Publicado 15/05/2022 11:29 | Atualizado 15/05/2022 14:42
Rio - Em novembro de 2021, os óculos da estátua de Carlos Drummond de Andrade, um dos símbolos da calçada de Copacabana, foram roubados pela 12ª vez. Em 20 anos de instalação, a peça metálica já foi furtada treze vezes. A diferença do ocorrido no ano passado é que, através da investigação da autoria do crime, pode-se ter uma certeza: ferros-velhos estavam comprando metais roubados por usuários de droga, que buscavam dinheiro para financiar seu vício.
Em seu depoimento, na 13ªDP (Ipanema), o autor do roubo, Ismael Ribeiro, morador da Cidade de Deus, na Zona Oeste, disse que vendeu a peça por R$ 3 a um taxista. Mas que "costuma furtar e vender objetos de seus furtos no ferro velho que se localiza na comunidade do Pavão-Pavãozinho, (...) que em nenhum momento os responsáveis pelo local questionam a origem do material furtado; que o ferro-velho paga cerca de R$ 3 por quilo de metal, e que assim ele financia o seu vício em crack".
O ferro-velho citado por Ismael foi interditado na última quinta-feira, pelo delegado Felipe Santoro, titular de Ipanema. "Em tese, o local funciona de forma regular, com documentação em dia. Mas é um instituto de reciclagem, com fins criminosos", afirmou. O ferro-velho era investigado desde o furto dos óculos, em setembro passado. Durante a investigação, policiais filmaram possíveis usuários de drogas colocando metais em caminhões que trabalham de forma itinerante recolhendo as peças. "O local era responsável pela aquisição de grande parte dos bens subtraídos na circunscrição e isso estimulava a prática de crimes. Arrecadamos computadores, uma balança e alguns bens que serão periciados para determinar sua origem, como joias", disse Santoro.
Conforme O DIA divulgou, traficantes de droga resolveram suspender a venda de crack na Zona Sul devido às constantes operações da polícia em ferros-velhos localizados dentro de comunidades. A movimentação policial estava atrapalhando a venda de entorpecentes mais rentáveis aos criminosos.
Na semana passada, o secretário de Polícia Civil, Fernando Albuquerque, criou uma força-tarefa para o combate de furto de metais. Um levantamento, feito pelo coordenador do grupo, delegado Felipe Curi, mostrou que é comum presos pelo crime retornarem rapidamente às ruas, sendo detidos novamente, pelo mesmo delito. Foi o caso de F.M.A de Souza: preso em abril de 2020, conseguiu a liberdade dois dias depois. Já em 2021, fora preso em 09 de fevereiro; solto no dia seguinte. Com somente 24 horas liberto, ele foi preso em flagrante pelo mesmo crime, em 11 de fevereiro e ganhou a liberdade dois dias depois. A soltura e a reincidência não é exclusiva dos furtadores: donos de empresas também. J.T.Correia, de 65 anos, proprietário de uma recicladora, foi preso em 06 de abril de 2019, ganhando a liberdade no mesmo dia. Cerca de um ano depois, fora preso novamente, ganhando a liberdade no dia seguinte. Nos dois caso, ele tinha sido preso em flagrante por receptar metais furtados.
"A Segurança Pública é prioridade máxima da nossa gestão. Prova disso são as quedas consecutivas dos mais variados índices de criminalidade. Essa força-tarefa é fruto desse estímulo e certamente vai atingir resultados importantes no combate ao furto e comércio ilegal de metais", afirmou o governador Cláudio Castro.
Confira entrevista com o coordenador da Força-Tarefa, delegado Felipe Curi:
Dia: Qual a necessidade de formar uma Força-Tarefa (FT) contra furto e receptação de metais?
