Funcionários foram encontrados dormindo em escritório de empresa durante o eventoDivulgação
Publicado 18/12/2024 20:19 | Atualizado 18/12/2024 22:20
Rio - O Ministério Público do Trabalho (MPT) concluiu investigação, nesta quarta-feira (18), indicando que 14 funcionários foram submetidos a condições de trabalho análogos à escravidão durante o último Rock in Rio. As vítimas foram resgatadas na madrugada do dia 22 de setembro, dia de fechamento do festival de música, que aconteceu no Parque Olímpico, na Barra da Tijuca, Zona Oeste. A Rock World, responsável pelo evento, repudiou as acusações.
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Segundo os procuradores da força-tarefa responsável pelo caso, os trabalhadores, que atuavam como carregadores, contaram ter passado por jornadas de trabalho de até 21 horas, das 8h às 5h e intervalos de três horas de descanso entre os turnos. Os funcionários eram contratados pela FBC Backstage que prestava serviços para a Rock World, empresa responsável pelo festival.
O pagamento desses trabalhadores, segundo a investigação, era feito por diária e o valor variava de R$ 90 a R$ 150, a depender do número de horas trabalhados. Por conta disso, alguns chegavam a dobrar o expediente e pernoitavam em escritório da empresa em escritório da empresa situado na Arena de Tênis do Parque Olímpico, dentro do festival. 
Papelões no chão
A investigação aponta que parte dos funcionários resgatados na madrugada do dia 22 dormia deitada sobre papelões e sacos plásticos colocados no chão. Segundo a procuradoria, foram encontrados cobertores no local, o que indicava que a prática era planejada.
Em relato aos auditores fiscais do Trabalho, algumas funcionárias contaram ainda que tomavam banho de canequinha no banheiro feminino e tiravam a maçaneta da porta, como forma de evitar que homens entrassem no local. O relatório aponta que as necessidades de higiene eram feitas em banheiros e vestiários da arena, onde foram encontradas roupas penduradas, além de sujeira e urina no chão.
Raul Capparelli, um dos auditores fiscais que atuaram na ação, falou sobre o resgate: “No momento em que encontramos os trabalhadores dormindo precariamente sobre lonas e papelões foi difícil acordá-los para as entrevistas, tamanho era o cansaço deles”.
Empresas autuadas
Por conta das irregularidades, a Auditoria-Fiscal do Trabalho lavrou 21 autos de infração punindo a empresa FBC Backstage Eventos Ltda, e 11 autos de infração em relação à Rock World. No caso da empresa responsável pelo festival, o entendimento foi de responsabilidade direta pelo trabalho análogo à escravidão, uma vez que houve negligência na "fiscalização do cumprimento da legislação trabalhista por parte da empresa contratada".

Ainda segundo o MPT, também foi solicitado o pagamento de três parcelas de seguro-desemprego aos trabalhadores. O órgão informou que fez diversas audiências e emitiu termo de ajustamento de conduta (TAC) para evitar que as irregularidades voltem a acontecer, além de cobrar a indenização por danos morais individuais e coletivos aos trabalhadores. 
Procurada pela reportagem, a Rock World afirmou que foi surpreendida pelas acusações do procurador do MPT e dos auditores-fiscais do Trabalho. No entendimento da empresa, as conclusões foram precipitadas, "desrespeitando o direito constitucional ao contraditório, ampla defesa e presunção de inocência, já que os fatos ainda estão sob o crivo de um processo administrativo recém iniciado". 
"A Rock World repudia as acusações de trabalho análogo a escravo e qualquer forma de trabalho que não respeite a dignidade do trabalhador, bem como destaca que inexiste até o presente momento qualquer fato desabonador de sua conduta que tenha sido comprovado após ser submetido ao devido processo legal", diz a nota. 

A empresa explicou que agiu prontamente notificando e tomando as medidas cabíveis contra a empresa Força Bruta, inclusive, garantindo que tanto Ministério Público do Trabalho quanto Ministério do Trabalho participaram das ações. 

