ONG Rio de Paz fez um documentário para contar o drama ainda vivido pela família do ajudante de pedreiro Amarildo Dias de SouzaDivulgação/Rio de Paz
Publicado 22/08/2023 18:39 | Atualizado 22/08/2023 19:22
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Rio - A 6ª turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, nesta terça-feira (22), aumentar a pena de oito policiais militares condenados pelo homicídio e desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo Dias de Souza, ocorrido na Rocinha, Zona Sul do Rio, em 2013. Os agentes foram condenados pelos crimes de tortura seguido de morte e ocultação de cadáver. 
De acordo com o STJ, a decisão deu um provimento parcial ao recurso do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ). O colegiado considerou como circunstâncias que autorizam o aumento das sanções a repercussão internacional do crime e o fato de que corpo ainda não foi encontrado após dez anos de desaparecimento.
"O caso do desaparecimento de Amarildo de Souza se tornou notório em decorrência da gravidade concreta do fato, que configurou um emblemático episódio de violência policial contra integrante da população preta e periférica do Rio de Janeiro, a provocar abalos sociais não apenas na comunidade local como também no país e na comunidade internacional", afirmou o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz.
A partir da decisão, a pena do major Edson Raimundo dos Santos, que era comandante da Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha na época, passou de 13 anos e sete meses de reclusão para 16 anos, três meses e seis dias; a do então subcomandante da UPP, o tenente Luiz Felipe de Medeiros, passou de 10 anos e sete meses para 12 anos, oito meses e três dias; a do soldado Douglas Roberto Vital Machado de 11 anos e seis meses para 13 anos, seis meses e cinco dias.
Já os policiais Marlon Reis, Felipe Maia, Wellington da Silva, Anderson Maia e Jorge Luiz Coelho terão que cumprir uma pena de nove anos, cinco meses e 15 dias de reclusão.
Em seu voto, Rogerio Schietti afirmou que, diferentemente do que entendeu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), não há como atribuir a repercussão internacional do caso Amarildo apenas ao contexto da época – marcado por grandes manifestações políticas e repressão policial –, o qual teria influenciado a cobertura da imprensa.

Para o relator, a repercussão internacional do desaparecimento foi decorrente da gravidade do fato e do exemplo claro de violência policial contra uma pessoa pobre moradora da periferia.

Ainda segundo o ministro, o TJRJ chegou a considerar que o desaparecimento do cadáver do pedreiro por tanto tempo justificaria a elevação das penas aplicadas aos policiais, porém a corte estadual não confirmou o aumento da pena-base em razão desse fundamento.

"Ainda que o crime de ocultação de cadáver seja de natureza permanente, a ausência de recuperação do corpo não constitui elementar típica e autoriza o aumento da sanção. Com efeito, o fato de o corpo da vítima, dez anos depois do crime, ainda não haver sido encontrado, de modo a impedir que seus familiares o sepultem, é circunstância mais gravosa do delito, que enseja exasperação da pena-base", apontou o relator.
No mesmo julgamento, os ministros negaram seguimento aos recursos da defesa dos agentes, que indicavam, entre outros pontos, supostas ilegalidades no inquérito e incompetência do juízo criminal no Rio de Janeiro. Contudo, o colegiado apontou impedimentos de súmulas do STJ e do Supremo Tribunal Federal (STF) para não analisar o mérito desses recursos.
Relembre o caso
No dia 14 de julho de 2013, Amarildo Dias de Souza, de 47 anos, desapareceu após ser levado por policiais militares da porta de sua casa até a Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Rocinha, onde morava, para prestar esclarecimentos.

Ele foi detido pelos agentes durante uma operação batizada de Paz Armada na Rocinha, a polícia prendeu suspeitos sem passagem pela polícia, logo depois de um arrastão ocorrido nas proximidades da favela.

Dois dias depois do desaparecimento, a família fez o registro do caso, que se tornou símbolo e um dos episódios mais emblemáticos sobre violência policial e abuso de autoridade. O corpo de Amarildo até hoje não foi encontrado.

Após alguns meses, o Ministério Público do Rio (MPRJ) pediu a prisão preventiva de dez policiais envolvidos no caso. Oito deles pelo crime de tortura na modalidade de omissão. Estes, mesmo não tendo participação direta no crime, foram enquadrados por estarem na UPP e não terem feito nada para impedir. De acordo com promotores do caso, o ajudante de pedreiro foi torturado pelos agentes com choques elétricos, afogamento e sufocado com sacos plásticos.
PMs seguem trabalhando na corporação

Entre os policiais indiciados, 12 deles foram condenados pelo desaparecimento e morte de Amarildo, entre eles o comandante da UPP na época, o major Edson Raimundo dos Santos. Os outros 11 foram expulsos da PM, porém o major foi reintegrado à corporação. Hoje, o PM cumpre a pena em regime de liberdade condicional, benefício que adquiriu em 2019, e está lotado na Diretoria Geral de Pessoal (DGP).
Além dele, outros cinco policiais seguem em atuação na corporação. Outro acusado, o tenente Luiz Felipe de Medeiros está lotado no Centro de Abastecimento de Insumos de Saúde (CABis). Ele foi subcomandante da UPP Rocinha na época. Segundo a Justiça, “não só orquestrou todo o crime junto a Edson, como participou pessoalmente da execução”.
Já o soldado Fábio Brasil da Rocha da Graça foi licenciado em fevereiro de 2016, sendo reintegrado aos quadros da corporação em outubro de 2021. Segundo a Justiça, ele participou da abordagem e condução de Amarildo à sede da UPP. Enquanto a vítima era torturada, permaneceu junto aos demais policiais de confiança dos superiores na contenção da área. Também contribuiu na ocultação do corpo. Ele foi condenado há 10 anos e quatro meses de prisão.

O 2º sargento Jairo Conceição Ribas foi excluído em fevereiro de 2016, mas foi reintegrado à corporação após decisão judicial em 2021. Ele também atuou na captura de Amarildo e na condução dele à sede da UPP. Segundo a Justiça, não atuou diretamente na tortura da vítima, mas garantiu que o crime fosse cometido vigiando o entorno do contêiner. Sua pena foi de 10 anos e quatro meses de prisão.

A cabo Rachel de Souza Peixoto permanece nos quadros da Policlínica da Polícia Militar. Ela exercia a função de secretária do comandante. Durante o julgamento ficou comprovado que ela vigiou a sede da UPP durante a tortura de Amarildo. A agente foi condenada a nove anos e quatro meses de prisão
A cabo Thais Rodrigues Gusmão também permanece nos quadros da Policlínica da PM. Sob ordem do major Edson, ela desligou as luzes do Parque Ecológico, localizado ao lado da sede da UPP, com o objetivo de diminuir a visibilidade dos arredores do local do crime. A policial foi condenada a nove anos e quatro meses de prisão.
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