Prédio do INSS na Rua do Riachuelo, na Lapa, Centro do Rio, já foi invadido e hoje está abandonado - Luciano Belford/Agência O Dia
Prédio do INSS na Rua do Riachuelo, na Lapa, Centro do Rio, já foi invadido e hoje está abandonadoLuciano Belford/Agência O Dia
Por MARTHA IMENES
Rio - O INSS, seguindo determinação do Ministério da Economia, vai adotar medidas de racionalização de gastos. Ou seja, vai cortar despesas. Até aí, normal, o país atravessa um período econômico difícil, mas se tratando de segurança, o "olhar" do instituto poderia ser outro. A portaria 2.517/2019, assinada pelo presidente do órgão, Renato Rodrigues Vieira, visa reduzir em 40% o quadro de vigilância ostensiva e eletrônica em todo país. E isso afetará, principalmente as Agências da Previdência Social do Rio de Janeiro, segundo denúncia feita com exclusividade ao DIA.

Segundo servidores, não só os peritos médicos ficarão vulneráveis com o corte, mas o patrimônio do instituto também. "Hoje o Rio tem a maior quantidade de imóveis públicos do Brasil e o INSS é o 'carro chefe', inclusive muitos locais já foram invadidos", alerta uma fonte. No rol de locais suscetíveis a invasões, segundo a denúncia, estariam uma casa em Copacabana, vários imóveis na Baixada Fluminense, distribuídas em Nova Iguaçu e Caxias, além de terreno em Itaguaí, entre outros.

As perícias médicas realizadas nos postos do INSS somente vão ocorrer se o número de vigilantes for mantido. "Para a Perícia Medica Federal vai permanecer o quantitativo de um segurança para cada quatro consultórios. Onde não houver esse quórum mínimo de seguranças nós iremos suspender o atendimento médico pericial por falta de segurança", adverte Franscisco Cardoso Alves, presidente da Associação Nacional de Médicos Peritos (ANMP). Mas, segundo ele, esse corte não irá afetar a segurança dos peritos médicos federais. E garante: "A ANMP ficará vigilante".

A questão da segurança tem preocupado servidores há tempos. No ano passado, o posto que fica na Praça da Bandeira ficou sem cabos de telefonia e internet por cinco vezes em 23 dias. O material foi roubado e com isso 2,8 mil pessoas deixaram de ser atendidas na agência da Previdência. "Em Caxias o roubo de cabos também é uma constante", diz a fonte.

Já em Cordovil, na Zona Norte, onde fica o arquivo do instituto, homens armados fugiram de uma comunidade próxima e invadiram o local para se esconder. Hoje este prédio está abandonado. "Na Baixada a situação também é crítica. São muitos casos onde o beneficiário vai passar por exame pericial e com a negativa da concessão agride o médico perito", acrescenta.

As agressões contra servidores, inclusive, foram objeto de ação da Federação Nacional dos Médicos (Fenam) contra o INSS em 2017. O juiz da 2ª Vara da Justiça Federal, Mauro Luís Rocha Lopes, condenou o instituto a implementar diversas medidas de segurança em todas as Agências da Previdência Social no Estado do Rio de Janeiro.

Com a decisão, o INSS foi obrigado a cumprir as seguintes determinações: contratação de agentes treinados e capacitados para identificar e resolver comportamentos hostis dos segurados e/ou visitantes; instalação de detectores de metais nas entradas das agências; colocação de câmeras de segurança, direcionando-as em especial aos locais de atendimento/consulta dos segurados; e aparelhamento das salas dos peritos com luzes, alarmes sonoros e portas de saída de emergência. A questão agora é: com a redução do quadro de vigilantes, como ficarão essas medidas?

Questionado pelo DIA como pretende reorganizar essa questão da segurança dos servidores e do patrimônio, o INSS não respondeu até o fechamento desta edição.
Reforma é exemplo de ocupação regularizada
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No Rio, O DIA buscou dois exemplos de imóveis do INSS que foram alvo de invasões, ambos no Centro da cidade: um na Cinelândia virou moradia popular, o outro, na Lapa, depois de muitas idas e vindas e sucessivos despejos, ganhou um paredão de concreto e está abandonado. Moradores da região o chamam de prédio fantasma.

"As pessoas viviam amontoadas e no meio de muita sujeira, eram crianças, velhos, famílias inteiras viviam ali. O poder público nunca fez nada por aquelas pessoas. No dia do despejo foi um horror", relembra a professora aposentada Maria Fernanda da Silva, de 78 anos de idade.

