Por thiago.antunes

Rio - O Rio sairia da crise, caso a União, que cobra dívidas do governo do estado, acertasse um débito que se acumula há 20 anos com os entes federativos. Somente com o Rio são mais de R$49,2 bilhões que deixaram de entrar nos caixas públicos entre 1997 e 2015, segundo levantamento da Fundação Amazônia de Amparo a Estudos e Pesquisas (Fapespa) por conta da aplicação da Lei Kandir.

A legislação desonera de ICMS as exportações de produtos primários e semielaborados como café, soja, tabaco, óleo de petróleo e minério de ferro. Instituída no governo Fernando Henrique Cardoso (PSDB), em 1996, a lei visava impulsionar as exportações do país, que estavam em baixa. 

Os recursos serviriam para colocar os salários dos servidores em dia e investir em serviços à populaçãoSandro Vox / Agência O Dia

Na época, o trato do governo federal com estados foi: os entes abririam mão de arrecadar o imposto e a União assumiria o compromisso de recompensá-los. Lei para regulamentar o ressarcimento nunca foi votada no Congresso.

“Mas isso nunca foi feito adequadamente”, afirma o economista Mauro Osório, professor associado da Faculdade Nacional de Direito, da UFRJ, e coordenador do Observatório de Estudos sobre o Rio.  De acordo com o economista, o dinheiro que o governo federal não repassa ao Rio tiraria o estado da crise. “A União deveria abater da dívida dos estados o repasse da Lei Kandir”, complementa.

Esse “débito” da União com os estados será a pauta de reunião hoje, às 16h, entre o presidente da Assembleia Legislativa do Estado, Jorge Picciani (PMDB), ministros e o próprio presidente Michel Temer, em Brasília.

No pleito do estado, a inclusão do repasse de parte da verba — cerca de R$4,5 bilhões — como garantia de empréstimos para que a União seja avalista com bancos, para que o estado pegue empréstimos e amenize a crise do Rio, informou ao DIA o deputado estadual Luiz Paulo (PSDB), presidente da Comissão de Tributação da Alerj.  “Não tenho dúvidas que esta lei provocou enorme prejuízo ao estado e municípios que precisam ser ressarcidos pela União”, diz o tucano.

Emissão de moedas

Outro ponto criticado por Mauro Osório é a maciça emissão de moeda que o governo federal fez para financiar o próprio déficit enquanto diz que estados devem se ajustar. Ele acrescenta que a dívida da União com estados não é só devido à Lei Kandir.

“A União não paga o que deve. Seja através da Lei Kandir, seja por aceitar a pressão de empresas de petróleo, lideradas pela Petrobras, para que a ANP não atualize o cálculo dos royalties que as petroleiras devem pagar”, adverte. De acordo com ele, a atualização do repasse dos royalties representaria R$ 2 bilhões anuais para o estado.

Para economista, R$ 19 bilhões tiram Rio da crise

“Se o governo federal fosse menos duro e repassasse cerca de R$ 19 bilhões dos R$ 49 bilhões que o estado deixa de arrecadar com a Lei Kandir, o Rio sairia da crise”, aponta o economista Mauro Osório.

“Para sair da crise é preciso gerar expectativa positiva e estimular o consumo”, diz. “Se por um lado a União tem que colocar R$ 19 bilhões no estado para resolver a crise, por outro esse dinheiro retorna de imediato porque ele será para pagar servidores, pensionistas, aposentados, que vão consumir”, afirma Osório. Segundo ele, os recursos seriam uma “injeção na veia” porque a melhora na expectativa teria impacto positivo até no policiamento.

“A crise no estado só está se aprofundando, o Rio é a imagem brasileira no exterior. O não repasse emergencial além de ser um erro, é um tiro no pé”, avalia.

“Uma coisa é discutir estruturalmente como sair da crise, quais são as alternativas, outra é a questão emergencial. Principalmente quando o governo federal tem uma dívida com o estado e não paga”, adverte. Para Osório, o grande problema da atual crise fiscal não é aumento de gastos nem no Brasil nem do Rio de Janeiro. “As receitas públicas despencaram”, aponta o economista. 

Lei dá isenção mas exige compensação

Aprovada em 1996 pelo Congresso para estimular as exportações, a Lei Complementar 87, conhecida como Lei Kandir, estabelece regras para o ICMS, principal fonte de receita dos estados. Uma delas é que não seja cobrado o imposto sobre produtos destinados à exportação. A norma também prevê que os estados sejam compensados por essas perdas.

Mas, segundo o economista Mauro Osório, isso nunca foi feito de forma adequada por não haver regulamentação sobre o tema. Só que agora o Congresso terá prazo de um ano para criar uma lei que estabeleça esse repasse, conforme decisão de novembro de 2016 do STF.

De acordo com levantamento que será apresentado ao presidente Michel Temer, 15 estados têm mais de R$ 500 bilhões a receber. Em relação ao Rio, Jorge Picciani vai defender que as perdas sejam pagas em parcelas ou abatidas da dívida do governo estadual com a União.

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