Publicado 04/02/2022 18:57 | Atualizado 04/02/2022 19:24
Rio - A morte brutal de Durval Teófilo Filho, homem negro e trabalhador de 38 anos, que aconteceu na noite da última quarta-feira (2) em São Gonçalo, Região Metropolitana do Rio, gerou grande comoção não somente pela violência do caso — ele foi baleado por um vizinho, que disse tê-lo confundido com um bandido, como também pela forma como tudo aconteceu. A vítima chegava do trabalho e foi atingida por três tiros pelo sargento da Marinha, Aurélio Alves Bezerra. Inicialmente, Aurélio foi indicado por homicídio culposo (sem intenção de matar) e, nesta sexta-feira, a Justiça corroborou um pedido do Ministério Público e o crime foi tipificado como homicídio doloso (com intenção de matar).
O DIA ouviu dois sociólogos sobre a morte de Durval e ambos apontaram o racismo estrutural como uma das causas do crime, além dos perigos de se armar a sociedade e da tipificação inicial da Polícia Civil.
Ignácio Cano, do Laboratório de Análise da Violência da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) afirmou que a morte de Durval por ter sido causada pelo fato da vítima ser negra.
"É bem possível que tenha tido racismo. Vivemos numa sociedade onde a raça infelizmente ainda desempenha um papel importante. Acredito que isso possa ter influenciado". Ao comentar sobre o militar armado mesmo não estando de serviço no momento do crime, Ignácio classificou o fato como "caso dramático".
Para o sociólogo, algumas pessoas que têm porte de arma reagem perante qualquer situação de medo. "Elas agem sem receio. Isso ilustra o que acontece em uma sociedade armada".
Diogo Lyra, sociólogo, coordenador do Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (GENI) da Universidade Federal Fluminense (UFF), disse que assassinato de Durval Teófilo é evidentemente um caso de racismo.
"O que o tornou suspeito aos olhos do seu vizinho foi justamente o fato de ser ele um homem negro. Na linha de raciocínio do assassino, um homem negro parado na rua só pode ser uma ameaça, um assaltante, um traficante", afirma Lyra.
O sociólogo também relatou sobre a Polícia Civil, inicialmente, ter indiciado o assassino por homicídio culposo, que é quando não há a intenção de matar. "A autoridade policial entendeu que ele teria se 'enganado'. Em outras palavras, ele estaria certo em presumir que um negro fosse um assaltante, apenas teria 'dado azar' deste, especificamente, não ser um".
Por fim, Diogo ressalta o caso não é isolado.
"Toda a trama, das motivações para o assassinato até o indiciamento por homicídio culposo, deixa nu o racismo estrutural da sociedade brasileira, especialmente das suas forças de segurança – das polícias às forças armadas. Em 2019, o músico Evaldo Rosa foi fuzilado com mais de 80 tiros por soldados do exército, em Guadalupe. À época, o Comando Militar do Leste insistiu que se tratava de um assaltante, exatamente como no caso de Durval. Não é preciso dizer que Evaldo também era negro", finaliza.
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