Por thiago.antunes

Rio - O DIA descobriu pelo menos mais dois casos de mortes após cirurgias feitas pelo médico Fernando Cesar Lamy Monteiro da Silva: Tatiana Langer, 29 anos, e Ana Márcia de Freitas Pimentel, 49. Com isso, subiu para sete o número de óbitos atribuídos por parentes ao ortopedista cassado pelo Conselho Regional de Medicina do Rio (Cremerj) e que continuou a exercer ilegalmente a profissão.

Mariza ficou de cama dois anos após ser operada por Lamy. Outro médico a fez andar de novo%2C ainda de muletaCarlo Wrede / Agência O Dia

A polícia ainda está apurando se uma mulher que morreu durante a internação, no pós-operatório, citada em depoimento pelo anestesista Alexandre Baroni , é uma das identificadas ou se trata da oitava vítima. No depoimento ao Cremerj, Baroni não identificou a pessoa morta, nem disse a data da cirurgia.

Cinco casos de pacientes que ficaram com sequelas físicas depois de ser operados por Lamy também estão no inquérito da 26ª DP (Todos os Santos). A primeira delas é Mariza Terra Nunes Ribeiro Pinho. Ela passou por cirurgia de hérnia de disco em 2007 e ficou com paralisação da perna esquerda devido à queima do nervo ciático, com laser.

Steffano Bulhões saiu da mesa de cirurgia do Hospital Espanhol, em 2007, com rompimento dos nervos fibulares com total imobilidade do pé, após operação que deveria ter reparado ruptura dos ligamentos do joelho. Suely da Silva Gomes também acusa o médico. Submetida a um procedimento por sofrer de artrose de coluna em abril de 2012, no Hospital do Amparo, ficou inválida e passou a fazer uso de fraldas.

O advogado Romário Gonçalves Coelho Neto saiu do centro cirúrgico sem os movimentos de parte do corpo. Alessandro Fabiano de Araújo ficou paraplégico depois de Lamy operá-lo da coluna. A instrumentadora Maraisa dos Santos disse ao Cremerj que um paciente, após sair do centro cirúrgico, ficou com problemas de ereção e sem andar — elevando para seis os pacientes com lesões após cirurgias com Lamy.

Entre o material apreendido pela polícia no consultório de Lamy tem o carimbo de um outro médico. O advogado João Carlos Ferreira, que defende o médico, disse ontem que o ortopedista está em casa, deprimido e que buscará tratamento psicológico. Disse ainda que terá acesso aos autos na delegacia.

Morte antes da segunda cirurgia e na mesa de operação

A jornalista Fernanda Pimentel, de 31 anos, perdeu a mãe, a bancária Ana Márcia de Freitas Pimentel, 49 anos, em 13 de junho de 2008. De acordo com ela, Ana Márcia foi operada por Fernando Lamy no fim de abril do mesmo ano, no Hospital Quinta D’Or. O médico operou duas partes da coluna dela no mesmo dia — cervical e lombar. Segundo especialistas ouvidos pelo DIA, as duas operacões não poderiam ser feitas no mesmo dia. O prazo recomendado é de três a quatro meses, em média.

“Um mês depois da cirurgia, minha mãe mal levantava os braços e sentia dores horríveis. Lamy encheu minha mãe de morfina e marcou uma segunda cirurgia, de reparação, para 13 de junho. Mas ela não resistiu e morreu horas antes, de parada cardíaca”, lamenta Fernanda, que decidiu agora registrar o caso na delegacia.

A estilista Tatiana Langer, 29 anos, também foi operada por Lamy e morreu na mesa de cirurgia em 30 de novembro de 2007, na Clínica São Lucas, no Humaitá. Segundo a mãe dela, a artista plástica Rosane Albuquerque, 63 anos, a causa da morte no atestado de óbito foi falência múltipla dos órgãos. “Médicos do hospital abriram sindicância para apurar a morte e concluíram, num relatório, que uma veia importante havia sido cortada indevidamente e que Lamy não conseguiu estancar a hemorragia”, revela Rosane.

A mãe da vítima processou Lamy na Justiça, por danos morais e materiais, e ganhou, ano passado, a causa: 300 salários mínimos (R$ 217 mil). Mas até hoje Rosane não viu um tostão sequer.

