Brasil: 4 mulheres são vítimas de feminicídio por dia; estupros se multiplicamReprodução de internet
Os casos de estupro em geral e de vulnerável, com vítimas mulheres, aumentaram 8,3% no país no primeiro semestre deste ano em comparação ao mesmo período de 2020, quando houve subnotificação pela pandemia. No ano passado, 24.664 mulheres foram vítimas de estupro, passando para 26.709 neste ano. Em 2021, janeiro foi o mês com maior número de registros: 4.774 casos.
O levantamento realizado pelo Fórum foi divulgado em primeira mão pelo portal G1 e confirmado pela reportagem do Estadão. "Estamos falando de formas de violência que foram naturalizadas socialmente. A violência de gênero também tem proporções epidêmicas, mas faz tão parte do nosso cotidiano que ostenta números alarmantes todos os dias", observa.
Os números podem ser ainda maiores, pois nem todos os crimes cometidos contra mulheres por atuais ou ex-parceiros são registrados como feminicídio. No caso de estupro em geral e de vulnerável, a subnotificação já era tema importante na análise dos dados, mas a falta de acesso aos órgãos para realizar a denúncia durante a pandemia pode ter contribuído para uma piora no cenário.
"Em casos de violência sexual, precisa do exame de corpo de delito, então estamos falando de um registro que exige a presença da vítima", aponta Bueno. Para a diretora, se não houver mecanismos para mensurá-la de forma adequada, o País não será capaz de preparar os serviços públicos para atender a totalidade das vítimas.
O Anuário Brasileiro de Segurança Pública de 2021, realizado pelo Fórum e divulgado em julho, aponta que os crimes sexuais apresentam ‘altíssima subnotificação‘ e a falta de pesquisas periódicas de vitimização tornam ‘ainda mais difícil sua mensuração’.
"Estudos que especulam as hipóteses sobre as razões de tal fato tem ganhado espaço. Fala-se em aspectos como uma construção coletiva de pactos que ocultam e silenciam estes crimes, a assim chamada cultura do estupro, somada ao compartilhamento de práticas de masculinidade violentas que perpassam essas ações", diz trecho do texto sobre os dados de violência sexual no País.
A pesquisa ‘Percepções da população brasileira sobre feminicídio’, realizada pelo Instituto Patrícia Galvão e Locomotiva, divulgada em novembro deste ano, mostrou que para nove em cada dez brasileiros, o local de maior risco de assassinato para as mulheres é dentro de casa, por um atual ou ex-parceiro. Ela apontou, ainda, que 57% dos brasileiros conhecem alguma mulher que foi vítima de ameaça de morte pelo atual ou ex, o que equivale a 91,2 milhões de pessoas.
Em entrevista ao Estadão, a especialista avalia as consequências da subnotificação no enfrentamento da violência contra a mulher, como reverter esse cenário nos próximos meses e criar mecanismos para que as denúncias sejam realizadas e as vítimas, acolhidas.
Os dados mostram um aumento real ou apenas a diminuição da subnotificação?
Quais eram os espaços que deixaram de ser acessados durante a pandemia para as mulheres denunciarem crimes de violência sexual?
O que a subnotificação causa em termos de políticas públicas e de enfrentamento da violência contra as mulheres?
Falamos de violências que são endêmicas, que fazem parte do nosso cotidiano. A sociedade condenar essas formas de violência é algo bastante recente pra gente, foram séculos em que isso era aceitável até do ponto de vista legal. Há 30 anos era comum um feminicida ser absolvido em um Tribunal do Júri por legítima defesa da honra. Estamos falando de formas de violência que foram naturalizadas socialmente. Se a gente não tiver mecanismos para mensurá-las de forma adequada, não somos capazes de preparar os serviços públicos para atender a totalidade das vítimas.
Há casos que não são registrados como feminicídio. É comum? Por que isso ocorre?
Em média, 35% dos assassinatos de mulheres são registrados como feminicídio. Nos estados que qualificam de forma adequada, que têm protocolos específicos de investigação baseada em gênero e que treinaram suas polícias civis, o número pode ser até um pouco maior. Em compensação, quando falamos, por exemplo, do Ceará, só 8% dos casos são lançados como feminicídio. Para se ter uma ideia, no Ceará, no ano passado, houve pouco mais de 300 casos de homicídio de mulheres e só 8% de feminicídio. Existe um preconceito por parte da Polícia Civil. É um estado que sofre muito com crime organizado, então se ela vítima se relacionava com pessoas de facções, eles atribuem que ela morreu em decorrência do tráfico.
Como reverter a subnotificação no segundo semestre?
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