Publicado 02/08/2021 09:00
A cena se passou num consultório, logo pela manhã. Eu havia sido a primeira paciente a chegar e, na sala de espera, aguardava a médica, ao lado da secretária e de um representante de medicamentos. Conversávamos sobre assuntos variados, como vacinas e até diferenças entre os nascidos de cada signo. Até que um toc-toc característico pelo corredor foi reconhecido pela secretária: "A doutora está chegando". O rapaz logo comentou: "Vocês são impressionantes, como conseguem distinguir que é ela somente ouvindo os passos?"
Quando a médica entrou no consultório cumprimentando a todos, foi inevitável: logo notei o sapato de salto alto. E foi o bastante para ficar imaginando em como anunciamos a nossa chegada nos lugares e também no coração dos outros. Muitas vezes, o perfume que usamos se torna tão característico que basta o seu aroma para que a nossa presença seja notada. Em outras pessoas, a gargalhada é tão simbólica que nem precisamos vê-las. Basta ouvir aquele riso sendo ecoado pelo ambiente para termos certeza de quem é o dono daquela alegria toda.
Por falar em voz, há uma que ficou marcada especialmente pela forma doce e ao mesmo tempo potente como anunciava a presença de sua dona na janela de um apartamento na Gávea. Durante boa parte da pandemia, a cantora lírica Juliana Sucupira aparecia ali diariamente, às 18h, com microfone em punho, doando aos seus vizinhos amor em forma de canção para amenizar os dias difíceis do isolamento.
Há, no entanto, algumas chegadas bem inesperadas e que nos rendem boas risadas. Certo dia, estava ao telefone com uma amiga, quando ela anunciou: "Tem um homem na minha janela!" Logo, ela me enviou uma foto pelo celular, e pude conferir a cena: um funcionário trabalhava num andaime e aparecia no clique. Sem se dar conta, ele chegou sem pedir licença e nos fez rir.
Na vida, também é assim: quantas pessoas entram no nosso percurso, algumas com passos silenciosos e outras de forma intempestiva? Seja como for, haverá sempre a beleza de uma chegada aguardada, como canta Alceu Valença em 'Anunciação': "Tu vens, tu vens/ Eu já escuto os teus sinais..."
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