O ator Luiz Augusto se sente feliz ao lado de amigosDivulgação

Rio - Cantada em verso e prosa e desejo de todos os que habitam o planeta, a felicidade é uma incógnita e muito pessoal. Para a cantora Simone, pode ser uma 'cidade pequenina, uma casinha, uma colina, qualquer lugar que sei ilumina quando a gente quer amar'. Para o Seu Jorge, é 'estar sempre na companhia da sua amada, sentindo seu cheiro, curtindo uma praia bacana com um pôr do sol de arrasar'. Para o saudoso Gonzaguinha, o que importava era 'Viver e não ter a vergonha de ser feliz, cantar e cantar e cantar a beleza de ser um eterno aprendiz'.Mas afinal, será que a felicidade existe mesmo? A Organização das Nações Unidas instituiu o Dia Internacional da Felicidade, em 20 de março de 2012. De acordo com a ONU, a criação da data é o reconhecimento da importância da felicidade para o ser humano, acima dos interesses econômicos e visa demonstrar que o bem-estar deve ser a meta universal para o homem e servir para a condução política dos povos. No âmbito pessoal, o que é possível fazer para que se alcance a felicidade? Alguns especialistas dão sua opinião.
Segundo psicóloga Geoziane de Paula, a felicidade é um estado subjetivo de bem-estar e satisfação, que varia de pessoa para pessoa. "Cada um tem uma experiência diferente com a felicidade. Ela está associada a emoções positivas, como alegria e contentamento, mas também está muito conectada à realização pessoal. No entanto, não é um estado constante. É normal vivermos altos e baixos ao longo da vida", explica.
Ela afirma, porém, que a busca incessante pela felicidade pode se tornar um problema. Existe um fenômeno chamado 'felicidade tóxica', que é a pressão para estar sempre feliz e positivo, ignorando emoções naturais como tristeza ou frustração. "A positividade tóxica faz com que as pessoas sintam culpa por não estarem felizes o tempo todo. Mas a felicidade genuína não é a ausência de emoções negativas – é a capacidade de lidar com todas elas de forma mais leve", pontua Geoziane.
A felicidade espontânea e intensa das crianças, por exemplo, é algo que se perde com o tempo, conforme os adultos se tornam mais racionais e emocionalmente contidos. A pediatra Flávia Ribeiro destaca que "as crianças expressam felicidade de forma muito mais pura. Elas não têm a carga emocional dos adultos, não guardam rancor, então sorriem e se alegram com muito mais facilidade."

Coisas simples da vida

Para algumas pessoas, a felicidade está nas pequenas coisas do dia a dia. "Ela mora nos detalhes da vida. São os momentos simples, como uma conversa sincera ou um pôr do sol, que trazem mais leveza e plenitude", afirma a psicóloga Luane Neiva.
O ator Luis Augusto Brito, que tem mais de 1,1 milhão de seguidores no Instagram, também tem essa percepção. Ele compartilha uma experiência marcante sobre sua relação com a felicidade:
"Há dois anos, eu estava em São Paulo para um jantar luxuoso, enquanto meus amigos de infância estavam na minha cidade, Serra Branca, na Paraíba, comemorando o aniversário de um deles. Enquanto eu estava cercado por pratos sofisticados, eles brindavam e dançavam ao som do forró, em volta de um cuscuz recheado e uma feijoada. Me senti triste. No dia seguinte, adiantei minha passagem e voltei. Nunca senti algo tão forte como naquele momento. Mas isso não significa que dinheiro não traz felicidade porque ele traz, sim. No ano passado, fui muito feliz conhecendo a Disney, realizando um sonho de infância. Aprendi que a felicidade não está no dinheiro, mas no momento certo, no lugar certo."
Já para a empreendedora Juliana Alaite, fundadora e CEO do Grupo Neoformula, felicidade é equilíbrio entre suas diversas funções na vida. "Minha maior alegria é poder me realizar plenamente como mulher, mãe e empreendedora. Ver minha empresa crescer e impactar vidas é incrível, mas nada disso faria sentido se eu não pudesse acompanhar o crescimento das minhas filhas. A felicidade está nesse equilíbrio, em ser tudo o que fui chamada para ser."
Para Gabriel Frozi, CEO da Rio Christian School, a felicidade veio ao realizar o sonho de criar uma escola que não existia em lugar nenhum, que é preparada para quem tem TDAH e crianças com necessidades específicas:
"A alegria de ver um problema de uma filha, algo que Deus preparou para que eu fizesse a diferença, fazer uma escola diferente de todas as outras. A nossa escola tem uma metodologia própria, tem um modo de ensinar próprio, tem também um livro próprio, e a gente faz isso tudo para que a criança se sinta feliz.Então, nesse dia eu quero dizer da minha felicidade de ter uma escola que é a primeira  da América Latina preparada para estudantes com TDAH, a Rio Christian School.

