Publicado 11/07/2021 00:00
As pesquisas de intenção de voto divulgadas até aqui dão como praticamente certa a polarização entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) nas eleições do ano que vem. A última delas, feita pelo instituto Datafolha, foi divulgada na sexta-feira passada. Nela, o petista lidera com 45% das intenções de voto enquanto o presidente tem 25% da preferência dos eleitores.
Os números não mentem, mas às vezes podem se enganar. Por esses resultados, os dois chegarão ao segundo turno — e muita gente, a começar por Lula e Bolsonaro, parece desejar que isso aconteça. Embora nenhum deles assuma abertamente, um sempre dá a impressão de que o outro é o adversário que gostaria de ter no segundo turno.
Pelos levantamentos feitos até aqui, portanto, ambos ficariam satisfeitos se as eleições fossem hoje. Este é o ponto: ainda falta um ano, dois meses e 21 dias para que elas aconteçam. De hoje até o dia 2 de outubro de 2022, data prevista para a realização do primeiro turno, muita coisa pode mudar — e os números definitivos, quando chegar a hora, podem apontar uma realidade distinta dessa que se vê hoje. Ninguém tem uma bola de cristal que antecipe os resultados. Existem, porém, variáveis que podem alterar o cenário e levar a números diferentes dos atuais. Neste momento, melhor do que ter certezas é levantar dúvidas e, a partir delas, fazer reflexões que ajudem a entender o cenário. Vamos a elas:
O possível avanço de processo de impeachment e o eventual afastamento do presidente Bolsonaro podem beneficiar Lula?
O mais provável é que, ao invés de beneficiar, o eventual afastamento de Bolsonaro prejudique as pretensões de Lula. Um impeachment pode abrir espaço para um candidato com índice de rejeição inferior ao do presidente, que é de 59%. Lula provavelmente manterá a liderança das pesquisas, mas sua rejeição também é alta: 37%.
O mais provável é que, ao invés de beneficiar, o eventual afastamento de Bolsonaro prejudique as pretensões de Lula. Um impeachment pode abrir espaço para um candidato com índice de rejeição inferior ao do presidente, que é de 59%. Lula provavelmente manterá a liderança das pesquisas, mas sua rejeição também é alta: 37%.
Não sendo certo o benefício a Lula, quem lucraria com o afastamento de Bolsonaro?
É cedo para saber. Processos como esse nunca são rápidos e a lama revolvida durante os debates pode manchar reputações de muitas pessoas além do investigado. O processo que custou o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, por exemplo, se estendeu por longos 273 dias. Tomando esse mesmo tempo como base, se o processo contra Bolsonaro começasse a tramitar na primeira semana de agosto deste ano, ele se estenderia até a primeira semana de maio do ano que vem — ou seja, a apenas cinco meses das eleições.
É cedo para saber. Processos como esse nunca são rápidos e a lama revolvida durante os debates pode manchar reputações de muitas pessoas além do investigado. O processo que custou o mandato da ex-presidente Dilma Rousseff, por exemplo, se estendeu por longos 273 dias. Tomando esse mesmo tempo como base, se o processo contra Bolsonaro começasse a tramitar na primeira semana de agosto deste ano, ele se estenderia até a primeira semana de maio do ano que vem — ou seja, a apenas cinco meses das eleições.
Caso seja afastado, existe a chance de Bolsonaro manter os direitos políticos, como aconteceu com a ex-presidente Dilma depois de ser afastada em agosto de 2016 e, assim, ter chances de disputar as eleições de 2022?
Há duas abordagens possíveis: a jurídica e a política. No campo jurídico é improvável que o ministro Luís Roberto Barroso, que presidirá o processo, caso o pedido de impeachment seja aceito pela Câmara, trate Bolsonaro com a mesma generosidade que ministro Ricardo Lewandowski dispensou a Dilma — que conservou os direitos políticos depois de perder o mandato. O provável é que Bolsonaro fique impedido de disputar eleições por oito anos, como determina a lei e como aconteceu com Fernando Collor.
