Renata Souza, presidenta da Comissão de Direitos Humanos da Alerj, cria projeto de auxílio à pessoas em situação de ruaDivulgação/Alerj
Por Renata Souza*
Publicado 09/07/2021 03:00
Entre as diversas formas pelas quais se expressa a atual grave crise na democracia brasileira, destaca-se a situação de vulnerabilidade do Estado Democrático de Direito. Este se define, essencialmente, pela separação entre os poderes e a soberania popular. E o que vivemos agora, pelo contrário, é o atropelo dos mecanismos de representatividade e de participação na política. A democracia, que nunca chegou a alcançar a saúde plena, definha a olhos vistos.
Por exemplo, apesar de 27% das mulheres no país se declararem negras (Pnad/ IBGE), mulheres negras representam 2% do Congresso e menos de 1% da Câmara federal, onde homens brancos ocupam 62% das cadeiras. No Mapa Mulheres na Política 2019, o Brasil ocupa a 134ª posição entre os 193 países do ranking de representatividade feminina no Parlamento. Somos 15% no Legislativo, segundo a ONU/ União Interparlamentar. Na Câmara, há 77 deputadas entre 513 parlamentares e, no Senado, 12 senadoras de 81. Na Assembleia do Rio, dos 70 deputados, 12 são mulheres.
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Essa sub-representação tem corte de gênero, de raça e de classe. Nessa realidade, não é usual que eu ocupe a política. Mulher preta, cria da favela, faço parte de ínfima minoria. Um pós-doc faz de mim avis rara. Não deveria ser assim. Inovar na promoção da participação popular na política é uma necessidade.
É o povo pobre que fica do lado de fora do Parlamento. A casa do povo ainda é a rua. É desse chão que vem a força que gera o movimento que faz acontecer o improvável, como a minha eleição. “A cabeça pensa a partir de onde os pés pisam”, ensina Frei Betto. Apesar do vírus e com todo cuidado, voltamos a ocupar as ruas porque temos um governo que mata mais do que a Covid-19. Mas precisamos ocupar também as redes a serviço dessa luta nas ruas.
Enfrentar o incremento de toda forma de violação de direitos exigiu da nossa Mandata operar também online. Assim, criamos o nosso Conselho Político e escutamos especialistas e organizações dedicadas à integração entre redes e à realização de campanhas virtuais para a criação, enfim, do nosso Gabinete Digital Popular. Em grupos de trabalho, movimentos sociais, estudiosos e ativistas podem interagir entre si sobre educação, segurança alimentar, arte e cultura, juventude, favelas, saúde mental, saúde da mulher, direitos humanos e educação antirracista. Com o apoio da nossa Mandata, será possível a construção coletiva de conhecimento e de ação direta, com campanhas de mobilização e plenárias abertas, oficinas
de capacitação, criação e fortalecimento de núcleos territoriais, mapeamento e impulsionamento de lutas locais.

No sentido tradicional, o gabinete de um parlamentar é o seu espaço físico de trabalho e o seu corpo técnico de confiança. Em tempos de pandemia, aprendemos sobre a necessidade emergencial de romper barreiras ao diálogo com a população. Reivindicamos a subversão da ideia restrita de um espaço físico, com uma ação para além dos limites do legislativo.
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Ainda que conscientes do dever de fazer avançar políticas de combate à exclusão digital, seguimos no rumo da inquietude e da inovação nas formas de ocupar a política. Precisamos contribuir na defesa de uma democracia que, embora frágil e ameaçada, ainda respira e precisa ser salva para ter a chance de fazer acontecer um Estado de justiça social e igualdade de direitos, com a efetiva soberania popular.

*É deputada estadual (PSOL), doutora em Comunicação e Cultura,
presidente da Comissão Especial de Combate à Miséria e à Extrema Pobreza e vice-
presidente da Comissão de Defesa da Mulher da Alerj
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