O PCO é presidido pelo jornalista Rui Costa PimentaValter Campanato / Agência Brasil

O Partido da Causa Operária (PCO), em seu perfil no X (antigo Twiiter), vem divulgando mensagens de caráter antissemita e de apoio ao Hamas, organização responsável pelo ataque de 7 de outubro passado, no qual morrerem cerca de 1.200 israelenses. Nesta quinta-feira,14, a legenda reproduziu um comunicado do grupo terrorista, em que há a convocação dos muçulmanos para oração na Mesquita de al-Aqsa nesta primeira sexta-feira do Ramadã — período sagrado para o Islã. No mesmo texto, o Hamas exalta o ataque a faca cometido contra um judeu.


O teor antissemita se repete em outras postagens do PCO. No último dia 4, o partido publicou um vídeo no qual relata a reunião da comitiva da legenda com o líder do Hamas, Ismail Hanié, no Qatar, durante visita ao birô político do grupo terrorista. Elé é designado pelo Departamento de Estado norte-americano como SDGTs [Specially Designated Terrorist Group — ou Grupo Terrorista Especialmente Designado, em tradução livre]. Ainda nesta quinta-feira, o perfil fez um elogio ao Hezzbolah, grupo islâmico libanês que apoia o Hamas e defende a destruição do Estado de Israel.


No canal que mantém no Telegram, o PCO, que é presidido pelo jornalista Rui Costa Pimenta, segue com os ataques ao Estado de Israel e abre espaço para comentários recheados com discurso de ódio. O usuário identificado como Miguel José postou: “Morte a todos os sionistas e judeus israelenses”. Sofia Smirnov, ainda no mesmo canal de mensagens, também engrossa o coro radical ao afirmar que “(...) está na hora de destruir Israel”.

A estreita relação entre o PCO e o Hamas se dá tanto no nível internacional quanto no nacional. O partido mantém laços com o Instituto Brasil Palestina (Ibraspal), presidido por Ahmad Shehada, irmão de um antigo líder militar do grupo terrorista, morto em um ataque das forças de defesa de Israel. Shehada afirma que sua entidade faz “a luta midiática” no Brasil e busca disseminar informações favoráveis à organização extremista.

Possíveis consequências

Na condição de partido político, o PCO está sujeito ao disposto no artigo 17 da Constituição, que estabelece os princípios para a criação e manutenção de uma agremiação política. Entre eles, destacam-se a defesa do regime democrático e da pessoa humana, a proibição de receber recursos oriundos de governo estrangeiro ou a subordinação aos interesses de outras nações. De acordo com Alberto Rollo, advogado especialista em Direito Eleitoral e mestre em Direito Constitucional pela PUC de São Paulo, a legenda pode vir a receber punições.

“Se ficar comprovado que as postagens representam apoio ao Hamas e ao Hezbollah, que são grupos terroristas que não defendem a democracia e são violentos, o partido estaria infringindo a Constituição e poderia ter o registro cassado. Contudo é necessário que fique comprovado esse tipo de apoio”, explica Rollo.

No entanto, o advogado alerta para a dificuldade de o PCO ter o registro cassado — a punição mais dura —, pois a legislação eleitoral não explicita em que situações tal medida pode ser adotada.

“É possível que o Ministério Público ajuíze um procedimento investigatório ou algum partido solicite uma investigação. Cabe à Justiça Eleitoral avaliar se houve desvio de conduta. Entre as medidas cabíveis, há a cassação do registro do partido. Mas não há previsão na lei para cassar o registro. Não está na lei ‘hipóteses de cassação do partido’. Contudo, o TSE pode fazer uma construção jurisprudencial na qual fique claro que o partido não cumpriu os princípios estabelecidos na Constituição”, explica.

Rollo destaca ainda que, fora do âmbito da Justiça Eleitoral, são pequenas as chances de algum tipo de punição ao PCO. O advogado explica que, no máximo, a legenda pode ter suspenso de forma preventiva o repasse de recursos do Fundo Partidário até que a situação seja esclarecida.

A reportagem de O DIA entrou em contato com o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para saber o posicionamento da Corte a respeito das postagens do PCO e se há algum tipo de apuração em curso. Até o momento da publicação do texto, o TSE não havia se manifestado. O espaço segue aberto. Os esclarecimentos serão acrescentados à matéria.

Extremismo nas redes

Em relatório confidencial ao qual O DIA teve acesso, uma entidade que analisa e busca prevenir o radicalismo on-line e a disseminação de discursos de ódio pela internet aponta que, desde 2021, há um movimento articulado de apoio a organizações terroristas como o Hamas. Em grupos de aplicativos de mensagens, plataformas das redes sociais ou aproveitando o espaço cedido em sites de organizações políticas e da sociedade civil, ocorre a constante disseminação de mensagens de caráter supremacista e antissemita. No caso do Telegram, há a dificuldade adicional de ser quase impossível identificar os usuários dos canais que promovem os discursos de ódio, já que a privacidade de dados de quem utiliza a ferramenta é um de seus principais atrativos.

No Telegram, grupos radicais islâmicos e seus simpatizantes circulam livremente, propagando discursos de ódio, defendendo ataques terroristas contra civis e pregando a destruição do Estado de Israel. Esses espaços de troca de mensagens reúnem organizações conhecidas internacionalmente por atentados contra judeus, simpatizantes, empresas que apoiam as teses antissemitas e indivíduos radicalizados que agem individualmente, os chamados “lobos solitários” — que representam um risco quase incontornável para as autoridades da área de segurança.

A ameaça de ataques já se tornou realidade no Brasil. Em novembro do ano passado, a Polícia Federal (PF) realizou a Operação Trapiche e prendeu três suspeitos de planejamento de atentados contra a comunidade judaica no País. Eles teriam sido cooptados e receberiam apoio financeiro do Hezbollah. O trio monitorou sinagogas no Distrito Federal como possíveis alvos. Com um dos suspeitos, os agentes encontraram uma lista com oito locais onde poderiam ocorrer atentados. A PF deteve os homens após receber um alerta do FBI, informando que o grupo terrorista libanês estava prestes a realizar ações no território brasileiro.

Apesar das evidências, o governo brasileiro se recusa a declarar o Hamas e o Hezbollah como organizações terroristas. De acordo com nota emitida pelo Ministério das Relações Exteriores após os ataques de 7 de outubro, o Brasil segue a classificação oficial da Organização das Nações Unidas (ONU), que não enquadra o grupo na categoria “organização terrorista”. Nem mesmo o massacre de 1.200 israelenses e a prisão dos três suspeitos de envolvimento com o Hezbollah fizeram o governo mudar de posição.

Um monitoramento mencionado no relatório confidencial destaca que no Instagram e na rede X há 18 vídeos do Hamas sobre o ataque de 7 de outubro. As imagens mostram mulheres e crianças sendo degoladas. O texto destaca que esse tipo de conteúdo tem potencial para influenciar jovens, tornando-os possíveis agentes de atos terroristas. A entidade que produziu o documento frisa que as autoridades devem ficar atentas à disseminação de mensagens com discurso de ódio e de estímulo à violência contra judeus. Quando isso vai acabar?