Há duas abordagens possíveis: a jurídica e a política. No campo jurídico é improvável que o ministro Luís Roberto Barroso, que presidirá o processo, caso o pedido de impeachment seja aceito pela Câmara, trate Bolsonaro com a mesma generosidade que ministro Ricardo Lewandowski dispensou a Dilma — que conservou os direitos políticos depois de perder o mandato. O provável é que Bolsonaro fique impedido de disputar eleições por oito anos, como determina a lei e como aconteceu com Fernando Collor.
E no campo político?
Conservando seus direitos, Bolsonaro lidará com uma realidade diferente da de 2018. Ali, ele se beneficiou da rejeição do eleitorado aos candidatos da esquerda. A habilidade em explorar essa rejeição tornou sua candidatura viável, a despeito da insignificância da legenda de aluguel que o abrigou, o PSL. Agora, o eleitor o julgará não pelas promessas, mas pelos resultados de seu governo — e esse julgamento tende a ser desfavorável, como mostra seu índice de rejeição.
Conservando seus direitos, Bolsonaro lidará com uma realidade diferente da de 2018. Ali, ele se beneficiou da rejeição do eleitorado aos candidatos da esquerda. A habilidade em explorar essa rejeição tornou sua candidatura viável, a despeito da insignificância da legenda de aluguel que o abrigou, o PSL. Agora, o eleitor o julgará não pelas promessas, mas pelos resultados de seu governo — e esse julgamento tende a ser desfavorável, como mostra seu índice de rejeição.
Se o vice-presidente general Hamilton Mourão assumir a presidência e se candidatar à reeleição, ele tem chances de herdar os votos de Jair Bolsonaro?
Provavelmente não. Mourão não atrai os simpatizantes de Bolsonaro e, caso assuma, tende a sofrer um processo de desgaste semelhante ao que atingiu Michel Temer — que atraiu a ira dos apoiadores de Dilma. Mourão não tem o mesmo traquejo político de Temer nem é capaz de aglutinar apoios como Itamar Franco, o sucessor de Collor. A chegada à presidência, provavelmente não dará a Mourão chances reais de vitória.
Provavelmente não. Mourão não atrai os simpatizantes de Bolsonaro e, caso assuma, tende a sofrer um processo de desgaste semelhante ao que atingiu Michel Temer — que atraiu a ira dos apoiadores de Dilma. Mourão não tem o mesmo traquejo político de Temer nem é capaz de aglutinar apoios como Itamar Franco, o sucessor de Collor. A chegada à presidência, provavelmente não dará a Mourão chances reais de vitória.
A eventual melhora da economia e a recuperação dos níveis de emprego podem salvar o mandato e aumentar as chances eleitorais de Bolsonaro?
A situação da economia é decisiva em qualquer eleição. Se a atividade estiver em alta e a taxa de emprego for crescente, qualquer presidente resiste a qualquer escândalo. Em 2006, para citar apenas um exemplo, Lula foi reeleito com facilidade, mesmo tendo sofrido o desgaste do chamado “Processo do Mensalão”. A questão é saber se os investimentos públicos previstos para o segundo semestre e para o ano que vem produzirão a tempo resultados que possam beneficiar Bolsonaro. É provável que não. A mesma crise que em 2018 trabalhou a favor de Bolsonaro, agora age contra ele.
A situação da economia é decisiva em qualquer eleição. Se a atividade estiver em alta e a taxa de emprego for crescente, qualquer presidente resiste a qualquer escândalo. Em 2006, para citar apenas um exemplo, Lula foi reeleito com facilidade, mesmo tendo sofrido o desgaste do chamado “Processo do Mensalão”. A questão é saber se os investimentos públicos previstos para o segundo semestre e para o ano que vem produzirão a tempo resultados que possam beneficiar Bolsonaro. É provável que não. A mesma crise que em 2018 trabalhou a favor de Bolsonaro, agora age contra ele.
O presidente pode se beneficiar caso a campanha de vacinação avance e 100% da população seja imunizada até o fim do ano?
