Publicado 20/11/2024 12:32
Rio - Aos 75 anos, Neguinho da Beija-Flor se prepara para a 'última dança', ou melhor: o último samba. Nesta quarta-feira (20), um dos intérpretes mais icônicos do Carnaval carioca, anunciou a aposentadoria e revelou que estará à frente da agremiação pela última vez na Sapucaí em 2025.
PublicidadeHá quase 50 anos à frente da Beija-Flor de Nilópolis, Luiz Antônio Feliciano Marcondes, ou Neguinho da Beija-Flor, se despedirá da agremiação com uma homenagem ao amigo e saudoso mestre Laíla. Em entrevista ao DIA, o baluarte revelou que a escolha do enredo foi o que o segurou por mais tempo no posto.
"O ano de 2025 foi escolhido por causa do Laíla. Se não fosse pelo Laíla eu teria parado antes. Não vou fazer essa desfeita com esse amigo e como a Beija-Flor homenageou o Laíla, vamos nos despedir do Carnaval. Não vou fazer essa desfeita para um cara que foi amigo do peito no mundo do samba", afirma.
Em seu perfil do Instagram, Neguinho se despediu da escola de samba e da comunidade que o acolheu em 1975 e até hoje o trata com carinho em uma carta emocionante. "À minha amada Beija-Flor. O desfile de 2025 marcará minha despedida como intérprete de seus hinos na Passarela do Samba", iniciou ele.
"No próximo Carnaval, escreverei, com a comunidade nilopolitana, o ponto final da trajetória cinquentenária, tempo de muita felicidade e alegria. Vamos atravessar a Passarela do Samba pela derradeira vez, eu com a minha voz e o orgulho de sempre, sustentando a força e a magia de nossa comunidade que brilha no altar dos bambas. Será mais um momento de nosso amor eterno", seguiu.
"[...] O aplauso e a montanha de carinho estão para sempre tatuados na memória. Por Isso e muito mais, jamais cogitei receber salário da Beija-Flor. Nunca assinei contrato nem me submeti a qualquer burocracia. Nossa relação é única e dispensa protocolos. [...] Continuarei lhe amando. Você pode contar comigo por toda a eternidade. Obrigado por tudo, minha escola, minha vida, meu amor", finalizou. Leia a carta na íntegra abaixo.
Por meio de nota, a Beija-Flor de Nilópolis também se despediu de seu intérprete e celebrou sua história com a escola de samba.
"Essa despedida, no entanto, é apenas do posto de intérprete oficial. Neguinho é, e sempre será, a essência da Beija-Flor. Não há Beija-Flor sem ele. Sua história está gravada em nossas cores, nossos sambas e nossos corações. [...] Agradecemos por cada momento, cada nota e cada emoção que Neguinho nos proporcionou. Se somos essa “comunidade que impõe respeito e bate no peito”, é porque ele sempre esteve ao nosso lado, construindo essa história". Leia na íntegra abaixo.
Homenagens de amigos e fãs
Os colegas do Carnaval que conviveram com Neguinho também comentaram a despedida do icônico interprete nas redes sociais. Wander Pires, intérprete da Acadêmicos do Viradouro, se referiu ao baluarte da Beija-Flor em postagem no "X", antigo Twitter, como "padrinho, amigo, irmão".
"Triste e reflexivo, porém muitíssimo emocionado, também penso que saber o momento certo de dizer adeus e aprender a começar um novo ciclo é uma das maiores virtudes do ser humano. Afinal, quem disse que sua voz não ecoará?", compartilhou Wander.
Ainda na rede social, os apaixonados pelo carnaval também lamentaram a aposentadoria do puxador. "O tempo ao mesmo tempo que é precioso, é cruel demais. Neguinho da Beija-Flor faz parte da vida de cada brasileiro. Na festa dos reis da folia, Neguinho é uma das mais altas divindades. Vai ser difícil e um pouquinho mais chato seguir em frente sem ele. Obrigado por tudo", disse um usuário do X, que é percussionista da Mocidade Independente de Padre Miguel.
"Eu não consigo imaginar a Beija-Flor sem o Neguinho. Antes de eu nascer, ele já era a maior estrela da minha escola", compartilhou outro perfil da rede.
Leia na íntegra a nota da Beija-Flor de Nilópolis
"O desfile de 2025 será marcado por uma emoção ainda mais especial. Além de homenagearmos o inesquecível mestre Laíla, será também o momento de nos despedirmos profissionalmente de nossa maior e inigualável voz no microfone oficial: Luiz Antônio Feliciano Marcondes, o nosso Neguinho.
