Publicado 26/03/2024 17:25 | Atualizado 26/03/2024 23:11
Rio – A prisão do ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa, acusado de atrapalhar as investigações do assassinato de Marielle Franco e de Anderson Gomes, foi a centelha para uma série de emoções de Terezinha Maria de Jesus, mãe do menino Eduardo, morto na porta de casa, no Complexo do Alemão, na Zona Norte do Rio, em abril de 2015.
Na época, Rivaldo era chefe da Delegacia de Homicídios da Capital e conduziu as investigações sobre a morte do garoto. No entanto, uma palavra resume a forma como o processo foi levado: indignação. Ao DIA, Terezinha afirmou que desde esta época, sabia se tratar de uma pessoa com más intenções.
"Quando eu recebi esta notícia [da prisão de Rivaldo], estava no avião indo para o Rio de Janeiro. Fiquei muito indignada. Eu sabia que um bandido comandou a investigação no caso do meu filho. Eu sabia que ele era um bandido. Na época, eu acreditei que ele pudesse ser um delegado do bem, mas estamos vendo que não era. Fiquei muito indignada por ele ter encerrado o caso do meu filho com legítima defesa, dizendo que não sabia de onde vinha o tiro que matou meu filho. Ele entrou na investigação da morte do meu filho para não fazer nada, porque ele não fez nada. Simplesmente foi uma farsa que ele fez para enganar a mim e minha família", afirmou.
Eduardo foi morto por um tiro de fuzil, que partiu da arma de um policial. Rivaldo Barbosa, na época, garantiu à família que o caso não passaria impune. No entanto, meses depois, o inquérito da DH concluiu que o PM Rafael de Freitas Monteiro Rodrigues agiu em legítima defesa em um confronto com traficantes – versão contrariada pelo Ministério Público, que apontou inconsistências no resultado final do trabalho da Polícia Civil.
Segundo a promotoria, o relatório do local do homicídio feito no dia do crime pela perícia apontou que não foram recolhidos estojos, cápsulas de bala ou outro material que levasse à conclusão sobre um confronto entre policiais e criminosos. Ainda assim, o processo foi arquivado na 2ª Câmara Criminal, sob argumentos de inépcia da defesa e ausência de provas.
Terezinha também contesta a versão de Rivaldo em não denunciar o PM que disparou contra Eduardo: "Quando ele encerrou o inquérito como legítima defesa, disse que não sabia de qual arma veio o tiro que matou meu filho. Isso foi uma coisa que me fez pensar: 'esse delegado não fez a investigação e não denunciou o policial'. Ele só denunciou um, que foi o PM Rafael Freitas, e não o Marcus Bevitori, sendo que o tiro que matou meu filho foi a segunda arma, do Marcus. E ele não o denunciou. A minha indignação todinha foi essa. O que ele fez no processo do meu filho? Nada. Ele simplesmente me enganou. Mas agora, a verdade está aí, estampada na cara. A máscara dele caiu, desse delegado bandido".
Em setembro de 2023, oito anos após o ocorrido, o Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) pediu o desarquivamento do inquérito policial que investiga a morte de Eduardo. Conforme disse ao DIA o advogado João Pedro Accioly, da defesa da Terezinha, o pedido veio após o surgimento de novas provas, especialmente vídeos gravados no dia do homicídio, além de indícios de fraudes na investigação policial e falhas do promotor original do caso.
Segundo ele, várias falhas nas investigações foram apontadas, entre elas, o laudo de confronto balístico, que apontou ter sido impossível realizar o confronto entre o projétil e as armas dos policiais investigados, pois as 'balas' não teriam sido encaminhadas à perícia. Em outro ponto, a defesa mostrou que os dois policiais envolvidos no caso só prestaram depoimento meses depois da morte de Eduardo, tendo dito exatamente as mesmas coisas, como uma cópia.
"Além do policial Rafael de Freitas, que havia sido alvo da primeira denúncia, a decisão do procurador-geral de justiça permite a investigação e a acusação do policial Marcus Bevitori, que havia sido impropriamente excluído da primeira ação penal. Elementos do próprio inquérito levam a crer que Freitas foi o primeiro a disparar, mas Bevitori foi o responsável pelo disparo letal", afirmou.
Terezinha conheceu o advogado após assistir a peça 'Macacos', dirigida por Clayton Nascimento, no Teatro Firjan Sesi Centro, em 2016. A história dela foi contada no palco, o que fez com que o advogado Accioly, que assistia o evento, se interessasse pelo caso e o assumisse.
"Meu envolvimento com a peça é desde 2016. Conheci o [diretor] Clayton Nascimento neste ano. Ele me disse que levaria a minha história e do meu filho para o Brasil e o mundo e que estava lado a lado comigo, lutando por justiça. Foi através da peça que eu consegui a justiça para o meu filho. Consegui meu advogado particular através da peça do Clayton. Então, só tenho a agradecer dele estar ao meu lado nesses anos na luta por justiça ao meu filho", disse.
O sentimento de justiça guiará Terezinha até que mais pessoas sejam responsabilizadas. O que fica é o sentimento e o amor por Eduardo. "Falar do meu filho nesse momento é difícil. Estou muito emocionada depois de tudo isso. É muita emoção, muita luta. Meu filho era uma criança boa, educada, carinhosa comigo. Eu só tenho a falar coisas boas dele. Ele gostava muito dos irmãos. Isso que ele era. Estudante, inteligente, tirava notas boas no colégio. Estou muito emocionada, abalada", lamenta.
Rivaldo é suspeito de tentar obstruir investigações sobre assassinatos de Marielle e Anderson
Rivaldo Barbosa foi preso no domingo (24) pelo envolvimento no assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes, em março de 2018. Apesar de se dizer amigo da ex-vereadora, segundo o ex-ministro da Justiça Raul Jungmann, o ex-chefe da Polícia Civil é suspeito de receber propina da família Brazão para obstruir as investigações.
A prisão pegou de surpresa pessoas próximas à Marielle. Em publicação no X (antigo Twitter), o ex-deputado federal e atual presidente da Embratur, Marcelo Freixo, lembrou que entrou em contato com Rivaldo assim que soube da execução da amiga em 2018. "Agora Rivaldo está preso por ter atuado para proteger os mandantes do crime, impedindo que as investigações avançassem. Isso diz muito sobre o Rio de Janeiro”, afirmou. A mãe de Marielle, Marinete da Silva, também reforçou que a filha confiava no delegado. "A maior surpresa nisso tudo é o nome do Rivaldo, pois minha filha confiava nele e no trabalho dele", disse em entrevista à GloboNews.
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