens das nossas entidades aqui de casa, os erês", descreve a moradora do Cachambi, também na Zona Norte.
Já à tarde, é a vez de fazer a alegria dos vizinhos – sobretudo, os pequenos – com a distribuição de doces, uma tradição que Giovanna, de 23 anos, aprendeu com a avó, Adélia Maria: "Distribuo saquinhos desde sempre! E quando minha avó era viva, dávamos um guaranazinho junto. Espero por essa data todos os anos. Essa dedicação transborda meu coração de amor", conta ela, esperando repassar o hábito para a geração a seguir: "Não tem chances de um dia parar, ainda mais agora que tenho minha filha Luana, de 2 anos. Muito legal poder passar isso a ela".
Quando Giovanna afirma que distribui doces "desde sempre", não é exagero, já que exercia a tradição ainda nos tempos de criança, quando também corria atrás de paçocas, marias-moles, suspiros e afins. Mas antes de acumular saquinhos, era preciso bater uma meta: "27 de Setembro sempre foi feriado para mim (risos). Mas minha avó só me deixava pegar doces depois que distribuísse os nossos na rua".
Identificação e pedidos
Assim como a tradição dos doces, Giovanna, naturalmente, também absorveu a devoção a São Cosme e São Damião por inspiração em dona Adélia Maria. Mas além disso, há outros motivos para a admiração por parte da biomédica e mãe: "Acho que também foi por terem sido médicos. E ainda por serem padroeiros das crianças, que são os seres mais puros, com o coração alegre. São sentimentos e estado de espírito que todo mundo precisa", observa a jovem, que nas noites de 27 de Setembro, participa de uma gira no terreiro para louvar a criançada.
E como todo devoto, Giovanna faz agradecimentos a São Cosme e São Damião, mas também promessas. Ela desconversa sobre quais foram, mas garante que o retorno nunca falhou: "Promessas não podem ser faladas, mas deixo como exemplo, a melhora de saúde de alguém. Cumpri todas essas promessas, graças a Deus, e assim, todos os meus pedidos foram atendidos. Não se brinca com as crianças (risos)".
Missas na paróquia e datas distintas
Já o estudante Victor Hugo Martins, embora agnóstico, levou a avó Iara de Oliveira a uma das várias missas realizadas, nesta quinta, na Paróquia de São Cosme e São Damião, para conhecerem o templo.
O jovem, de 24 anos, declara que a avó, de 82, não chega a ser uma devota dos santos, mas, mesmo católica, adere desde 1963 à tradição dos doces, mais ligada a religiões afro-brasileiras. E o motivo também tem a ver com o público mirim: "Distribuímos todos os anos. Ela gosta de fazer as crianças felizes".
Mas por que, afinal, há celebrações aos mesmo santos em dias diferentes? Até 1969, o dia de todas as religiões celebrá-los era 27 de Setembro porque os irmãos teriam morrido num dia como esse, muitos anos atrás.
Entretanto, a Igreja Católica promoveu uma mudança em seu calendário antecipando a data de Cosme e Damião para a véspera, a fim de não coincidir com o dia de São Vicente de Paulo, este, sim, morto, comprovadamente, num 27 de setembro.
Portanto, como a alteração partiu da Igreja Católica, adeptos de religiões afro-brasileiras seguiram com suas comemorações no dia 27, quando também é exaltado o orixá Ibeji, uma entidade infantil – mais um elo com a tradição da distribuição de guloseimas.
Mas, independente da data, o importante é a fé, o respeito à religião alheia e, por que não, os doces.
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