Publicado 02/05/2021 06:00
Atual diretor da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Wagner Victer é engenheiro, administrador, ex-secretário de Estado de Energia, Indústria Naval e do Petróleo e ex-secretário estadual de Educação, ex-presidente da Fundação de Apoio à Escola Técnica (Faetec). Victer foi presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), onde ficou por oito anos. "É lícito ressaltar que a sociedade vai perder muito com a privatização da Cedae, pois as tarifas irão aumentar. Um bom exemplo dessa estratégia equivocada é que governos liberais como São Paulo, o Doria, não fala em privatizar a SABESP, e o Romeu Zema, em Minas, também não fala em privatizar a COPASA, suas estatais de Saneamento", comentou Victer nesta entrevista ao jornal O DIA. Com sua experiência na área de petróleo e gás, ele alerta que "devemos explorar melhor nessa área o desenvolvimento de parques tecnológicos. Temos que atuar em eventuais retomadas, em bases competitivas da Indústria Naval Fluminense e também no desenvolvimento de centros, e voltados à energia renovável".
O senhor foi presidente da Cedae. Quais as consequências do leilão da companhia?
Estranhei profundamente a modelagem feita pelo BNDES para a Concessão do Saneamento, pois dividiu o estado do Rio em 4 regiões, algumas delas dentro do mesmo município, colocando uma situação a qual no futuro irá acontecer, como bairros na capital, com diferentes tarifas. Outro aspecto é que as tarifas vão aumentar muito para o consumidor final, pois é impossível para as concessionárias privadas, que perderão a imunidade tributária federal disponível a estatais, como a Cedae. Ao mesmo tempo, se simula pagar um valor elevado de outorga e ainda ter que fazer 30 bilhões de investimentos, o que acho um tremendo de um factoide, o que impedirá, por pura matemática financeira, manter o processo tarifário atual. É lícito ressaltar que a sociedade vai perder muito com a privatização da Cedae, pois as tarifas irão aumentar. Um bom exemplo dessa estratégia equivocada é que Governos liberais como São Paulo, o Doria, não fala em privatizar a SABESP, e o Romeu Zema, em Minas, também não fala em privatizar a COPASA, suas estatais de Saneamento. Em municípios da Baixada Fluminense e São Gonçalo, onde a Cedae não cobra a tarifa de esgoto, posso cravar que os consumidores terão um aumento em sua conta de 100% em curto prazo e a população de lá certamente não sabe disso.
Os funcionários da Cedae estão temerosos que 4 mil trabalhadores possam ser demitidos. Este temor faz sentido?
Na realidade, não é um mero temor, pois já foi anunciado a sua desmobilização e esse impacto social é extremamente preocupante para o nível de desemprego que temos no Rio de Janeiro, não podendo ser agravado ainda mais, inclusive com profissionais de grande experiência e qualificados.
A população tem se assustado muito com notícias de contaminação da água por geosmina. Como resolver este problema?
Geosmina não é jabuticaba exclusiva da Cedae. É algo errado, porém ela acontece em diversos locais do país e do mundo. Eu mesmo, que tenho casa na Região dos Lagos, já tive contato com a geosmina e lá é uma concessionária privada. Existe uma operação técnica com procedimento formal que aprovei, quando presidente, para chegar ao consumidor final, e que parece que não foi feita na primeira crise, por erro ou por omissão. O caso ocorre, pois os rios Ipiranga, Poços e Queimados, que fazem a contribuição para bacia da captação da estação, são rios e onde o tratamento de esgoto não é atribuição da Cedae, e onde ela sequer tem contratos para isso.
Durante sua gestão se dizia que a empresa era focada em qualidade. Por que a administração da Cedae hoje é tão questionada?
Na realidade, aconteceu uma série de problemas nas recentes gestões da Cedae e tem sido objeto inclusive de corretas críticas pela própria mídia, e esses problemas merecem ser apurados de forma bastante rigorosa. Quando deixei a empresa, ela tinha Rating Standard & Poors AA, dando lucros todos os anos, pagando dividendos ao Estado e durante oito anos sendo auditada por empresas de auditoria internacional padrão Big Four (PWC & EY), com balanço contábil e sem ressalvas. Em função do trabalho que fizemos, a empresa já foi duas vezes recentemente premiada pela Exame, como sendo a Melhor Empresa de Infraestrutura no Brasil, inclusive competindo com empresas privadas. Não existe, portanto, conflito entre uma empresa ser bem gerida e ser privada ou estatal. Importante é ter modelos firmes de gestão e, principalmente, de governança, o que parece que foram esvaindo nos últimos anos.
O senhor é engenheiro, egresso da Petrobras, pleno conhecedor da cadeia de petróleo e gás. Qual a saída econômica para o Rio?