Em 11 de junho de 1975, o então conhecido "Neguinho da Vala" chegou a Nilópolis, a convite do nosso presidente de honra, Anísio Abraão David, que também foi responsável por sugerir o nome artístico que se eternizou: "Neguinho da Beija-Flor". Desde então, sua voz ecoou em cada verso que cantamos, em cada vitória que celebramos e em cada nota 10 que nos fez vibrar. Agora, após cinco décadas de dedicação à Beija-Flor, ele decidiu encerrar sua jornada profissional no mesmo ano em que prestamos homenagem ao legado de seu grande amigo Laíla.
Essa despedida, no entanto, é apenas do posto de intérprete oficial. Neguinho é, e sempre será, a essência da Beija-Flor. Não há Beija-Flor sem ele. Sua história está gravada em nossas cores, nossos sambas e nossos corações.
O próximo Carnaval da Beija-Flor, portanto, terá um sabor ainda mais especial: será a celebração de uma vida inteira dedicada ao samba. Seremos, mais uma vez, testemunhas de sua grandeza, celebrando juntos uma trajetória que soma mais de 50 anos, 14 títulos, 6 Estandartes de Ouro e um grito de guerra que ecoará para sempre no Carnaval brasileiro.
Agradecemos por cada momento, cada nota e cada emoção que Neguinho nos proporcionou. Se somos essa “comunidade que impõe respeito e bate no peito”, é porque ele sempre esteve ao nosso lado, construindo essa história.
Alô, Neguinho, olha nossa Beija-Flor aí, gente!"
Leia na íntegra a carta do Neguinho da Beija-Flor
"À minha amada Beija-Flor
O desfile de 2025 marcará minha despedida como intérprete de seus hinos na Passarela do Samba. No próximo Carnaval, escreverei, com a comunidade nilopolitana, o ponto final da trajetória cinquentenária, tempo de muita felicidade e alegria. Vamos atravessar a Passarela do Samba pela derradeira vez, eu com a minha voz e o orgulho de sempre, sustentando a força e a magia de nossa comunidade que brilha no altar dos bambas. Será mais um momento de nosso amor eterno.
Lembro emocionado, querida escola, do início dessa história, quando cheguei jovenzinho para participar da disputa de samba, no inesquecível “Sonhar com rei dá leão”. Joãosinho Trinta, também recém-chegado, criara o enredo sobre o jogo do bicho e eu, então Neguinho da Vala, sonhava entrar para a ala de compositores. O saudoso carnavalesco permitiu que eu tentasse – é deu certo. Com o samba composto por mim, fomos campeões.
De lá para cá, você ganhou 14 carnavais, e me concedeu o privilégio de estar presente em todos. Fomos tricampeões duas vezes, levamos o Cristo mendigo coberto pela censura, na imagem mais conhecida do Carnaval. E o mais importante: inserimos à Beija-Flor de Nilópolis na história da maior festa popular do Brasil. Em lugar de protagonista.
Consolidou-se a Maravilhosa e Soberana, como está no nosso hino-exaltação, “Deusa da Passarela”, que tive a honra de compor. E virou seu merecido apelido no planeta do Carnaval.
Por você, venci o câncer, cantando na avenida ainda sob tratamento. Tenho fé que me curei graças a Deus e ao abençoado remédio do Carnaval. Nunca esquecerei como à comunidade me recebeu, na volta aos ensaios, em nossa quadra sagrada. O aplauso e a montanha de carinho estão para sempre tatuados na memória.
Por Isso e muito mais, jamais cogitei receber salário da Beija-Flor. Nunca assinei contrato nem me submeti a qualquer burocracia. Nossa relação é única e dispensa protocolos. Costumo repetir que se alguém deve algo, sou eu a você, minha escola. Tenho muito orgulho de carregá-la em meu nome oficial, o da carteira de identidade: Luiz Antonio Feliciano Neguinho da Beija-Flor Marcondes.
Guardo como um tesouro a primeira carteira de integrante da ala de compositores. Está lá a data, 11 de junho de 1975, do começo de tudo. Dos companheiros originais, ainda estão aqui o patrono Anísio Abrahão David e a querida Pinah. Começamos juntos à aventura de conduzir uma pequenina escola da Baixada Fluminense ao panteão das gigantes de nossa cultura popular. E chegamos lá, com a participação de muitos outros sambistas que vieram depois e seguirão rumo ao futuro.
Chegou a minha hora. Em 2025, cantarei a exaltação de meu parceiro Laila - à quem conheci ainda antes do primeiro Carnaval, na lendária roda de samba do Bola Preta -, como epilogo dessa odisseia que durou meio século de folia e felicidade. Superou muito meus melhores sonhos. E continuarei lhe amando. Você pode contar comigo por toda a eternidade. Obrigado por tudo, minha escola, minha vida, meu amor.
A Beija-Flor ai, gente!"
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