1 - Mariza Terra Nunes Ribeiro Pinho 

A psicóloga de 61 anos diz ser vítima do ortopedista Fernando César Lamy Monteiro da Silva. Ela foi operada por ele em 8 de maio de 2007 para tentar curar hérnias de discos na coluna, no Hospital Santa Martha, em Niterói. “O procedimento cirúrgico, que duraria menos de meia hora, conforme o médico (Lamy) prometeu, se estendeu por quase seis horas. Saí de lá com a perna esquerda paralisada. Segundo exames feitos posteriormente, houve rompimentos de ligamentos na coluna e queimaduras a laser no nervo ciático”, lembrou a psicóloga.

Mariza passou dois anos de cama e teve que se submeter a nova cirurgia, com outro médico. “Só agora estou conseguindo dar os primeiros passos, mesmo com muletas. Mas a dor intensa continua o dia inteiro, até hoje, e por isso não me esqueço desse médico 24 horas por dia”, disse, revoltada.

No centro cirúrgico, Mariza disse ter ficado com medo logo no início da operação. “Lamy exalava forte cheiro de álcool e comentou que naquele dia sua filha fazia aniversário e que à noite tomaria um vinho. Eu disse: ‘Mas doutor, acho que o senhor já tomou, pois está um cheiro forte de álcool aqui’. Aí ele respondeu: ‘Não, estou passando álcool nas suas costas’. Hoje, tenho quase certeza: ele deve ter me operado bêbado”, afirmou. A psicóloga moveu ação contra Lamy. O processo está em curso e o relato dela também consta em inquérito da 26ª DP (Todos os Santos).

2 - Alessandro Fabiano de Araújo

As intervenções cirúrgicas do ortopedista Fernando César Lamy Monteiro da Silva podem ter causado, além de danos morais e psicológicos, sequelas físicas permanentes em outros pacientes. É o caso de Alessandro Fabiano de Araújo. Ele conta que ficou paraplégico depois de operação feita por Lamy. No inquérito que tramita na 26ª DP, Araújo detalha que chegou bem ao Hospital Rio de Janeiro, em Vila Valqueire, de moto e conduzindo a esposa.

“Estava com dores na coluna e Lamy me garantiu que sairia andando normalmente no dia seguinte. Fui operado, fiquei internado, imobilizado e sentindo fortes dores por vários meses, até que outro médico se compadeceu de mim e, em novos exames, constatou graves erros no procedimento cirúrgico. Tive que fazer nova cirurgia. Até hoje sofro dores e ando com dificuldade”, relatou no inquérito.

3 - Steffano Bulhões

Também está indignado e afirma que caiu na promessa de cirurgia e recuperação rápidas feitas por Lamy. Devido à intervenção equivocada no joelho esquerdo, conforme teria ficado provado em exames posteriores, Bulhões, hoje com 45 anos, teve comprometimentos de movimento na perna, por causa de rompimento dos nervos fibulares, que deixaram seu pé imóvel. Não pode trabalhar.

4 - Romário Gonçalves Neto

O advogado também sofre até hoje e atribui a uma cirurgia feita por Lamy em abril de 2013, para a correção de hérnia de disco cervical, no Hospital Vital da Tijuca. “Perdi os movimentos de parte do corpo. Na época perguntei ao médico o que aconteceu e ele respondeu que era mero desconforto da anestesia”, relatou Romário na 26ª DP.

5 - Suely da Silva Gomes

Dezoito horas da última quarta-feira e a comerciária Suely da Silva Gomes, 57 anos, chora de dor em cima de uma cama. Moradora de São Gonçalo, ela pode ser outra vítima do médico cassado pelo Cremerj. Suely teve a coluna e necessidades fisiológicas comprometidas. Usa fraldas e está inválida.

“Entrei no hospital (do Amparo, no Rio Comprido) em 30 de abril de 2012, de salto alto, com a promessa dele (Lamy) de que iria sair curada no dia seguinte, com uma cirurgia revolucionária, sem rasgar a pele. A promessa era de que a operação duraria 20 minutos, mas só terminou depois de seis horas. Desde então, nunca mais andei. Esse médico acabou com minha vida. É um psicopata que precisa ser tirado da profissão”, desabafou.

A paciente chegou ao hospital com o diagnóstico de artrodese na cervical. “Saí com uma cicatriz de 20cm e 22 pontos e nunca mais andei. Já tinha operado o joelho esquerdo com ele, e por isso confiei na nova intervenção. Me arrependo até hoje”, lamentou Suely, que recebe um salário mínimo por invalidez do INSS. “Só de remédio e fraldas gasto mais de R$ 900 por mês”, contou.

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