Segurado amarga longa espera para ter benefício concedido no Rio - Armando Paiva
Segurado amarga longa espera para ter benefício concedido no RioArmando Paiva
Por MARTHA IMENES

Rio - Os golpes contra segurados do INSS colocaram em xeque, mais uma vez, a guarda das informações pessoais de aposentados e pensionistas, que veem seus números de benefícios, contas bancárias, telefones, cópias de documentos e até endereços circulando no mercado. De um lado o INSS reconhece o problema, mas diz desconhecer como dados sigilosos vão parar nas mãos de terceiros - e em muitos casos, de fraudadores. De outro, os aposentados que se sentem acuados com oferta de empréstimos consignados e toda sorte de "crédito fácil". Para colocar os pingos nos "is" e cobrar postura incisiva não só do INSS - detentor das informações -, o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) notificou diversos órgãos - como ministérios da Justiça e Economia, Banco Central e Câmara e Senado - cobrando soluções contra práticas abusivas na oferta de crédito com desconto em folha e divulgação de informações.

A ONG de defesa do consumidor alerta para a falta de segurança dos dados que são compartilhados sem consentimento prévio e, assim, se tornam vulneráveis a fraudes; e com a agressividade na oferta de crédito, que colabora para o superendividamento de mais de 60 milhões de brasileiros. Questionado pelo DIA sobre a notificação o INSS não deu retorno até o fechamento dessa edição.

"O problema é recorrente. O consignado começou em 2003, e já em 2005 havia denúncia do vazamento de informações sigilosas e nenhuma ação eficaz foi tomada", adverte Ione Amorim, economista do Idec. "É muito importante alertar para a gravidade, já que não existe clareza sobre como os dados são compartilhados antes mesmo de os beneficiários estarem cientes sobre a aprovação do benefício. Passam a receber insistentes ligações de instituições financeiras e correspondentes bancários", explica Ione.

Superendividamento

Em entrevista ao DIA, representante do Idec explicou que além da quebra do sigilo, que favorece inclusive fraudes se os dados caírem em mãos erradas, há ainda risco grande de superendividamento. "Tivemos casos de aposentados que receberam ligações oferecendo o consignado e mesmo sem precisar acabaram pegando o dinheiro. A renda média dos aposentados é de 1,5 salário mínimo e comprometer um percentual desse rendimento por 72 meses (que é o número máximo de parcelas do consignado) acaba afetando a vida dele, que se vê com menos dinheiro inclusive para remédio e plano de saúde, por exemplo", pontua.

No documento, o Idec sugere que o INSS explique aos aposentados na hora da concessão do benefício sobre convênios com bancos. "Seria cartilha explicativa: quando o segurado desse entrada na aposentadoria sairia do posto com informações sobre crédito e os riscos de compartilhar numeração de documentos e benefício", indica.

O Idec pede ainda que o INSS crie um canal exclusivo de atendimento ao idoso, com foco nas reclamações de práticas abusivas de oferta de crédito. "A central 135 não atende a contento e o aposentado muitas vezes não tem acesso a meios digitais", finaliza Ione.

Aposentadoria não saiu, mas oferta de consignado sim

Além de amargar uma longa espera na concessão do benefício, como Jorge Delgado, 58 anos de idade e 35 de serviço, que há quatro meses aguarda a liberação da aposentadoria por tempo de contribuição, os segurados têm que lidar com a incerteza e o temor de ver seus dados pessoais nas mãos de terceiros. Dois casos que O DIA teve acesso mostram que mesmo antes de o benefício ser liberado, os futuros aposentados recebem ligações com oferta de crédito consignado. Em um deles J.C, 60 anos, deu entrada e já esperava quando do nada começou a receber ligações com oferta de consignado. "Achei estranho porque minha aposentadoria nem tinha saído ainda", conta J.C.

Outro caso foi do aposentados C.S.S., de 73 anos, morador do Centro do Rio, que diz receber ligações de financeiras constantemente. "Eu não quero empréstimo, mas mesmo assim os telefonemas não param. É uma chatice. Não sei como conseguiram meu telefone, nem as informações sobre o benefício que eu recebo do INSS. Nunca passei isso para ninguém", reclama.

Questionado pelo DIA sobre esses assuntos - como documentos foram parar nas mãos de instituições que oferecem consignado antes mesmo da aposentadoria ser liberada, o INSS respondeu que "reitera que todos os dados e informações de segurados e beneficiários da autarquia são de caráter sigiloso e adota, permanentemente, políticas no sentido de garantir a segurança das informações constantes nos bancos de dados".

E acrescentou que: "Nenhum órgão, empresa ou pessoa física tem autorização para efetuar qualquer atividade de marketing ativo, oferta comercial, propostas ou firmar contratos de empréstimo pessoal com pagamento mediante desconto direto no benefício em nome do INSS".

