Rio - Ela é espancada, estuprada e ainda recebe ameaças de um homem que diz que a ama. Essa é a rotina de sofrimento físico e psicológico de Clara (Bianca Bin) em 'O Outro Lado do Paraíso'. E amanhã, ela sofrerá outra violência. Em nova crise de ciúmes, o marido, Gael (Sergio Guizé), jogará uma cadeira nas pernas dela - e, após ser medicada, ela descobrirá estar grávida. Quando dias depois o companheiro tentar agredi-la novamente, Clara reagirá e usará uma faca para se defender. "Até agora, eu suportei coisas que mulher nenhuma suportaria. Suportei porque era só eu. Mas agora eu não estou sozinha. Tenho meu filho dentro mim. Meu filho! Se me bater, eu vou perder esse bebê. Não, Gael, isso não vai acontecer. Sai daqui. Ou enfio essa faca na tua barriga", diz a personagem.
CORAGEM
Alguns capítulos depois, já com o filho no colo, Clara finalmente denunciará o companheiro e colocará um ponto final na relação. Gael será preso em flagrante, mas Sophia (Marieta Severo), mãe do agressor, pagará propina para o juiz Gustavo (Luis Melo). E o playboy nem passa a noite na cadeia. "Ele tem que pagar por tudo que fez. Depois, o que vai acontecer cabe ao Walcyr Carrasco (autor da novela). E eu confio muito nele para isso. Acredito muito na recuperação do ser humano, no poder transformador do amor. E o Gael vai ter que provar muito que mudou para, quem sabe, merecer uma segunda chance com essa mulher", pondera a atriz.
ESTUPRO
As cenas de estupro logo no primeiro capítulo da novela não foi uma missão fácil para Bianca. "Foi uma sequência delicada. Violência é um tema muito distante da minha realidade, ainda mais contra a mulher. Dói em mim como atriz. Dói na mulher", define. A intérprete salienta que relacionamento abusivo não acontece apenas em namoros que começaram rápido demais, sem que os companheiros se conheçam direito, como é o caso da personagem. "Às vezes, o agressor é o marido, o pai do seu filho", aponta. "Mas não é só a violência física. Essa é só a ponta do iceberg. A mulher sofre de violência moral, psicológica, sexual, patrimonial, entre outras", completa.
RELATOS
A atriz conhece mulheres que vivem relacionamentos abusivos. "É impressionante a quantidade de histórias que estão chegando até mim agora. Mulheres com as quais convivia e que eu não sabia que tinham esse histórico. E que agora estão dividindo comigo suas histórias. Me sinto honrada. É um assunto que a gente pode se ajudar. Nós julgamos muito. Só mesmo quem vive é capaz de mensurar a dimensão", explica. "A violência doméstica é democrática. Ela não escolhe classe social, religião, cultura. Está em todo o lugar. Está muito mais perto do que se imagina. Às vezes, está do lado. Eu nunca vivi uma experiência extrema de violência física", acrescenta.
ENVOLVIDA
Apesar de os fãs estarem do lado da personagem, muitos deles não concordam com o fato de Clara insistir em manter esse relacionamento que beira a patologia. "Devem dizer: 'Nossa, como ela é boba!', 'Mas por que ela perdoa?'. Ela está completamente envolvida nessa situação, está no olho do furação. É difícil enxergar e tomar consciência da dimensão toda vivendo tão intensamente. Quando a gente se distancia, enxerga melhor o que acontece", justifica. "É importante falar que essas mulheres não estão sozinhas. Em briga de marido e mulher, se mete a colher, sim. Esse negócio de não se envolver não está com nada. A mulherada está unida, cada vez mais forte", acrescenta.
LUTA
Bianca conta que ouve de muitas mulheres o quão difícil é falar sobre violência doméstica e denunciar seus agressores. "A gente julga muito. Só mesmo quem vive é capaz de mensurar a dimensão desse terror", resume. Segundo ela, até 1940, existia a Lei da Honra. "O homem podia matar a mulher se descobrisse que era traído, e ele não seria punido por isso. Isso é muito recente, a gente vive em uma sociedade muito machista, muito patriarcal. A mulher já tem que nascer lutando contra tudo isso. A mulher está sempre presa em uma teia de emoções e não é fácil sair dela", pontua.