"A Rock World instrui todas as empresas terceirizadas e fornecedores a realizarem os processos de contratação dentro da legislação brasileira e não admite qualquer ação que viole os direitos humanos", pontuou. (Confira a nota completa da empresa abaixo).
A Força Bruta Backstage foi procurada pela reportagem sobre as acusações, mas até o fechamento desta matéria não se manifestou. 
Casos anteriores no evento
Segundo o MPT, o resgate de trabalhadores não é inédito no Rock in Rio. No evento de 2013, 93 trabalhadores foram resgatados de condições análogas à escravidão em uma empresa do ramo de fast food. À época, foi verificado que uma empresa terceirizada cobrava pelo credenciamento, atraindo trabalhadores de diversas regiões do país.
Na edição de 2015, foram resgatados 17 trabalhadores, também de empresa que atuava com alimentação. Segundo o MPT, fiscais do Trabalho verificaram que a jornada era exaustiva e que os trabalhadores estavam alojados em comunidades de forma precária.
Nota da Rock World S.A:

"A Rock World foi surpreendida pela notícia de uma Coletiva de Imprensa, onde o Procurador do Trabalho (MPT) e Auditores Fiscais do Trabalho (MTE) lançaram sérias acusações contra a Rock World, de maneira precipitada, desrespeitando o direito constitucional ao contraditório, ampla defesa e presunção de inocência, já que os fatos ainda estão sob o crivo de um processo administrativo recém iniciado. A Rock World repudia as acusações de trabalho análogo a escravo e qualquer forma de trabalho que não respeite a dignidade do trabalhador, bem como destaca que inexiste até o presente momento qualquer fato desabonador de sua conduta que tenha sido comprovado após ser submetido ao devido processo legal.
No que se refere a denúncia relatada, tão logo a Rock World teve notícia dos fatos envolvendo alguns trabalhadores da empresa Força Bruta, agiu prontamente, notificando a empresa e tomando as medidas cabíveis, com a participação do Ministério Público do Trabalho e/ou do Ministério do Trabalho, que acompanharam as providencias adotadas após a denúncia, pela Rock World, a qual jamais se furtou a colaborar e assumir as responsabilidades cabíveis. A Rock World instrui todas as empresas terceirizadas e fornecedores a realizarem os processos de contratação dentro da legislação brasileira e não admite qualquer ação que viole os direitos humanos. Todos os trabalhadores nos eventos produzidos pela Rock World, empresa detentora do Rock in Rio, seguem padrões rigorosos de contratação e exigem:

* Profissionais próprios:

* Registro CLT

* Fazendo parte dos Programas de Saúde e Segurança do Trabalho da RW (PGR e PCMSO)

* Uso de Equipamento de Proteção em toda área do evento durante a montagem e desmontagem

* Vale alimentação e transporte

* Comprovação do vínculo jurídico civil ou societário quando aplicável

* Empresas terceirizadas são obrigadas (assim como subcontratados por eles):

* Registro CLT de toda equipe

* PGR - Programa de Gerenciamento se Riscos e Inventário de Riscos

* PCMSO - Programa de controle médico e saúde ocupacional

* ASO - exame admissional ou periódico

* Uso equipamento proteção em toda a área do evento durante montagem e desmontagem

Além disso, se empenha tomar todas as providências para que nenhum trabalhador seja prejudicado e tenha os direitos garantidos. Por isso, a Rock World não concordou com os termos apresentados no TAC proposto pelo Ministério Público do Trabalho e optou por não assiná-lo, na medida em que as irregularidades apontadas foram realizadas exclusivamente pela Força Bruta, empresa ativamente atuante no mercado de eventos, que mesmo assim, não caracterizam trabalho análogo a escravo.

Ao longo de 24 edições, 300 mil empregos diretos e indiretos foram criados e milhares de pessoas fora das Cidades do Rock foram beneficiadas por meio dos projetos sociais que o festival apoia, reafirmando os valores de pluralidade, comunidade, sustentabilidade e seu compromisso com a construção de um mundo melhor para todos.

Apenas na última edição do Rock in Rio de 2024, foram gerados mais de 32 mil postos de trabalho. Tais contratações foram distribuídas por 160 projetos de marcas e mais de 320 projetos de fornecedores, todos realizados e apresentados em mais de 30 mil documentos apresentados e analisados pelos órgãos competentes.
Por fim, a Rock World lamenta ter sido alvo de graves e precipitadas acusações, as quais, ao menos em tese, ainda podem ser desconstituídas após o desfecho do devido processo legal".
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