Por thiago.antunes

Rio - A sociedade do espetáculo está em festa! Foram 320 pedidos enviados pela Procuradoria-Geral da República ao Supremo Tribunal Federal, com 83 de abertura de inquérito contra parlamentares e ministros de Estado e 211 indícios de irregularidade atribuídos a pessoas sem direito a foro privilegiado.

Embora todo o cuidado dos órgãos de perseguição criminal seja necessário para deter a sangria dos cofres públicos, é preciso dizer que não há nesse rol nenhum criminoso que mereça antecipadamente esse título. São apenas investigações que estão sendo iniciadas se os indícios forem suficientes para que a autoridade judiciária autorize o início do inquérito.

Portanto, é preciso ter muita cautela a fim de que os conduzidos por esse espetáculo midiático não sejam considerados culpados antes de julgados. Eu era juiz criminal em Bangu quando, ao ouvir um preso que havia confessado na fase policial o crime que lhe fora atribuído negar a autoria, indaguei a razão de mudar a versão.

Informou que na Delegacia Policial de Bangu fora torturado no então conhecido como “pau de arara”. No mesmo instante, dirigi-me à sede da delegacia e constatei a existência do aparato de tortura.

Modernamente esse aparato tem outro nome e não mais é praticado apenas pela polícia, mas em concurso com a autoridade judicial, que decreta a prisão até que o preso confesse ou delate para receber prêmios por sua torpeza.

Ora, se houver interesse na incriminação de determinada pessoa, os agentes possuem ferramentas poderosas para apontar o dedo nessa direção com a colaboração prestativa daquele que, sob coação, está disposto a ‘colaborar’ para receber seus “30 dinheiros”.

Recentemente, recebi comunicado da Procuradoria Geral da República informando que havia sido arquivada sindicância onde se apurava que eu teria feito “um acerto no valor de dois milhões e meio de reais para soltar a esposa de um chefe do crime organizado da cidade de Arraial do Cabo, presa recentemente em operação da Polícia Federal”.

A princípio, fiquei feliz com o arquivamento, mas muito assustado e apreensivo com a capacidade dessa máquina de moer gente de apontar o dedo com calúnias as mais graves contra pessoas que não lhe são caras.

Embora seja previsível que um juiz comprometido com os direitos e garantias constitucionais, diante de um ato arbitrário, conceda a liberdade quando a lei assim o exigir, nesse caso sequer havia atuado, eis que o processo havia sido distribuído a outro julgador que havia mantido a prisão e não concedido a liberdade, como a notícia caluniosa afirmara.

Nesse fato, até então desconhecido, só tomei conhecimento do arquivamento, o que me deixou muito apreensivo com o que pode estar acontecendo no campo da vendeta política nessas ‘delações premiadas’ e, mais grave ainda, no dedo oportunamente apontado para aqueles que desejam eliminar por razões de meras divergências de opiniões políticas ou doutrinárias. Acautelai-vos!

Siro Darlan é desembargador do TJ e membro da Associação Juízes para a Democracia

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