Brasília - A sensação de que o mandato presidencial está por um triz aumenta a cada minuto. Nesta terça-feira, pouco depois das 18h30, a presidente Dilma e o ex-presidente Lula sofreram um duro ataque desferido pelo juiz Sérgio Moro e o governo mergulhou na fase mais aguda da crise política que se arrasta desde o começo da Lava Jato.
Moro divulgou conversa telefônica entre Dilma e o ex-presidente Lula, captada no final da manhã. No diálogo, a presidente avisa ao companheiro que um emissário irá lhe enviar o termo de posse no governo e que ele pode usar o documento em caso de necessidade. Lula acabara de aceitar o convite para assumir a Casa Civil.
Os investigadores da Lava Jato interpretaram o diálogo como um indício de que a presidente da República nomeara Lula ministro da Casa Civil para livrá-lo das garras da investigação em Curitiba. “Numa sociedade democrática, os governados precisam saber o que os governantes fazem mesmo quando tentam agir protegidos pelas sombras”, justificou Moro, em nota oficial, sobre o vazamento das gravações.

O caso ecoou em passeatas e panelaços em 15 estados e na aceleração do processo de impeachment na Câmara - a comissão especial que irá julgar a cassação será instalada hoje. O clima também esquentou na Praça dos Três Poderes - milhares de manifestantes pediram a saída de Dilma. Na mesma toada, no plenário da Câmara, deputados oposicionistas vararam a noite pedindo a renúncia. Ainda na noite de ontem, o ex-presidente Lula resolveu retornar para Brasília — ele já estava em São Paulo.
O agravamento da fragilidade do governo foi admitido até por gente muito próxima à presidente. “A situação nunca foi tão séria”, desabafou um ministro de Estado. “O vazamento das conversas é uma arbitrariedade”, emendou o ex-ministro-chefe da Casa Civil Jaques Wagner, ontem nomeado chefe da gabinete de Dilma para ser substituído por Lula na Casa Civil.
“Esse vazamento é uma afronta a direitos e garantias da Presidência da República e uma flagrante violação da lei e da Constituição da República, cometida pelo juiz autor do vazamento”, acusou a nota oficial da Presidência da República.
“O grampo numa presidenta da república é um fato muito grave. Nós entendemos que esse ato está estimulando uma convulsão social e isso não é papel do Poder Judiciário”, criticou o advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins. “Já não existe competência da Vara de Curitiba”.
NOVO GOVERNO
O dia começou com um café da manhã no Palácio da Alvorada, em Brasília, onde o ex-presidente Lula acertou os detalhes de sua entrada no governo. No início da tarde, numa nota de 13 linhas, a Presidência oficializou a mudança no ministério. Em poucos minutos, as redes sociais explodiram em comentários. Quase todos na mesma direção: a gestão Dilma chegara ao fim e Lula começaria seu terceiro mandato. Petistas comemoraram. Oposicionistas lamentaram.
Aplausos e críticas só cessaram no começo da noite quando o Brasil parou para ouvir as gravações divulgadas por Moro. O juiz liberou o sigilo de todas as conversas telefônicas de Lula com os principais nomes da República. Numa dessas ligações, a presidente telefona para o motorista de Lula que passa o aparelho para o ex-presidente. Era a manhã de ontem. Começa então o diálogo:
— Dilma: Alô
— Lula: Alô
— Dilma: Lula, deixa eu te falar uma coisa.
— Lula: Fala, querida. Ahn
— Dilma: Seguinte, eu tô mandando o 'Bessias' junto com o papel pra gente ter ele, e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse, tá?!
- Lula: Uhum. Tá bom, tá bom.
- Dilma: Só isso, você espera aí que ele tá indo aí.
- Lula: Tá bom, eu tô aqui.
Conversa dura com Dilma
Em conversa gravada pela Polícia Federal na semana passada, o ex-presidente Lula conta que teve uma “conversa dura” com a presidente Dilma Rousseff de que está “tudo errado” e que o discurso do atual governo “não vai para frente”. A conversa foi com o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE).
No diálogo, o deputado queixa-se do estilo da presidente, “avesso à política” e “muito burocrático”, e que afetaria a relação com aliados e oposição no Congresso. Neste momento, Lula diz concordar com o deputado. “Eu tive uma conversa com ela muito dura. Falei para ela: ‘Gente, tá tudo errado, o discurso de vocês não vai para frente. Vocês querem agradar os inimigos e jogar nosso povo no lixo”, afirmou o ex-presidente. “Sabe, tem que falar pro nosso povo”.
Em outra gravação, no dia 7 de março, Lula pediu ao ministro da Fazenda, Nelson Barbosa, que acompanhasse a atuação dos servidores da Receita Federal na busca e apreensão em seus endereços, realizada na última fase da Operação Lava Jato. A transcrição da conversa feita pela Polícia Federal foi anexada aos autos da quebra de sigilo telefônico.
Lula diz que “eles estão sendo fdp demais” e que estavam “procurando pelo em ovo”. O ex-presidente inclusive sugere que Nelson Barbosa reclamasse com os servidores sobre a ação.