'Marco temporal' põe em xeque demarcação de mais de 300 terras indígenasMarcello Casal Jr/Agência Brasil
Ao pedir o recurso, Aras defendeu o direito da etnia Xokleng sobre a área objeto de disputa possessória, sugerindo tese de repercussão geral no sentido de reconhecer o dever estatal de proteção dos direitos de comunidades indígenas antes mesmo da conclusão do processo demarcatório de seus territórios. Para garantir a segurança jurídica de todo o processo, a identificação e delimitação das terras deve ser feita no caso concreto, aplicando-se a cada situação a norma constitucional vigente a seu tempo.
Com julgamento iniciado na última quinta-feira, 26, pelo Plenário do STF, o recurso extraordinário discute, de forma concreta, um pedido de reintegração de posse movido contra o povo Xokleng, em Santa Catarina. A demarcação da área é questionada pelo Instituto do Meio Ambiente de Santa Catarina (antigo Fatma), já que o local coincide com reserva ambiental.
Na sustentação, Aras lembrou que, ao reconhecer direitos originários dos indígenas sobre as terras de ocupação tradicional, a Constituição Federal adotou o instituto do Indigenato, pelo qual os índios são senhores naturais de suas terras e titulares da posse sobre elas.
O procurador-geral sustentou ainda que a fruição do direito dos índios sobre as terras que tradicionalmente ocupam não depende da prévia demarcação das glebas. “A medida demarcatória apenas atribui segurança jurídica, ou seja, esclarece e facilita a reivindicação dessas terras na eventualidade de conflito possessório. De toda sorte, a demarcação é de índole declaratória, não constitutiva. Demarcar uma terra indígena equivale a reconhecer um status pré-existente, vale dizer, consiste em atestar a ocupação dos índios como circunstância anterior à demarcação”, afirmou Augusto Aras.
Aras afirmou também que a demora na regularização das terras indígenas, bem como a falta de proteção das comunidades durante a tramitação do processo, configura violação de direitos humanos. Por isso, é dever do Estado proteger e garantir os direitos constitucionais das comunidades durante todo o processo demarcatório.
No caso concreto discutido no recurso extraordinário, o PGR defendeu que a demarcação do território do povo Xokleng está de acordo com a legislação e passou por todas as etapas necessárias. Deve, portanto, ser mantida. Segundo ele, não há qualquer conflito entre preservação ambiental e ocupação indígena. “A proteção das áreas indígenas é compatível com a proteção ambiental”, afirmou.
O julgamento do recurso extraordinário teve 39 sustentações orais. Além do PGR, também se posicionaram contra a tese do marco temporal a defesa do povo Xokleng, entidades representantes de povos indígenas como a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e outras, a Associação Brasileira de Antropologia (ABA), o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Defensoria Pública da União (DPU), o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), o Instituto Socioambiental (ISA), a Conectas Direitos Humanos, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o Estado do Amazonas, entre outras instituições, organizações e entidades.
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