Publicado 05/12/2022 12:51
Teerã - Ativistas da oposição afirmaram nesta segunda-feira, 5, que não acreditam no anúncio de dissolução da polícia da moralidade no Irã. Eles advertiram que as autoridades continuarão aplicando as rígidas normas sobre a vestimenta das mulheres.
O procurador-geral do país, Mohammad Jafar Montazeri, anunciou neste fim de semana o fim da unidade especial da polícia, responsável pelo cumprimento do código de vestimenta. A corporação tem o poder de prender as mulheres que, na visão dos agentes, usam o véu de forma inadequada.
O anúncio surpreendente aconteceu no momento em que a República Islâmica enfrenta uma onda de protestos, provocadas pela morte de Mahsa Amini, jovem de 22 anos, que foi detida pelos policiais por supostamente não utilizar o véu da maneira correta.
A declaração do procurador pareceu uma resposta improvisada a uma pergunta durante uma conferência, o que deixa muita margem para interpretação. A polícia da moralidade é vinculada ao Ministério do Interior e não ao Poder Judiciário.
No entanto, mesmo em caso de dissolução da unidade, o fim não implicaria nenhuma mudança na política iraniana de exigência do véu para as mulheres - um pilar ideológico crucial para seus líderes religiosos -, e sim uma mudança de tática na forma de aplicar a regra, alertam os ativistas.
A medida seria "pouca e muito tardia" para os manifestantes, que agora exigem uma mudança de regime e não apenas a flexibilização das normas de vestimenta, afirmou Roya Boroumand, cofundadora do Abdorrahman Boroumand Center, grupo de defesa dos direitos humanos com sede nos Estados Unidos.
"A menos que eliminem todas as restrições legais sobre a vestimenta das mulheres e as leis que controlam a vida privada dos cidadãos, esta é apenas uma medida de relações públicas", disse Boroumand. "Mesmo sem a polícia da moralidade, nada impede que outras forças de segurança apliquem as leis discriminatórias", acrescenta.
Conhecida como Gasht-e Ershad (patrulhas de orientação), a polícia da moralidade começou a atuar nas ruas em 2006, ano de sua criação, durante a presidência do ultraconservador Mahmud Ahmadinejad (2005-2013). Porém, a liderança clerical do Irã já havia determinado normas de vestimenta muito antes, incluindo o véu obrigatório para as mulheres em público.
Durante o governo do último xá do Irã, Mohammad Reza Pahlavi, as mulheres podiam se vestir como desejassem, e muitas adotaram um estilo similar ao dos países ocidentais. Seu pai e antecessor, Reza Shah, assinou um decreto em 1936 que pretendia proibir todos os véus e lenços islâmicos.
Desde o início dos protestos, cada vez mais mulheres saem às ruas sem o véu, especialmente na zona norte rica de Teerã. Mas o movimento, também alimentado por anos de irritação com os problemas econômicos e a repressão política, também exige agora o fim da República Islâmica liderada pelo aiatolá Ali Khamenei.
A violenta contenção dos protestos deixou pelo menos 448 mortos, segundo a organização Iran Human Rights (IHR), com sede na Noruega.
Para Omid Memarian, analista para o Irã da 'Democracy for the Arab World Now' (DAWN), a "suposta suspensão" da polícia da moralidade "não significa nada, pois já havia se tornado irrelevante devido ao nível elevado de desobediência civil das mulheres e ao desafio das normas relacionadas com o hijab".
Memarian, no entanto, recorda que o uso obrigatório do véu é "um dos pilares da República Islâmica". "Abolir estas leis e estruturas significaria uma mudança fundamental na identidade e existência da República Islâmica", destaca.
"Não devemos nos deixar enganar pelas manobras que a República Islâmica utiliza em tempos de desespero, pois eles podem retornar com outras políticas e medidas restritivas", acrescenta o analista.
Nesta segunda-feira, imperava uma confusão sobre o anúncio de Montazeri. Apenas dois jornais publicaram a notícia na primeira página e a imprensa conservadora ignorou em grande medida a informação.
"O fim da polícia da moralidade", afirma a manchete do jornal Sazandegi. Outra publicação, Sharq, é mais prudente. "O fim das patrulhas?", questiona, ao destacar que a polícia não confirmou a notícia.
O hijab "continua sendo obrigatório", afirmou Shadi Sadr, cofundadora da ONG Justice for Iran, com sede em Londres. Embora os protestos tenham começado pela morte de Amini, "os iranianos não descansarão até que o regime desapareça", concluiu.
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