Rio - Após uma operação do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) nesta quinta-feira, no Complexo da Maré, na Zona Norte do Rio, a ONG Redes da Maré denunciou uma invasão de militares à Escola Municipal Osmar Camelo, na Favela Nova Holanda.
De acordo com a organização, os policiais arrombaram o portão do colégio, atiraram na caixa d'água e invadiram o prédio para utilizá-lo como base para a ação.
Ainda segundo a Redes, a PM atirou com armas de grosso calibre de dentro da escola contra uma área altamente populosa na comunidade, gerando o risco de moradores serem atingidos por disparos. A ONG informou que, durante a ação, quatro pessoas foram baleadas e estão gravemente feridas.
De acordo com a Polícia Militar, policiais do Bope foram atacados por homens armados que ocupavam a instituição e houve confronto nas imediações do prédio. A PM ressaltou que não havia aula no momento da ação. No entanto, a corporação não confirmou a informação sobre os feridos até o fechamento desta reportagem.
Procurada pelo DIA, a Secretaria Municipal de Educação disse que ainda não foi notificada sobre o episódio. Mas ressaltou que, devido à violência na região, 4.341 estudantes ficaram sem aula nesta quinta-feira?. Em um total de 14 escolas, duas creches e sete Espaços de Desenvolvimento Infantil. Já na área da saúde, quatro postos foram fechados.
Para Lidiane Malanquini, coordenadora do Eixo de segurança pública da Redes, enquanto o estado não garantir o direito à segurança pública da população da Maré, seus outros direitos como educação e saúde continuarão a ser desrespeitados. "Só neste semestre escolar, as crianças e adolescentes da Maré já tiveram meio mês a menos de aula porque a forma com que são realizadas as operações policiais geram riscos tão grandes que as escolas ficam impedidas de abrir suas portas. Isso é inadmissível", afirma.
Ainda segundo a ONG, quando os estudantes ficam sem aulas, eles não só perdem o direito à educação, como ficam em desvantagem ao disputarem provas como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e processos seletivos do Colégio Pedro II, além dos danos psicológicos às crianças e jovens. A ONG também enfatizou que o problema não é apenas sobre o horário em que a polícia entra na comunidade e sim como a corporação atua.
O secretário de Segurança, Roberto Sá, determinou que as polícias do Estado revejam procedimentos, aperfeiçoando suas normas internas sobre operações tanto planejadas quanto emergenciais. Segundo ele, "a preservação da vida e da dignidade humana, bem como a valorização profissional e a ação qualificada, são parte do planejamento estratégico da Secretaria de Segurança. E isso foi ressaltado por mim na minha posse, bem como repassado aos dirigentes das duas polícias como diretriz máxima."
"É preciso deixar claro que a nossa política de segurança nunca foi a do confronto. A realidade, infelizmente, é que a polícia do Rio apreende oito mil armas de fogo por ano, aproximadamente 24 armas de fogo por dia, um fuzil por dia. Uma política nacional de segurança eficaz passa prioritariamente pelo combate ao uso, comércio ilegal e o tráfico de arma de fogo de uso restrito, principalmente os fuzis", disse o secretário.
Nas redes sociais, moradores relatam intenso tiroteio na região
Muitos moradores das comunidades nas proximidades do confronto usaram as redes sociais para relatar o intenso tiroteio, que tem acontecido com frequência na região.
"Gente a operação continua. Muita bomba e muito tiro agora nesse exato momento", escreveu uma internauta. "Acabaram de balear um morador nesse momento na NH, o carro já passou pela Teixeira para levar para o hospital. Só saiam de casa em extrema necessidade", alertou outra.
"Triste isso. Hoje minha irmã de 5 anos teria a festa junina na escolinha dela. Minha mãe comprou roupa, sapato... As crianças tinham ensaiado as danças e tudo! Aí chega hoje de manhã , acontece operação policial e estraga a alegria delas. Fora o perigo cotidiano que todos enfrentam", desabafou um morador. "Onde está a consideração com o direito das nossas crianças?", questionou outro.
Justiça determina que polícia tenha plano de redução de danos para entrar na Maré
A Defensoria Pública conseguiu uma decisão judicial determinando que a Secretaria de Estado de Segurança apresente, em até 180 dias, plano de redução de riscos e danos para evitar violações de direitos humanos durante operações policiais no Complexo da Maré. As diretrizes deverão ser seguidas inclusive para o cumprimento de mandados de prisão e busca e apreensão.
O juízo da 6ª Vara de Fazenda Pública determinou também a presença obrigatória de ambulâncias sempre que houver incursão, além da “instalação, de forma gradual, de equipamentos de vídeo e de áudio, além de sistema de localização por satélite (GPS) nas viaturas das Polícias Civil e Militar. Incluindo transmissão e armazenamento das mídias por até dois anos”.
Em nota, divulgada nesta sexta-feira, a Secretaria de Estado de Segurança (Seseg) esclareceu que recebeu o ofício, enviado pelo Tribunal de Justiça, na noite desta quarta-feira, e já solicitou que as polícias civil e militar tomem as providências necessárias.
Reportagem da estagiária Luana Benedito, com supervisão de Thiago Antunes