Fator decisivo para o sucesso
Estudos mostram que a busca pela felicidade não se limita à vida pessoal. Cada vez mais, as pessoas priorizam o bem-estar no trabalho, muitas vezes acima dos altos salários.O especia lista em neuroliderança Rogério Babler destaca que empresas que investem no bem-estar dos colaboradores colhem benefícios significativos. "Funcionários felizes têm maior engajamento, são mais criativos e colaboram melhor entre si. Criar um ambiente que favoreça o bem-estar emocional não é apenas um diferencial, mas uma estratégia essencial para o sucesso das empresas."

'Serotonina não é imune ao que acontece ao nosso redor'

O neurologista Carlos Regoto explica que a serotonina está ligada à regulação do humor, sono, apetite e bem-estar. "Porém, ela não age sozinha e, principalmente, não é imune aos impactos do que acontece ao nosso redor. Mesmo que os níveis de serotonina estejam 'normais'', fatores externos como estresse, traumas, perdas ou ambientes negativos podem influenciar fortemente o nosso estado emocional. Isso acontece porque o cérebro interpreta e reage a estímulos do ambiente, ativando outras substâncias e sistemas (como o cortisol, o "hormônio do estresse") que podem suprimir os efeitos positivos da serotonina".
O profissional explica que o equilíbrio emocional é uma combinação entre biologia (como os neurotransmissores), ambiente e experiências. "Cuidar da saúde mental envolve tanto aspectos internos quanto externos". De acordo com o especialista, a felicidade, enquanto um estado emocional, pode, de fato, parecer efêmera em determinados momentos da vida, um sentimento que pode variar.
"Desafios, perdas e momentos difíceis podem fazer com que pareça distante, mas isso não significa que ela desapareça para sempre. Em algumas circunstâncias, ela pode parecer desaparecer temporariamente. Isso ocorre porque a felicidade não é uma condição constante ou permanente, mas sim um sentimento que está sujeito a variações de acordo com os fatores internos e externos que influenciam nossa experiência emocional".
Regoto afirma que a felicidade pode ser redescoberta e cultivada por meio de práticas como a gratidão, o cuidado com a saúde mental, a construção de relacionamentos saudáveis e a busca por um sentido ou propósito na vida.
Equilíbrio entre a saúde física e mental
Rodrigo Lang, educador corporativo e sócio fundador da Human SA, instituição focada no desenvolvimento humano por meio da promoção de saúde, felicidade e bem-estar, destaca que "o conceito de felicidade não é limitado a uma única fase da vida. Ele é dinâmico e pode ser cultivado ao longo de todas as idades, desde a infância até a terceira idade. Com as mudanças nas condições de saúde e bem-estar, é possível viver de forma plena em qualquer etapa da vida, especialmente quando adotamos um equilíbrio entre a saúde física e mental."
Ele também reforça a importância da felicidade no ambiente corporativo: "A felicidade não é apenas um estado desejável, é um facilitador de competências humanas essenciais como criatividade, colaboração e resolução de problemas", avalia.
O profissional observa que alguns gestores e líderes podem até negligenciar a importância da felicidade no cotidiano de seus colaboradores, mas ressalta que a saúde mental dos funcionários é uma responsabilidade legal dos superiores. "A felicidade e o bem-estar não só geram um ambiente mais produtivo entre os colaboradores, mas também impactam toda a rede de uma organização, incluindo fornecedores e clientes", explica.
'Pessoas felizes vivem melhor'

Em entrevista ao jornal O DIA, a especialista em Gestão de Saúde e especialista em Ciência da Felicidade pela Universidade de Berkeley, na Califórnia, Chrystina Barros, discorre sobre o tema.

O DIA: Instituído pela ONU, o Dia da Felicidade se festeja em 20 de março, mas será que a felicidade, de fato, existe?

Chrystina Barros: Claro, a felicidade existe desde antes de Cristo e ela já é estudada inclusive como um sentimento que nasce na comunidade. A felicidade é resultado da solidariedade, da vida comum entre as pessoas e, apesar de subjetiva, ou seja, cada pessoa se declara feliz em alguma medida. Ela é mensurável sim pela própria ciência e a ONU instituiu, a partir de 2012, o Dia Internacional da Felicidade, porque vários trabalhos e a experiência, a vida nos mostra que pessoas felizes vivem melhor, adoecem menos, trabalham e produzem melhor. Por isso a Assembleia Geral da ONU declara que a felicidade é o verdadeiro indicador do progresso de uma nação.

O DIA: Por qual motivo algumas pessoas são mais deprimidas e outras levam a vida de forma mais positiva, mesmo quando estão na adversidade?