Curi: A FT foi criada por determinação do Secretário de Polícia Civil, Dr Fernando Albuquerque, para dar mais efetividade ao combate aos receptadores de material furtado das concessionárias de serviços públicos. Os furtos e receptação de equipamentos de concessionárias de serviço público causam um grande transtorno para toda sociedade, seja no transporte público, como na supervia, seja nos serviços de internet e TV a cabo, por exemplo. A FT visa dar uma abrangência maior ao trabalho de inteligência e investigação, o que dará mais capilaridade e efetividade às operações que serão realizadas, envolvendo as delegacias especializadas, principalmente a DRF (que concentra as investigações ), DDSD, DPMA, bem como as distritais, de forma regionalizada, tendo foco direto nos ferros-velhos e recicladoras, com um um caráter repressivo e educativo.
DIA: Há algum estudo ou percepção de que os furtos estejam relacionados ao uso de drogas e aumento de criminalidade?
Curi: As investigações apontam que boa parte dos furtos de equipamentos das concessionárias de serviço público são praticados por usuários de drogas. Há os que defendem que a droga é uma questão de saúde pública e que até deve ser descriminalizada, mas essa situação dos furtos de cabos, por exemplo, tem impacto direto na segurança pública e um número difuso de pessoas atingidas por esses crimes praticados por esses usuários de drogas mas, no final, é sempre a polícia que é cobrada para a solução do problema. Ocorre que a legislação penal aplicável aos crimes envolvendo o furto e receptação de equipamentos de concessionárias de serviço público permite que os criminosos presos sejam postos em liberdade em pouquíssimo tempo e voltem a praticar os mesmos crimes, uma vez que são delitos sem violência ou grave
ameaça à pessoa.
ameaça à pessoa.
DIA: A FT conseguiu identificar os pontos principais de roubos? E de receptação?
Curi: Analisamos as ocorrências registradas para identificar os principais pontos de atuação dos furtadores e procuramos mapear os possíveis estabelecimentos que farão a aquisição desse material produto de crime.
DIA: Esses pontos são migratórios?
Curi: As ocorrências são pulverizadas.
DIA: Qual a principal dificuldade enfrentada?
Curi: A legislação. A polícia Civil fez grandes operações, como as várias fases da Operação Caminho do Cobre, contra grandes recicladoras e ferros-velhos, com mais de 300 toneladas de fios de cobre apreendidos, mais de 50 estabelecimentos interditados e dezenas de presos. Em pouco tempo todos estavam em liberdade. O receptador tem a pena de 3 a 8 anos de reclusão. O furtador (usuário de drogas, na maioria dos casos), de 1 a 5 anos. Ainda podemos fazer uma construção jurídica e enquadrar no crime de perigo de desastre ferroviário, cuja pena é de 2 a 5 anos somado ao furto, por exemplo. Todos esses delitos têm em comum serem sem violência ou grave ameaça à pessoa. A legislação penal e processual permite que os criminosos não fiquem presos e tenham medidas alternativas à prisão. Isso faz com que a rotatividade dos presos seja rápida e, consequentemente, a reincidência. Isso não é problema de polícia, e sim de política criminal. Paralelamente, estamos nos adequando para atuar de acordo com o decreto do governo do estado que regulamentou a Lei 9169/2021, o que dará à polícia Civil a atribuição de emitir o RAF (Registro de Autorização de Funcionamento) a esses estabelecimentos, desde que cumpram os requisitos legais. Quem não se adequar, será interditado. Também vamos poder multar e até cassar a autorização de funcionamento. Essas ações, somadas às operações que já estamos realizando, darão mais
efetividade e certamente diminuirão o comércio ilegal de cabos furtados por usuários de drogas. Um aviso aos donos de ferros-velhos e recicladoras: não comprem equipamentos de concessionárias sem procedência, principalmente fios de cobre queimados.
efetividade e certamente diminuirão o comércio ilegal de cabos furtados por usuários de drogas. Um aviso aos donos de ferros-velhos e recicladoras: não comprem equipamentos de concessionárias sem procedência, principalmente fios de cobre queimados.
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