Por thiago.antunes

Rio - Pelo menos cinco traficantes já foram indiciados pela Polícia Civil como mandantes e participantes de ataques em série a terreiros de religiões de matriz afro-brasileira, especialmente Umbanda e Candomblé, no estado. Os suspeitos seriam ex-presidiários, que teriam se convertido a outras denominações religiosas atrás das grades. Os responsáveis pelas investigações não dão informações para, segundo eles, não atrapalhar a prisão dos envolvidos.

Ontem , agentes da 58ª DP (Posse) teriam identificado e até trocado tiros com integrantes de uma quadrilha que promoveu sete ataques só em Nova Iguaçu nas últimas semanas, conforme O DIA denunciou.

Em menos de um mês, o Disque Combate ao Preconceito já recebeu cerca de 30 denúncias de terreiros de Umbanda e Candomblé destruídosFOTOS%3A WHATSAPP O DIA

“Em reunião com representantes da cúpula da Secretaria de Segurança e chefia da Polícia Civil há alguns dias, fui informado que cinco traficantes já foram indiciados por esse tipo de crime”, afirmou o deputado estadual Carlos Minc. Em seu perfil no facebook, Minc lembrou que, há dois anos, denunciou à Procuradoria-Geral de Justiça, que traficantes que se converteram a religiões evangélicas nas cadeias que estariam ordenando o fechamento de terreiros de Candomblé e de Umbanda, nos complexos do Alemão e Maré, no Morro do Dendê, na Ilha do Governador, e em Nova Iguaçu.

O traficante Fernando Gomes de Freitas, de 38 anos, o Fernandinho Guarabu, que comanda há 13 anos o tráfico de drogas na Ilha do Governador, e segundo investigações, se auto denomina “traficante evangélico”, seria um dos indiciados. Guarabu é líder do TCP (sigla de uma facção criminosa), que lidera ataques com antigos inimigos e agora aliados de outra facção.

Sacerdotisa foi obrigada a destruir altar%2C enquanto traficante filmavaReprodução

Ontem, mais um vídeo circulou pelas redes sociais, causando mais apreensão entre os religiosos. Nas imagens, um suposto traficante ordena uma sacerdotisa a destruir o próprio templo de oração, que seria no Morro do Dendê.

O homem manda a mulher destruir tudo. “O 'capeta chefe' tá aqui, quebra tudo. O sangue de Jesus tem poder. Todo mal tem que ser destruído em nome de Jesus... Quebra! Arrebenta esse demônio que tá aí”, brada o agressor.

Aparentemente, conforme investigações, a voz seria a mesma de outro vídeo que viralizou no dia anterior, onde um sacerdote, obrigado a vestir uma camisa com o rosto de Jesus Cristo, aparece inutilizando guias, conhecidas também como cordões de santos, que restaram de um altar totalmente destruído pouco antes, sob ordens de um traficante.

“Da próxima vez eu mato. Que bandeira branca é essa? Bandeira aqui é do TCP , p*, ou de Jesus Cristo”, ameaçou.

Ontem, à tarde, 43 deputados estaduais aprovaram Moção de Repúdio aos ataques, de autoria de Luiz Martins (PDT) .

O secretário de Direitos Humanos e Políticas para Mulheres e Idosos, Átila Alexandre Nunes, informou que, até ontem, umas 30 denúncias de templos destruídos em menos de 20 dias foram feitas pelo Disque Combate ao Preconceito (21-2334 9551). “Todas estão sendo investigadas”, garantiu, reafirmando que, como O DIA revelou, a criação Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi) deverá ser antecipada para as próximas semanas. O delegado mais cotado para assumir a titularidade da nova unidade é Orlando Zaccone, ligado a causas sociais.

Protesto está marcado no domingo

A motivação da onda de ataques a terreiros de Umbanda e Candomblé divide opiniões. Para Ivanir dos Santos, da Comissão de Combate à Intolerância Religiosa, que promoverá a 10ª Caminhada em Defesa da Liberdade Religiosa domingo, às 13h, em Copacabana, não há dúvidas de que “traficantes travestidos de evangélicos” estão por trás dos casos.

“Segundo o Disque 100, em quatro anos foram registrados 131 casos de intolerância, a maioria no Estado do Rio. É preciso ações conjuntas e urgentes”, defendeu. Por meio das redes sociais, líderes religiosos, como o arcebispo do Rio, dom Orani Tempesta, e Marco Oliveira, do Movimento Negro Evangélico, fizeram convocações para a caminhada.

A antropóloga, professora e mãe de santo Rosiane Rodrigues, pesquisadora das religiões afro-brasileiras e especializada no estudo de relações étnico-raciais, por sua vez, diz que o assunto está ganhando maior visibilidade agora, mas que os ataques a terreiros ocorrem desde 1988. Ela também não concorda que a os sucessivos ataques estejam ligados à intolerância.

“O que estamos presenciando são ataques terroristas orquestrados”, advertiu. Rosiane defende que ao invés da criação da Decradi, “as autoridades deveriam prender os agressores e a Justiça fazê-los cumprir as penas das leis contra intolerância e discriminação que já existem”. Ela também criticou a eficácia da caminhada contra a intolerância.

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