Publicado 12/06/2024 18:44
Rio - Os moradores da Ilha do Governador, na Zona Norte do Rio, relatam ao DIA que seguem apreensivos na hora de se locomover dentro ou fora da região. No fim de maio, a Polícia Civil passou a investigar uma série de casos de sequestro e extorsão a motoristas de aplicativo que circulavam na ilha. A Polícia Militar informou que reforçou o policiamento, mas os moradores relatam medo e dificuldades para conseguir corridas.
PublicidadeUma mulher que preferiu não se identificar disse à reportagem que depende do carro por aplicativo para ir ao trabalho. Com isso, se programa para solicitar a corrida com antecedência, sabendo que muitos motoristas não aceitam entrar na região. De acordo com a moradora, o principal problema está na volta para casa.
"A Ilha do Governador já é um lugar que não tem muitas opções de transporte, então o Uber é uma modalidade de transporte que a gente usa muito. Eu pego todos os dias para trabalhar e está bem complicado, porque os preços aumentaram muito, a quantidade de carros é menor. Para entrar na Ilha, está impossível. Precisa dar sorte de encontrar algum motorista que more na Ilha e que esteja querendo entrar na Ilha. Muitas vezes, nem os motoristas que moram aqui querem entrar em alguns bairros que antes eram considerados tranquilos. Eu peço com dois aplicativos ao mesmo tempo, sabendo que vão cancelar várias vezes até dar a sorte de alguém aceitar", relatou.
Outra moradora relatou que não solicita viagens por aplicativo há cerca de duas semanas, quando os casos de extorsão e sequestro vieram à tona. No último dia 31, ela saiu do Centro da cidade por volta das 22h e precisou pedir uma corrida para voltar a casa.
"Infelizmente tive três corridas canceladas pelo seguinte motivo: 'a ilha está como área de risco e perigosa no Uber, não posso aceitar essa corrida'. Até que o quarto motorista aceitou, pois conhecia a Ilha e tive que mandar mensagem implorando pra não cancelar. Quando pego dentro da Ilha, a primeira pergunta é: 'é dentro de comunidade ou próximo?' e basicamente tenho que falar o trajeto todo pra pessoa se sentir segura de que não será uma corrida de risco", lamentou.
A mulher, que também preferiu não se identificar, afirmou que percebeu reforço de policiamento em áreas pontuais, como entrada de comunidades. "O sentimento predominante é o medo, porque o direito de ir e vir parece que está se perdendo em um bairro que era mais tranquilo. Moro na Ilha desde pequena, já tem 26 anos e nunca passei por isso", desabafou.
Em nota, a Polícia Militar informou que reforço no policiamento está, principalmente, na região das ruas Magno Martins, João Telles, Romancista e adjacências, com uso do veículo blindado de transporte de pessoal. Além dos roteiros de patrulhamento feitos com viaturas e motocicletas, a ação conta com apoio de equipes do Bairro Presente e do reforço de efetivo através do Regime Adicional de Serviço (RAS).
"Fiscalizações estão sendo feitas na área, à noite, todos os dias, além do comando do 17ºBPM (Ilha do Governador) ter solicitado o auxílio do grupamento de Motocicletas do 1° Comando de Policiamento de Área (CPA). No último dia 4, a PM prendeu dois suspeitos e apreendeu duas pistolas, um revólver, dois rádios comunicadores e drogas na Comunidade do Dendê. Ainda durante as ações, foram recuperados cinco veículos roubados e nove motocicletas foram recolhidas ao depósito", comunicou a corporação.
Procurada, a Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec), que representa empresas como Uber e 99, afirmou que, no momento, busca informações diretamente com órgãos oficiais de segurança.
Em maio, ao menos 30 casos de extorsão e sequestro contra motoristas de aplicativo foram denunciados na região. A Polícia Civil informou que a 37ª DP (Ilha do Governador) investiga as denúncias, mas não estimou quantas ocorrências são.
Em um grupo nas redes sociais, motoristas relatam que os bandidos fazem a abordagem e os obrigam a subir a comunidade escoltados pelo tráfico. Em seguida, recebem ordens para desbloquear o celular e fazer o pagamento de uma taxa de segurança ilegal, por meio de PIX.
Ao DIA, um motorista de aplicativo disse que quatro colegas de trabalho já foram abordados. Um outro motorista de aplicativo disse que um amigo foi sequestrado ao deixar uma passageira na Ilha do Governador. Na ocasião, os bandidos chegaram até a usar o telefone da vítima para fazer ameaças. "Tinha foto dele amarrado e áudios do bandido dizendo que ia matar", disse.
De acordo com uma denúncia do Ministério Público do Rio (MPRJ), narcomilicianos ligados à facção Terceiro Comando Puro (TCP) são acusados de cobrar taxas de motoristas de aplicativo na Ilha do Governador. A quadrilha atua na comunidade do Dendê, Pixunas e outras localidades.
Segundo o órgão, as vítimas são ameaçadas pelos grupo criminoso com o uso de armamento pesado, incluindo fuzis, e obrigados a pagar taxas semanais de R$ 150. A partir do pagamento, os motoristas seriam incluídos em cooperativas. Os grupos seriam chamados pelos criminosos de "Cooperativa do Crime" e "Cooperativa da Extorsão".
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