Neilton da Costa Pinto e Rafaela Coutinho, pais de João Pedro, na audiência ao lado de representante do Movimento Negro EvangélicoSandro Vox / Agência O Dia
Caso João Pedro: Família quer júri popular de policiais acusados da morte do adolescente
Após mais de dois anos do crime, primeira audiência ouviu, nesta terça-feira, sete testemunhas e perita. Próxima oitiva só acontece em novembro
Rio - A primeira audiência de instrução do caso João Pedro Matos Pinto foi marcada por pedidos de familiares para que os três policiais civis denunciados pela morte vão a júri popular. Nesta segunda-feira (5), a juíza Juliana Grillo El-Jaick, da 4ª Vara Criminal de São Gonçalo, ouviu sete testemunhas do caso, entre elas o pai da vítima, além da perita responsável pelo relatório técnico da reprodução simulada. Antes dos depoimentos começarem, parentes e amigos do adolescente fizeram uma manifestação na frente do Fórum, onde pediram por justiça e lamentaram a demora do processo, que só teve a primeira sessão realizada depois de mais de dois anos do crime.
"Já estávamos esperando há dois anos, bastante tempo de muita angústia e espera, muita luta. Mas, estamos bem confiantes, acredito que a audiência tenha sido bem positiva e esperamos que a Justiça faça a parte dela. Esperamos que as outras audiência sejam marcadas, assim como já saímos de lá com uma audiência marcada. Esperamos que os policiais vão a júri popular", declarou Rafaela Matos, mãe do adolescente.
João Pedro, de 14 anos, foi morto em 18 de maio de 2020, durante uma operação conjunta da Polícia Civil e da Polícia Federal, no Complexo do Salgueiro, em São Gonçalo, na Região Metropolitana do Rio. A vítima brincava com amigos na casa dos tios, quando, segundo testemunhas, os agentes entraram atirando. O adolescente foi atingido por um disparo de fuzil e socorrido de helicóptero, mas não resistiu aos ferimentos. O corpo do menino ainda ficou desaparecido e só foi encontrado horas depois pela família no Instituto Médico Legal (IML) do município. Para Rafaela, os dois últimos anos foram os piores de sua vida.
"Tem sido bem difícil, os dois piores anos das nossas vidas, porque a gente não vive o luto, a gente não descansa, porque fica nessa espera de que a Justiça faça a parte dela. A gente acabada tendo que transformar o nosso luto em luta e, com isso, o nosso corpo físico sente, o emocional da gente não fica bom. A gente tenta juntar os cacos para continuar nessa luta, nessa jornada, que é dura. É uma luta muito desigual, mas estamos bem confiantes em Deus", desabafou.
Ao ser interrogado, o pai de João, Neilton da Costa Pinto, chegou a dizer que outros pais presentes na audiência poderiam imaginar como ele estava se sentindo com a perda do filho. No depoimento, que durou cerca de 30 minutos, o homem relembrou o momento em que soube da morte do adolescente. "Cheguei no local e encontrei cinco jovens na calçada. Perguntei onde estava o João Pedro e meu sobrinho respondeu que ele tinha sido baleado pela polícia. Só fui saber o que tinha acontecido com meu filho no dia seguinte, quando soube que o corpo dele estava no IML", relatou Neilton.
Na oitiva da perita Maria do Carmo Gargaglione, da Divisão de Evidências Digitais e Tecnologia da Coordenadoria de Segurança e Inteligência do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ), ela destacou que o trabalho da perícia foi realizado com um scanner de última geração, único modelo usado no Brasil, e relembrou que a residência onde João Pedro foi baleado ficou com diversas marcas de tiro.
"O scanner fez uma fotografia com precisão de todos os ambientes da casa e seu entorno. Junto com os depoimentos de quem estava na casa, fizemos um cruzamento de informações. Havia uma concentração grande de marcas de bala em um cômodo da casa", afirmou Gargaglione, que prestou depoimento por cerca de 1h30. Na sessão, a magistrada também ouviu a dona da casa onde a vítima foi baleada e cinco adolescentes que estavam com João Pedro. No depoimento, um deles reafirmou que os agentes acionaram uma granada dentro da residência e que os pedidos por socorro não impediram os policiais de atirarem.
Novas audiências ainda serão realizadas para ouvir outras testemunhas e os três réus. A próxima acontece em 16 de novembro, às 13h30. Após as oitivas, haverá um prazo para apresentação das alegações finais e, só então, a juíza poderá decidir se Mauro José Gonçalves, Maxwell Gomes Pereira e Fernando de Brito Meister irão a júri popular. Os policiais respondem por homicídio duplamente qualificado e fraude processual. Na ocasião, enquanto esperava pela chegada da equipe de peritos, o trio alterou o local do crime, com a intenção de criar vestígios de suposto confronto com bandidos.
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