Samba-enredo à moda antiga: Laíla festeja qualidade das obras de 2016
Carnavalesco acredita ter resgatado a essência dos hinos que as grandes escolas levam para a Sapucaí
Por bianca.lobianco
Rio - Produtor musical dos CDs oficial do Carnaval desde os tempos de vinil, há impressionantes 48 anos, o carnavalesco Laíla, da Beija-Flor, rasgou elogios à safra de 2016 das escolas do Grupo Especial.
Defensor radical da tradição dos sambas de enredo, Laíla, ao lado do também produtor e parceiro Mario Jorge Bruno, acredita ter resgatado a essência dos hinos que as grandes escolas levam para a Sapucaí.
“Era uma briga antiga que a gente tinha com as agremiações, mas este ano o resultado me deixou muito satisfeito. As escolas tiveram muito cuidado com o andamento das baterias. Acabaram com conversões que prejudicavam a harmonia e, assim, temos a melhor safra, o melhor CD dos últimos anos”, comemorou.
Laíla explicou que pediu a compositores e mestres de bateria sambas mais cadenciados e melódicos, e mantivessem um andamento menos acelerado, abaixo de 145bpm (batidas por minuto), diferentemente do que vinha acontecendo.
Laíla%3A ‘Era uma briga que a gente tinha com as agremiações. Este ano o resultado me deixou muito satisfeito’Bruno de Lima / Agência O Dia
“A gente está tentando resgatar a qualidade do samba de enredo, que começou a ficar prejudicada por causa do andamento das baterias, e do regulamento que obrigava a uma criatividade que ninguém sabe onde está. Criatividade é fazer um tamborim bonito, é uma caixa bem tocada. Mas botaram na cabeça que o bom é paradinha, tolhindo a capacidade harmônica e melódica dos compositores”, explicou.
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Para o diretor da Beija-Flor, que está há 58 anos no Carnaval, as exigências que haviam no regulamento fizeram que compositores passassem a fazer obras para se encaixar no andamento da bateria, e não o oposto.
“Eles têm de fazer um belo samba. Apenas isso. É a escola tem de se adaptar a ele. É assim que se fazia no passado. E é assim que a gente costuma fazer na Beija-Flor. Quando fizemos diferente, deu errado”, ensinou.
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Laíla preferiu não se alongar em comentários ao resultado do júri do DIA, que elegeu o samba da Imperatriz Leopoldinense o melhor do Carnaval 2016, seguido de perto pelo do Salgueiro. A Beija-Flor terminou na sexta colocação. Para não perder a fama de mal-humorado, reclamou apenas das muitas notas 9.3 recebidas, sobretudo, pela Grande Rio.
“Não vou ficar discutindo isso a colocação das escolas no júri. Cada um acha o que quiser. Só acho que nenhum samba 9.3 coloca os pés na Avenida. Isso é sacanagem. Todas as escolas têm condições de fazer um grande desfile com os sambas apresentados”, defendeu.
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Criado no Morro do Salgueiro, o malandro batuqueiro que já há muito passou a bater tambor em Nilópolis, é uma enciclopédia ambulante quando se trata de Carnaval. E lembrou casos clássicos de sambas que prometiam uma coisa antes do desfile e se transformaram em outra na Avenida.
“Quem era capaz de dizer que o ‘Explode Coração’ do Salgueiro (1993) ou a ‘Paulicéia Desvairada’ da Estácio (1992) fosse virar o que virou? Em 1972, disseram que o "Alô, Alô, Taí Carmem Miranda" do Império Serrano era uma bosta e arrebentou na Avenida. "Os Sertões" da Em Cima da Hora, conquistou o Brasil e foi um fiasco na Avenida. Este ano já disseram que o samba da Vila Isabel era ruim. E é um sambaço. Ficou em terceiro no júri de vocês. Samba e Carnaval não é para qualquer um” ensinou o mestre.
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Mudanças também são aprovadas por historiador
O colunista do DIA Luiz Antônio Simas, com cinco livros publicados sobre Carnaval, concorda com Laíla. Para o historiador, a obrigatoriedade da bateria fazer paradinhas e outros quetais muitas vezes prejudica a escola e o samba de enredo.
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“Lembro de uma paradona feita certa vez pela Mangueira. Ora, a bateria tem que ser julgada pelo que toca, pela sua cadência e ritmo, não pelo que deixa de tocar. Acho que as baterias têm de ser mais melódicas mesmo, como faz a Beija-Flor, como a Portela passou a fazer e, algumas vezes, o Salgueiro. Para não matar o samba. A preocupação do Laíla é crucial”, diz Simas.
O historiador lembrou que na fase áurea das escolas de samba, cada agremiação tinha uma bateria com uma identidade muito peculiar, e que isto foi se perdendo com o tempo devido às “trocas de camisa” dos mestres de bateria. E quem também perdeu foi o Carnaval.
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“O mestre é quem deveria se adaptar à identidade da escola. E não a escola se adaptar ao estilo dele. Mas gostei das mudanças do Laíla. Só gostaria de lembrar que uma coisa é a cadência do samba no CD. Outra coisa é mantê-la na Avenida”, alertou Simas.