Vacinação contra covid-19 para crianças de 6 meses a 2 anos com comorbidades BEA SILVA

Brasília - O grupo técnico responsável pela área da Saúde no governo de transição do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afirma que a gestão de Jair Bolsonaro (PL) não formalizou a compra de todas as doses necessárias para a campanha de vacinação de 2023 contra a covid-19 e outras doenças. O cenário encontrado é descrito como de "caos geral" no setor.
"O que temos de informação é que o contrato de entrega de vacinas está vigente, mas o ministério não fez solicitação de quantidades suficientes para o ano que vem", afirmou ao Estadão o sanitarista Arthur Chioro, coordenador do grupo de transição da Saúde e ex-ministro da pasta.
Em entrevista coletiva ontem, ele e outros membros da equipe disseram que a atual gestão não repassou informações básicas ao governo eleito, como a atual situação de estoque de vacinas e o prazo de validade do que foi adquirido.
Segundo o grupo técnico, milhares de vacinas contra a covid-19 estão por vencer neste ano, enquanto milhões de pessoas ainda não tomaram doses de reforço ou até mesmo a primeira dose, como ocorre entre crianças. Chioro mencionou que o quadro atual é de "absoluta insegurança" e de "descalabro" em relação às ações de imunização. O ex-ministro chamou a atenção para o fato de que os dados sobre estoque foram colocados sob sigilo pelo Ministério da Saúde.
O senador Humberto Costa (PT-PE), também ex-ministro e integrante do grupo técnico, disse que há 6 milhões de crianças de 6 meses a 2 anos no Brasil, mas apenas 1 milhão de doses foram distribuídas para essa faixa etária, voltadas para crianças com comorbidade.
Chioro afirmou à reportagem que a equipe identificou ainda não haver recursos reservados para despesas regulares do Ministério da Saúde, que somam R$ 10,4 bilhões, o que inclui compra de medicamentos, saúde indígena e pagamento de bolsas de residência médica. "Não há no Orçamento R$ 10,47 bilhões para dar lastro para ações regulares do ministério, o que é preocupante. É preciso restituir (o valor) para garantir o funcionamento da máquina", disse.
PEC
Segundo Chioro, o rombo faz parte do corte de quase R$ 23 bilhões feito pela gestão Bolsonaro no orçamento da Saúde para 2023. Além de recompor os R$ 10,4 bilhões necessários para custear ações básicas do ministério, o governo de transição quer recuperar esse valor para honrar as promessas de campanha.
Humberto Costa disse que não há outra opção a não ser aprovar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite espaço fiscal para a área social. "Isso é crucial. Ou votamos ou vamos ter uma crise profunda na área da saúde e que será profunda também em várias outras áreas", afirmou.
Outra preocupação do grupo diz respeito ao acesso a medicamentos Os dados reunidos pela equipe mostram que há risco de desabastecimento. "É uma realidade que bate com a informação que a gente recebeu da Confederação Nacional de Municípios. Mais de 70% dos municípios brasileiros hoje têm registro de falta de medicamentos básicos."
Filas
O grupo técnico mencionou ainda a preocupação com as filas na rede pública e a demora de se realizar atendimentos à população em todo o País. Segundo Chioro, a pasta não tem informações sobre a dimensão do problema. Um levantamento foi solicitado para os conselhos de secretários de Saúde e deverá ser apresentado na segunda-feira.
As estimativas colhidas nos Estados apontam que cerca de 1 bilhão de procedimentos deixaram de ser feitos nos dois últimos anos, envolvendo cirurgias eletivas e processos ambulatoriais. "Isso expressa não apenas um acúmulo de gente, de pessoas que estão nas filas, mas o aumento considerável do tempo de espera. Hoje, cerca de 58% dos diagnósticos de câncer realizados na cidade de São Paulo são feitos nos serviços de urgência e emergência", afirmou.
O senador Humberto Costa mencionou que a situação atual da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) é de total incapacidade de lidar com o trabalho que precisa executar, por causa da falta de recursos e mão de obra. "O presidente da Anvisa colocou que há um risco de colapso da agência, e que não é um risco hipotético ou futuro, o risco é imediato, considerando que hoje o déficit de pessoal técnico qualificado é de 30% da força de trabalho da agência. Há uma necessidade urgente de recompor essa força de trabalho."
Ministério
Questionado sobre a compra de vacinas contra a covid-19 para a campanha do ano que vem, o Ministério da Saúde afirmou que já garantiu 700 milhões de doses desde o início da campanha, das quais 550 milhões já foram distribuídas aos Estados, mas não detalhou se parte está reservada para 2023.
Sobre a campanha do próximo ano, a pasta disse que "a estratégia está em discussão pelo Programa Nacional de Imunizações, assim como o quantitativo necessário de doses para garantir a continuidade da imunização".
Sobre o rombo de R$ 10,4 bilhões, a pasta destacou que "nenhuma política pública será interrompida" e que "está atenta às necessidades orçamentárias e buscará, em diálogo com o Congresso Nacional, as adequações necessárias na proposta para 2023."