Em outro caso, desta vez de sucesso, há 12 anos um grupo de famílias sem teto ocupou um prédio vazio do INSS na Cinelândia e o final foi feliz: atualmente, na entrada do edifício, há um banner do governo federal onde se lê "requalificação de imóvel público para habitação de interesse social". O diálogo entre os ocupantes e o Poder Público proporcionou a concretização do sonho da casa própria.

Organizadas pelo Movimento Nacional de Luta por Moradia (MNLM), 42 famílias vivem no local batizado de Ocupação Manuel Congo em homenagem ao negro que liderou uma rebelião de escravos no Vale do Paraíba. O imóvel, com entrada na Rua Alcindo Guanabara, já está devidamente dividido em apartamentos. Eles terão direito a usufruir do espaço inicialmente por 90 anos, período que pode ser prorrogado no futuro.

"Não estamos falando de transferir propriedade. É uma concessão de uso para a família, o que é prevista na legislação. Temos a obrigação de cuidar. Mas não pode alugar, vender ou abandonar", explica Lurdinha Lopes, integrante da coordenação do MNLM. Segundo ela, o acordo é também interessante para o governo, pois manter o prédio abandonado tem custos. Embora o edifício continue pertencendo ao Estado, as famílias assumem a obrigação de dar manutenção e deixar em dia as contas do imóvel.

Todo o processo de regularização da Ocupação Manuel Congo passou pelo programa Minha Casa, Minha Vida - Entidades, uma modalidade do programa federal criado em 2009. O sonho da casa própria começou a se desenhar quando o imóvel, já ocupado, foi transferido ao governo do Rio de Janeiro, por meio do Iterj. O INSS foi ressarcido em R$ 914 mil com recursos do Fundo Nacional de Habitação de Interesse Social. Já as obras, orçadas em R$ 3,847 milhões, foram financiadas com recursos do Fundo de Desenvolvimento Social, administrado pela Caixa Econômica Federal, instituição financeira responsável pela execução do Minha Casa, Minha Vida.

De acordo com informações no site do Iterj, os próprios moradores da Ocupação Manuel Congo puderam contratar a construtora e ser responsáveis pela execução da obra por meio de mutirão. "Todo esse envolvimento da comunidade na execução também permite que cada unidade habitacional seja única", diz texto publicado pelo órgão.

A modalidade Entidades do programa federal viabiliza o acesso à moradia para as pessoas organizadas por meio de cooperativas habitacionais, associações e entidades privadas sem fins lucrativos. O processo de escolha dos beneficiados deve ser transparente, com critérios pré-definidos, e a entidade precisa estar habilitada pelo Ministério das Cidades.
60 famílias moravam no edifício na Lapa
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Lá nos idos de 2007, 60 famílias que viviam nas ruas da cidade invadiram o prédio do INSS que fica no número 48 da Rua do Riachuelo. E neste local viveram até 2010, quando o instituto conseguiu a reintegração de posse na Justiça. Desde então esse imóvel já foi à leilão e ninguém parece querer o "prédio fantasma" que fica em uma localização privilegiada: ele está a menos de 80 metros dos Arcos da Lapa.

Segundo moradores da região, as condições de habitação do 48 da Riachuelo eram precárias: não havia rede de água e esgoto e nem iluminação. "Era desumano ver as pessoas vivendo sob aquelas condições", lamenta Maria Fernanda.

Atraso nas concessões e falta de servidores
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Os sucessivos e longos atrasos do INSS na concessão de benefícios e a escassez de servidores fizeram com que o Ministério Público Federal movesse ação contra o instituto. Para discutir o assunto, a 13ª Vara Federal convocou instituições para audiência pública sobre questão previdenciária, que vai ocorrer no dia 4 de novembro, na Avenida Rio Branco, no Centro.

A ação, segundo o MPF, tem o objetivo de obrigar o INSS a prestar atendimento mais eficiente aos segurados da Previdência. Segundo o Ministério Público, o instituto vem reiteradamente provocando lesão aos cidadãos, em virtude da demora em analisar os pedidos de concessão. O MPF quer que a União seja condenada a recompor o quadro permanente de servidores.

"O atraso na análise dos benefícios previdenciários e assistenciais viola o princípio da eficiência da Administração Pública e configura verdadeiro retrocesso social, pois representa descontinuidade de serviço essencial para a dignidade humana", avalia a juíza Márcia Nunes de Barros, que convocou a audiência.