Informou ainda que "no intuito de tornar mais rígido o controle sobre os empréstimos consignados, foi assinada no final do ano passado a Instrução Normativa 100, que alterou regras da modalidade de crédito, ao proibir que as instituições financeiras ofereçam de maneira ativa aos segurados consignados por 180 dias após a concessão do benefício".

Mas não informou sobre como os dados de segurados foram parar nas mãos de instituições financeiras ou empresas terceirizadas que ofertam o crédito consignado.

"Os bancos terceirizam o serviço para correspondentes bancários, que por sua vez terceirizam a outros. Ou seja: os dados dos aposentados circulam numa infinidade de lugares", adverte Ione Amorim, representante do Idec.

Para Idec, o consumidor fica hipervulnerável

O Idec enviou ainda ofícios para os ministros da Justiça e Segurança Pública (Sérgio Moro) e da Economia (Paulo Guedes), para a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), para a Procuradoria Geral da República (PGR), para o Banco Central, para as Comissões de Defesa do Consumidor e da Pessoa Idosa, da Câmara dos Deputados, e para a Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor, do Senado Federal, solicitando atenção ao problema e forte atuação das partes a fim de solucionar a questão do vazamento criminoso de dados e assédio aos idosos.

"A forma como as informações pessoais são tratadas fazem com que o consumidor fique hipervulnerável e sujeito a uma série de abusividades. Proteções jurídicas quanto a isso já existem, mas faltam ser colocadas em prática e de maneira ética pelos quadros da Administração Pública", acrescenta a pesquisadora em direitos digitais do Idec, Bárbara Simão.

Na página do Idec, o consumidor pode verificar o especial Golpe da Aposentadoria (https://idec.org.br/golpe-aposentadoria). Nela contém orientação em relação ao assédio da oferta de crédito consignado. Na página os consumidores têm acesso ao passo a passo de quais cuidados tomar e ao canal direto para denúncia ao INSS. Os beneficiários que foram vítimas também podem enviar seus relatos para colaborar com futuras ações do instituto.

"Esse tipo de serviço é muito importante para que toda a população fique ciente dos riscos e empoderada para exigir os seus direitos", finaliza.

AGUARDANDO RESPOSTA

Pedido de criação de canal do INSS para denunciar práticas abusivas na oferta de consignados

O Idec notificou o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) com questionamentos e cobrando soluções contra práticas abusivas na oferta de empréstimos consignados a novos aposentados. O Instituto alerta para a falta de segurança dos dados dos consumidores, que têm suas informações compartilhadas sem consentimento prévio e, assim, se tornam vulneráveis a fraudes, além de apontar a agressividade na oferta de crédito, que colabora para o superendividamento de mais de 60 milhões de brasileiros.

Aviso sobre vazamento de dados à Procuradoria Geral da República

O Idec encaminhou carta dirigida à Raquel Dodge, Procuradora-Geral da República, alertando sobre o vazamento de dados e práticas abusivas relacionadas ao empréstimo consignado, na qual aponta a falta de eficácia da Administração Pública no combate às práticas ilegais de compartilhamento não autorizado de dados ou vazamentos dentro de seus quadros.

Comunicado ao Ministério da Economia e Banco Central sobre superendividamento de consumidores com empréstimo consignado

O Idec encaminhou carta ao Ministro da Economia, Paulo Guedes e ao Presidente do Banco Central do Brasil, Sr. Roberto Campos Neto, solicitando revisão da política econômica que permite crédito às pessoas físicas e das normas que permitem o pagamento pelo consumidor da comissão aos correspondentes bancários, além de maior fiscalização no assédio das instituições financeiras na oferta de crédito consignado.

Cobrança do Ministério da Justiça e da Senacon na solução do vazamento criminoso de dados e assédio aos idosos

O Idec encaminhou carta ao Ministro da Justiça, Sérgio Moro, e ao secretário Nacional do Consumidor, Luciano Timm, cobrando solução da questão do vazamento criminoso de dados da Administração Pública, e também com relação ao assédio aos idosos.

Alerta à Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa

O Idec contatou a Deputada Federal Lídice da Mata, Presidente da Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa (Cidoso), da Câmara dos Deputados, manifestando grande preocupação com os aspectos regulatórios que favorecem a abordagem abusiva dos consumidores e com o vazamento criminoso de dados dos beneficiários do INSS, requisitando que sejam tomadas medidas pela Comissão.

Pedido de Audiência Pública à Comissão de Transparência, Governança, Fiscalização e Controle e Defesa do Consumidor (CTFC) e à Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados

O Idec solicitou à CTFC do Senado e à CDC da Câmara dos Deputados que seja convocada audiência pública sobre o tema do vazamento de dados do INSS e práticas abusivas das instituições financeiras e indagações dirigidas ao INSS, instituições financeiras, Procons e demais associações de Defesa do Consumidor.

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