Publicado 17/02/2021 16:43 | Atualizado 18/02/2021 12:04
Rio - Enquanto os cariocas sofrem com a paralisação da vacinação no Rio por falta de imunizantes, outros motivos começam a surgir para que a população fique ainda mais preocupada com a pandemia da covid-19. Isso porque, além da constatação, nesta terça-feira (16), de uma nova cepa do coronavírus (P.1) no estado fluminense, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) confirmou, nesta quarta (17), o aparecimento de mais uma variante do vírus, desta vez, a inglesa (B.1.1.7), encontrada em três pessoas: uma na capital, outra em Petrópolis, e a terceira em Belford Roxo, na Baixada Fluminense. O quadro de saúde desses infectados permanece estável e os casos já estão sendo investigados para saber se a transmissão foi local ou importada.
Doutor na Universidade de São Paulo (USP), o infectologista Bruno Scarpellini explicou como a variante inglesa que surgiu no Rio se comporta em comparação com as outras já conhecidas e quais são os grupos e classes nas quais ela apresenta maior incidência ou transmissibilidade. O especialista também esclareceu que, em função de ter aparecido nesta terça, a P.1, que teve origem em Manaus, no Amazonas, foi muito pouco analisada e, por conta disso, praticamente não há informações sobre sua contaminação e comportamento.
"São variantes diferentes. A inglesa tem uma característica que sofre uma mutação do material genético que aumenta sua capacidade de transmissão. Na Inglaterra, dados mostram que ela está sendo transmitida por mais tempo do que o habitual e que sua letalidade foi 30% maior em comparação com a cepa anterior. Também foi observado que a característica de distribuição de casos mudou, começando a atingir adultos jovens, adolescentes e crianças, camadas que geralmente traziam menos preocupação em relação à covid-19. É logico que essas cepas mutantes são sempre competitivas e podem se tornar dominantes rapidamente”, disse Scarpellini.
"A gente tem muito pouca informação da P.1, na verdade. Não há muitos detalhes da Fiocruz e outros órgãos e as mutações encontradas são semelhantes à da inglesa. Poderíamos inferir, nesse caso, que ela teria os mesmos atributos da cepa do Reino Unido, mas precisaríamos de dados epidemiológicos para verificar se isso é real. O fato é que, enquanto as pessoas continuarem não aderindo ao uso de máscaras e não respeitando o distanciamento, além da utilização de álcool em gel recorrentemente, as variantes podem continuar surgindo sim no Rio, e com frequência", completou.
O infectologista também relatou o que é necessário para que a população fluminense se veja livre da covid-19 e sugeriu algumas medidas de segurança que podem ser analisadas e adotadas pelas autoridades municipais e estaduais a fim de evitar a propagação ainda maior da doença, que já causou milhares de mortes no Brasil, um dos países com óbitos pelo novo coronavírus. Scarpellini afirmou, ainda, como a situação da pandemia foi tratado em Israel, considerado uma referência mundial no enfrentamento à crise sanitária.
"Para a população se ver livre da covid-19, temos que encarar a doença da mesma forma como compreendemos a gripe. A taxa de transmissão precisa reduzir, por meio do isolamento social, e o ritmo de vacinação nas pessoas aumentar. Aparentemente, a vacina do Instituto Butantan, em São Paulo, pode combater a variante inglesa, mas ainda é necessário que muitos estudos ocorram nesse sentido para que isso possa ser afirmado com total certeza”, falou.
"O que as autoridades podem fazer para amenizar o quadro de contágio dessas variantes é realmente a vacinação em massa, tentando imunizar em torno de 50 mil pessoas por dia, e dependendo do ritmo de transmissão, talvez até adotar medidas de isolamento social mais duras, como toque de recolher. Em Israel, por exemplo, o número de casos teve redução porque eles resolveram exercer o lockdown desde janeiro, e isso contribuiu para diminuir a incidência de contaminações. Mas isso oscila de cenário para cenário e está condicionado a vários aspectos, como taxa de ocupação de leitos e capacidade do sistema de saúde", sugeriu Scarpellini.
Os secretários estadual e municipal de Saúde do Rio, Carlos Alberto Chaves e Daniel Soranz, respectivamente, junto com a equipe técnica da Subsecretaria de Vigilância em Saúde da Secretaria Estadual de Saúde (SES), concederam uma entrevista coletiva, nesta quarta, para esclarecer os casos de variantes do coronavírus confirmadas no Rio.
Eles afirmaram que a prevenção contra as variantes é a mesma em relação ao coronavírus original, isto é, obedecer ao distanciamento social, evitar aglomerações, usar as máscaras, lavar as mãos e fazer uso do álcool em gel. A Prefeitura do Rio disse estar em alerta sobre o aumento do número de casos.
Preocupação com o Rio e responsabilidade federal
Pesquisadora em Saúde da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e membro do comitê de combate ao novo coronavírus, a especialista Chrystina Barros mostra preocupação com a situação vivida pelo estado fluminense, uma dos piores em relação ao número de casos e mortes em decorrência da covid-19, e analisa o que deve ser feito, a nível federal, para frear a rápida contaminação da população, que vê sua dose de esperança titubear com a paralisação da vacinação no Rio.
"Enquanto não houver um programa de testagem e rastreio muito bem estabelecido, que identifique para cada indivíduo que tenha PCR positivo todas as pessoas que fazem parte da sua rede de contatos, como não aconteceu até hoje, existe um grande risco de que o Rio tenha diversas variantes do coronavírus circulando sem que no mínimo se saiba disso. Sem essa informação, não dá para se fazer o controle adequado da doença. O fato é que só existe uma forma de controlar o avanço das novas cepas: é a restrição de pessoas. E nós continuamos na expectativa para saber se o governo federal tomará essas medidas e investirá em pesquisa ou se seremos passageiros aguardando a imunidade de rebanho”, disse Chrystina.
*Estagiário sob supervisão de Cadu Bruno
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