Moacyr Luz e o grupo Samba do Trabalhador Rafael Pinheiro

Ele é essência da cultura carioca, como já dizia a canção: "Quem não gosta de samba, bom sujeito não é". E para os amantes do gênero, o tradicional Samba do Trabalhador retoma as apresentações na área externa do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB), na Região Central do Rio, no dia 1º de maio, celebrando o Dia do Trabalho. O evento ocorrerá das 17h às 20h e é gratuito, abrindo as comemorações dos 35 anos do espaço cultural.
A roda de samba acontece todas às segundas-feiras, no Clube Renascença no Andaraí, na Zona Norte e há 19 anos se tornou parada obrigatória para quem curte um bom samba, como a enfermeira Jéssica Greice, 32 anos, que é de Salvador e conheceu o Samba do Trabalhador através de um amigo, quando veio visitar o Rio: "Eu amei a experiência, foi bem diferente dos lugares de samba que eu já fui. Senti a essência do samba carioca, os grandes clássicos sendo tocados, pessoas que pareciam ser íntimas do lugar, da banda, umas das outras e se juntaram para fazer um samba no quintal de casa. É muito bom perceber a diversidade do público e a simplicidade do local, que traz esse ar mais intimista. Com certeza quero voltar assim que puder", disse.
Já Carolina Gomes, 37 anos, foi apresentada por amigos à roda de samba no Renascença e lá tinha a sensação de estar em casa: O que eu mais gosto no Samba do Trabalhador é que ele não tem distinção de público, é diverso, mas todo ele focado em curtir um bom samba na segunda, principalmente quem trabalha com entretenimento. Eu amo, gostaria de conseguir ir mais vezes, mas exatamente por ser segunda, nem sempre consigo. Porém, é um templo do bom samba! Deve ser louvado como tal”, enfatizou.
Até o embaixador da Coreia do Sul, Lim Ki-mo, já soltou a voz no Samba do Trabalhador, cantando 'Trem das Onze', e o vídeo viralizou nas redes sociais na segunda-feira (15). Entre os cariocas, turistas e sambistas, também já passaram nessa roda nomes como Alcione, Pedro Bial, Débora Bloch, Aldyr Blanc, Jaguar, Nelson Rufino, entre tantos outros.
Polo de resistência da cultura brasileira
A tradição carioca começou com a iniciativa do sambista Moacyr Luz, que numa tarde de segunda-feira em 2005, dia em que os músicos normalmente não trabalham, chamou os colegas de melodia para fazer um som e assim surgiu o Samba do Trabalhador.
Moa, como é conhecido, revelou como se tornou um movimento cultural duradouro: “A iniciativa não foi planejada, foi uma ideia intuitiva que se transformou num movimento cultural significativo. A minha ideia era só reunir os amigos que trabalhavam no fim de semana para a gente fazer uma comida, trocar violão, propor novas parcerias, mas tudo isso de uma maneira natural. Quando eu comecei o Samba do Trabalhador, já tinha gravado algumas músicas importantes na minha vida, como 'Saudades da Guanabara', 'Coração do Agreste', 'Mico Preto', explicou o compositor.
O projeto cresceu organicamente, sem ingressos no início, apenas a vontade de compartilhar música e cultura. Com o tempo, as demandas cresceram, exigindo profissionalização em aspectos como segurança, direitos autorais e equipamentos. "De repente, eu me vi com 13 músicos no palco, uma porta nova se abrindo para novos valores, novos talentos, e eu comecei a perceber a responsabilidade disso", reflete Moacyr.
O sucesso do Samba do Trabalhador reflete-se também na sua discografia e nas suas apresentações. O grupo tornou-se uma referência para novos talentos mostrarem suas músicas autorais. "O fato de o Samba do Trabalhador ter gravado quase imediatamente seu primeiro DVD ainda em 2005, depois de gravar mais dois DVDs, cinco CDs, isso espalhou o espaço, o clube, a roda de samba nossa pelo Brasil", destaca Moacyr.
Completando 19 anos ininterruptos, o desafio do Samba do Trabalhador é manter sua longevidade e continuar inovando. "Acho que o grande desafio é estimular os músicos que estão tocando e provocar sempre uma novidade na platéia, que não para de vir. Eu converso com os músicos que nós não somos só um grupo, nós somos um conceito. Então a maneira de tocar, o respeito às harmonias, inventar introduções, tentar criar uma síntese de novos caminhos harmônicos, respeitar a letra, a banalidade, lutar contra a banalidade das letras de alguns tipos de samba mais populares. E eu acredito que como é uma coisa do conceito, vai se renovando e vai se renovar por muito tempo ainda”, enfatiza o sambista.
Gabriel da Muda, que faz parte da roda de samba há 19 anos, ao lado de Moa e diversos músicos, fala da importância do lugar: "O Samba do Trabalhador é a minha vida, foi ali que eu aprendi tudo o que sei sobre samba. Eu era muito novo quando comecei e muita coisa eu fui percebendo com todo esse tempo de roda de samba. Metade da minha vida no samba está nela", disse.
Ele ainda ressalta os principais motivos pela popularidade do Samba: "Eu acho que a principal característica é essa brincadeira, ser uma roda de samba na segunda-feira à tarde. Eu acho que atrai muito as pessoas pela curiosidade, que não acreditam, né, e o carioca é esse cara que tira esse sarro. Sem contar a parte musical. A gente tem uma parte musical muito apurada, modéstia à parte, sabe? Somos uma roda muito versátil, muito democrática, que sempre teve as portas abertas para receber tanto o mais velho quanto o mais novo, o mais conhecido quanto o menos conhecido", destacou um dos fundadores do projeto.
Já para Mingo Silva, voz negra de Niterói, assim batizado por Moacyr, o diferencial da roda de samba é a energia: “cada show é um show, e lá no Samba do Trabalhador tem isso, cada segunda é uma segunda. É uma energia diferente! Você vê pessoas que nunca foram emocionadas, chorando e cantando junto com a gente. Você chega ali e sai dali limpo, com a energia limpa, renovada”, disse o integrante do grupo.