O Rio de Janeiro tem uma diversidade econômica muito ampla, mas a questão do petróleo e gás é relevante, não só por sermos a sede das principais empresas de petróleo, mas especialmente por termos as maiores reservas da Bacia de Campos e também na Bacia de Santos. Devemos buscar melhor explorar nessa área o desenvolvimento de parques tecnológicos. Temos que atuar em eventuais retomadas, em bases competitivas da Indústria Naval Fluminense e também no desenvolvimento de centros, e voltados à energia renovável. O petróleo é extremamente alavancador das atividades econômicas do Estado, e não tenho a mínima dúvida que as empresas estarão atentas para esse momento, que é um muito importante para o Brasil e que, portanto, requer também ação firme dos órgãos reguladores como ANP e AGENERSA. As estratégias de desenvolvimento estabelecidas por diversos países na questão do pós-Covid, leva à reflexão de novas posturas, já que juntos com a grande crise da saúde que estamos vivendo, estamos vivendo a grande crise dos empregos.
O que o Rio precisa fazer para superar este difícil momento de luta por recuperação fiscal, financeira e econômica?
O Rio de Janeiro tem locais e polos importantes para o desenvolvimento. Tenho pensado e estou modelando, como cidadão e engenheiro que atuou no setor de desenvolvimento, um novo "hub" que é uma Central de Desenvolvimento, relacionado ao gás natural, com gasoduto marítimo, vindo da Bacia de Santos e entrando na Baixada Fluminense, via Itaguaí, onde há muito potencial ainda para colocação de termelétricas, planta de fertilizantes, condomínios industriais, ao longo do Arco Metropolitano e plantas de derivados do Petróleo e de Petroquímicos, que podem ser oriundos em uma unidade de produção de gás natural (UPGN) e até para potencialização do processo siderúrgico local, denominado HOT Bricket Iron (HBI). Quando fui Secretário de Estado de Energia, da Indústria Naval e do Petróleo, trouxemos 5 termelétricas para o Rio de Janeiro, através do diferencial que temos na oferta abundante do gás, produzido em nosso litoral.
Você foi responsável pela concepção de diversos projetos que hoje são realidade no Rio de Janeiro, como Porto do Açu. Como você vê esses novos potenciais?
Porto do Açu é um dos projetos que me orgulho muito de ter concebido e de ver a realidade acontecer. Talvez seja o grande alavancador do desenvolvimento do norte do estado, que reduz suas atividades à medida que as produções saem da Bacia de Campos para a Bacia de Santos. É fundamental uma união de esforços para melhorar a logística de acesso do Porto do Açu, chegando um ramal ferroviário e evitando que o Porto do Açu não comece a ser dilapidado em suas funções para se transformar em um corredor de commodities de outros estados, como os do Centro-Oeste e até de Minas Gerais, que não agregam nada em empregos e tributos ao Rio de Janeiro e até algumas loucuras, como querer exportar soja pelo Porto do Açu, sendo trazidas de caminhões gerando tráfego não desejado em estradas do estado.
Como você vê a questão da mão de obra no Rio de Janeiro?
A mão de obra no Rio de Janeiro tem um potencial de diferencial, não só pelas universidades, mas por termos uma cadeia fundamental de formação técnica, especialmente na área em unidades como: CEFET, IFF, IFRJ e FAETEC. Há tempo, especialmente através de um projeto, de quando fui secretário de Educação, que criamos e que já está dando muito resultado, que é a implantação do Técnico de Administração com viés em Empreendedorismo, associado com a formação do Ensino Médio. Esse projeto, onde criamos para mais de 100 escolas, que o atual secretário Comte Bittencourt tem dado continuidade, e que começa a formar os seus primeiros alunos agora, dá um resultado muito importante, pois transforma muitas escolas do Ensino Médio em Escolas Técnicas, dando qualificação básica para que o jovem possa empreender e na nossa principal cadeia econômica no Rio de Janeiro, a terciária, muito vocacionada a questão dos serviços.
Que outras áreas você acha que o Rio de Janeiro tem potencial?
Acho que temos muito potencial ainda para os próximos leilões de energia e gerar novas termelétricas, não só no Norte Fluminense, como em Macaé e São João da Barra, mas também na Baixada Fluminense, aliás como fiz no período que fui secretário de Energia de Indústria Naval e do Petróleo, pelo diferencial que temos de oferta abundante de gás produzido em nosso litoral. Na Alerj, pelo seu presidente, deputado André Ceciliano, e por diversos parlamentares, como o deputado Luiz Paulo, está sendo desenvolvido um projeto para incentivo às termelétricas. Certamente teremos também uma oportunidade muito grande para ser também um "Hub" voltado à produção de produtos, voltados à saúde, alavancado pelas novas unidades da Fiocruz, e à verticalização de produção dentro da demanda da Saúde. Uma outra oportunidade muito grande é que muitas das concessões de ferrovias e rodovias que passam pelo Rio de Janeiro estão vencendo por agora e temos que exigir muito de contrapartida nessa renovação para melhorar a logística do Estado do Rio de Janeiro, o que infelizmente o Governo Federal não tem feito em especial na renovação das concessões da Ferrovia Centro Atlântica (FCA) e na MRS.
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