A postura diante da pandemia da Covid-19 é, sem dúvida, um ponto fraco de Bolsonaro. A falta de clareza em relação à campanha de vacinação e o apoio a drogas sem eficácia comprovada o deixaram em posição desconfortável — e nem mesmo o sucesso da campanha daqui por diante deverá ter o poder de beneficiá-lo. A postura diante da pandemia, que prejudica Bolsonaro, é o grande trunfo de uma eventual candidatura do governador de São Paulo, João Doria.
A postura diante da pandemia da Covid-19 é, sem dúvida, um ponto fraco de Bolsonaro. A falta de clareza em relação à campanha de vacinação e o apoio a drogas sem eficácia comprovada o deixaram em posição desconfortável — e nem mesmo o sucesso da campanha daqui por diante deverá ter o poder de beneficiá-lo. A postura diante da pandemia, que prejudica Bolsonaro, é o grande trunfo de uma eventual candidatura do governador de São Paulo, João Doria.
As chances de Lula aumentam diante de um candidato de centro, como João Doria?
Lula é maior do que a esquerda que o apoia e seu prestígio, sem dúvida, avança em direção ao “centro”. Doria, por sua vez, não conta com a simpatia da esquerda e também tem críticos ferozes entre os bolsonaristas radicais. De acordo com o Datafolha, sua rejeição é equivalente à de Lula, na casa dos 37%. No entanto, alguns fatores pesam a favor do governador e melhoram suas chances de chegar ao segundo turno. A vacina é um deles. As ações e os investimentos de seu governo no interior poderão garantir a maioria dos votos em São Paulo, maior eleitorado do país. Finalmente, o governador já demonstrou capacidade de trabalho e determinação.
Lula é maior do que a esquerda que o apoia e seu prestígio, sem dúvida, avança em direção ao “centro”. Doria, por sua vez, não conta com a simpatia da esquerda e também tem críticos ferozes entre os bolsonaristas radicais. De acordo com o Datafolha, sua rejeição é equivalente à de Lula, na casa dos 37%. No entanto, alguns fatores pesam a favor do governador e melhoram suas chances de chegar ao segundo turno. A vacina é um deles. As ações e os investimentos de seu governo no interior poderão garantir a maioria dos votos em São Paulo, maior eleitorado do país. Finalmente, o governador já demonstrou capacidade de trabalho e determinação.
Quais as chances de um candidato de centro-esquerda, como Ciro Gomes, contra Lula?
Mínimas. Para se viabilizar, ele teria que convencer parte do eleitorado de esquerda de que é melhor do que Lula, o que é muito pouco provável. O apoio a Ciro, provavelmente, ficará circunscrito a seu estado, o Ceará. Lula é o único candidato de esquerda com chances de conquistar a presidência.
Mínimas. Para se viabilizar, ele teria que convencer parte do eleitorado de esquerda de que é melhor do que Lula, o que é muito pouco provável. O apoio a Ciro, provavelmente, ficará circunscrito a seu estado, o Ceará. Lula é o único candidato de esquerda com chances de conquistar a presidência.
A projeção conquistada pelo governador Eduardo Leite, do Rio Grande do Sul, que recentemente se declarou gay, o credencia a disputar as eleições presidenciais?
Leite terá, primeiro, que conseguir dentro do PSDB o apoio que Doria também pleiteia. Por mais corajosa que tenha sido a postura do governador e por mais aplaudida que tenha sido a declaração, ainda não é possível medir o impacto de seu gesto sobre o eleitorado — sobretudo sobre os segmentos mais conservadores. Além disso, ele terá que se tornar conhecido do conjunto do eleitorado, o que ainda não é.
Leite terá, primeiro, que conseguir dentro do PSDB o apoio que Doria também pleiteia. Por mais corajosa que tenha sido a postura do governador e por mais aplaudida que tenha sido a declaração, ainda não é possível medir o impacto de seu gesto sobre o eleitorado — sobretudo sobre os segmentos mais conservadores. Além disso, ele terá que se tornar conhecido do conjunto do eleitorado, o que ainda não é.
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