Chrystina Barros: A felicidade é resultado de interações entre pessoas e da forma com que cada pessoa conduz a sua vida. Ela também tem determinantes genéticos e a neurociência avalia que até 50% da nossa felicidade está relacionada com genética. Mas a gente tem outros 50% que dizem respeito à maneira com que cada um decide encarar. Então, mesmo estando na adversidade, se a gente olhar pra aquela situação como um momento onde a gente pode aprender, aproveitar a ajuda de alguém, a proximidade com alguém, superar isso, levar isso como um aprendizado, um desenvolvimento para ajudar a outro, se a gente faz disso uma corrente, um movimento, isso deixa de ser um fator de tristeza, para ser um fator que nos faz viver, que nos faz aprender.

Então, tem pessoas que podem sim ter alguma tendência, mas a partir do momento que as pessoas têm essa consciência,  a gente consegue manejar a nossa resiliência emocional, buscar mais ajuda e melhorar relações. Isso tudo nos ajuda a converter, digamos, mesmo uma genética mais propensa a menos produção de hormônios de felicidade, a gente consegue converter isso em sensação de prazer, bem-estar e alegria.

O DIA: Muita gente diz que a felicidade é utopia, que existem apenas momentos felizes. Do ponto de vista psicológico, a felicidade existe?

Chrystina Barros: Existe até um poeta que falou que a felicidade funciona como uma utopia, ela está no horizonte. A gente dá um passo para alcançar e ela se afasta e isso faz com que a gente tenha movimento. Então, a felicidade não é um estado permanente. A gente tem a felicidade hedônica, com H, é a felicidade de hoje, o momento, aquilo que me sacia de alegria agora. É a vida valer a pena, é o longo do tempo, é o saldo, porque o dia a dia vai ter tristezas. Então, toda a vida vai ter os seus dias bons. São os fatores externos, a perda de alguém, coisas da vida que acontecem.
Do ponto de vista psicológico, sim, existe felicidade, mas ninguém vive 100% feliz. Estados de felicidade o tempo todo, ou tristeza o tempo todo, são extremos. Patológicos quanto? A felicidade é o saldo de uma vida.

O DIA: Como fazer para atingir a felicidade? Existe alguma fórmula?

Chrystina Barros: Para atingir felicidade, primeiro é essa consciência de que a gente vai ter problemas, sim, mas no dia a dia aprender a reconhecer tantas coisas boas que nos acontecem, então todo final de dia fazer uma anotação, como o meu querido diário, das coisas boas que aconteceram e reconhecer, às vezes, naquilo que parece ruim situações que podem ter nos livrado até de outros problemas. Por exemplo, peguei um engarrafamento, cheguei atrasado, será que aquilo não me livrou de um problema no meio do caminho? Então é olhar de fato as coisas positivas e aquilo que não saiu como planejado não valorizar, porque a gente nunca sabe o que aquilo pode ter trazido de coisas boas pra gente. É muito importante também a gente fortalecer as relações sociais e não por rede social. Comemorar, estar ao redor de uma mesa, compartilhar momentos, ajudar o outro literalmente sem esperar uma ação de volta. Isso tudo nos ajuda, vivendo o momento presente, tendo metas realistas para que a gente não se frustre e a gente consiga reconhecer a felicidade na simplicidade das coisas.

O DIA: Atualmente a 'felicidade é exposta' nas redes sociais. Essa seria uma 'felicidade forjada'?

Chrystina Barros: Esse é um grande problema. A gente vive hoje em redes sociais que se tornaram vitrine e que colocam a felicidade como objeto de consumo, um objeto idealizado que não existe. Isso gera frustração. A felicidade é confundida com o ter, com o ser exclusivo, com o estar na vitrine. Então, sem dúvida nenhuma, isso já leva a pessoa a frustrações e dificulta para que a gente consiga encontrar a nossa felicidade genuína.
A felicidade pode ser silenciosa, eu estou em paz, feliz comigo mesma. É óbvio, se eu quiser compartilhar, isso ajuda a espalhar felicidade. Mas as redes sociais hoje acabam se tornando um espelho irreal, porque elas são propaganda, inclusive, quando mostram dificuldades. A gente precisa ter critério para consumir isso e ali. Não tem custo para acabar com relações que nos fazem mal. A gente precisa exercitar debates, exercitar o contraditório, exercitar diálogos, ter olho no olho e estar junto às pessoas. É isso sim que nos traz felicidade.
A conclusão é que a felicidade o tempo todo vendida como uma mágica não existe, felicidade através de remédios não existe. O que a gente precisa é pegar sol, é fazer exercício, é ter sono e repouso, é desligar um pouco do celular, é tirar os alarmes todos que nos tocam o dia a dia e consomem a nossa atenção para que a gente se permita viver o tempo presente e conectar com as pessoas pelas quais a gente ama, conectar com as pessoas que a gente ama, seja o amor fraterno, seja o amor conjugal, seja qualquer tipo de amor, relação entre as pessoas, é isso que nos faz feliz, bons relacionamentos e vida real.