Publicado 18/05/2023 14:26
Rio - Após três anos da morte de João Pedro Mattos Pinto, de 14 anos, durante uma operação conjunta das polícias Civil e Federal no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio, Rafaela Coutinho Mattos, mãe do adolescente, segue cobrando justiça. Segundo ela, a lentidão na resolução do caso não permite viver o luto. O jovem foi atingido por um disparo de fuzil na barriga e seu corpo chegou a ficar desaparecido, sendo encontrado horas depois pela família no Instituto Médico Legal (IML).
"Passou o Dia das Mães, agora três anos da morte do João, e ainda têm as audiências. É muito difícil, essas datas ficam marcadas e ficamos revivendo tudo novamente. A Justiça está lenta demais, já passaram três anos e nada foi definido. A gente acaba tendo que transformar o nosso luto em luta, a gente não descansa, porque fica nessa espera de que a Justiça faça a parte dela", disse.
A denúncia do Ministério Público do Rio (MPRJ) foi apresentada em dezembro de 2021. O parquet fluminense concluiu que o tiro que matou João Pedro partiu da arma de um dos agentes e três policiais foram denunciados por homicídio doloso e fraude processual. Segundo o Tribunal de Justiça do Rio (TJRJ), duas audiências de instrução já foram realizadas em 2022, em setembro e novembro, para ouvir testemunhas. Na próxima quarta-feira (24), cinco policiais federais serão ouvidos, por videoconferência, como testemunhas. Uma nova audiência ouvirá mais nove no dia 12 de julho.
O defensor público Luís Henrique Zouein pontua que demora na conclusão e condenação dos envolvidos tem relação com a atuação da defesa dos réus. "É claro que um processo criminal tem seus ritos e suas formalidades, mas parte da demora deve ser atribuída ao comportamento da defesa que apresenta as mais diversas formas de impugnação, fazendo que o processo pare mais vezes do que espera àqueles que querem uma Justiça célere. O comportamento não só visa ganhar tempo como priva a sociedade da busca pela verdade", afirmou.
Ainda de acordo com o TJRJ, a defesa dos réus, os policiais Mauro José Gonçalves, Maxwell Gomes Pereira e Fernando de Brito Meister, todos lotados na Core à época, conseguiram três habeas corpus que limitaram o número de testemunhas em 16. Eles, que se forem condenados podem pegar penas de até 34 anos de prisão, ainda não foram ouvidos pela Justiça.
"Existe o processo criminal de responsabilização dos policiais envolvidos e uma ação de reparação contra o Estado do Rio pedindo indenização moral, pensão mensal para a família, pedido de desculpas oficial e a criação de um memorial em nome do João Pedro. A Polícia Civil, que tem a função de servir e proteger, ingressou numa comunidade periférica, em maio de 2020, durante a pandemia. No momento em que todos diziam "fique em casa". Nem mesmo dentro de casa o João Pedro pôde estar seguro, ele teve seu direito à vida violado por quem deveria servir e proteger", adverte o defensor.
Defesa pede júri popular
Nesta quinta-feira (18), Rafaela e Neilton da Costa Pinto, pai do adolescente, participaram de uma audiência na sede do Ministério da Igualdade Racial, em Brasília. Eles aproveitaram a cerimônia para pedir mais rapidez nas investigações e levar um abaixo-assinado com mais três milhões de assinaturas cobrando providências no caso: "Eu e meu marido estamos em Brasília, a Chang.org vai entregar a petição com milhões de assinaturas. Nós queremos que esses policiais vão a júri popular".
Para Zouein, há provas suficientes para que a Justiça determine que os réus sejam submetidos ao júri popular. "Estamos muito confiantes, há uma perícia produzida pelo Ministério Público que demonstra que a versão dos policiais é impossível de ter acontecido na prática, e existem testemunhas que presenciaram e vivenciaram os fatos prestando depoimentos coerentes e harmônicos", disse.
"Há um conjunto de provas técnicas, perícias e testemunhas nos autos que fazem a acusação ser muito robusta. Houve o uso abusivo e criminoso da força pelos acusados. Foram mais de 70 disparos de armas de fogo e duas granadas disparadas dentro da casa em que estavam as crianças e adolescentes, sem que houvesse qualquer relato de confronto naquela localidade", completou o defensor.
Justiça determina indenização
O Estado do Rio de Janeiro foi condenado, em junho de 2022, a pagar uma pensão indenizatória à família do adolescente. A Justiça determinou que os pais de João Pedro recebam o pagamento no valor de 2/3 do salário mínimo até a data em que João completaria 25 anos. Após este período, o Estado deverá pagar 1/3 do salário mínimo até a data em que o jovem completaria 65 anos.
Na época, o defensor público do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, Daniel Lozoya, pontuou que o pagamento da indenização é uma vitória, mas a expectativa da instituição é que a investigação esclareça todas as circunstâncias da morte e apure de forma eficaz a conduta dos agentes que participaram da operação.
Na época, o defensor público do Núcleo de Defesa dos Direitos Humanos, Daniel Lozoya, pontuou que o pagamento da indenização é uma vitória, mas a expectativa da instituição é que a investigação esclareça todas as circunstâncias da morte e apure de forma eficaz a conduta dos agentes que participaram da operação.
O caso, os acusados e novas audiências
João Pedro, de 14 anos, foi morto em 18 de maio de 2020, durante uma operação conjunta da Polícia Civil e da Polícia Federal, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. Ele jogava videogame com mais cinco amigos na casa dos tios, quando, segundo testemunhas, os agentes entraram atirando. O adolescente foi atingido por um disparo de fuzil na barriga e socorrido de helicóptero, mas não resistiu aos ferimentos.
Novas audiências ainda serão realizadas para ouvir outras testemunhas e os três réus. Inicialmente, a investigação da morte foi promovida pelo Ministério Público Estadual e pelo Ministério Público Federal (MPF). Entretanto, o MPF deixou o caso após indícios de que a morte teria sido provocada por policiais civis, e não federais. Contudo, a Defensoria Pública requisitou que o MPF voltasse ao caso.
Após as oitivas, haverá um prazo para apresentação das alegações finais e, só então, a Justiça poderá decidir se Mauro José Gonçalves, Maxwell Gomes Pereira e Fernando de Brito Meister irão a júri popular. Os policiais respondem por homicídio duplamente qualificado e fraude processual. Na ocasião, enquanto esperava pela chegada da equipe de peritos, o trio alterou o local do crime, com a intenção de criar vestígios de suposto confronto com bandidos.
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