Flagrante do jornal Metrópoles de um encontro fora da agenda - Igo Estrela / Jornal Metrópoles
Flagrante do jornal Metrópoles de um encontro fora da agendaIgo Estrela / Jornal Metrópoles
Por DIRLEY FERNANDES

Rio - 'É como um zumbi aqui no Senado", diz João Capibaribe (PSB-AP). Não é bem assim. Agora, ele age nas sombras. Aécio Neves (PSDB-MG), principal articulador do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, que se tornou protagonista de uma das mais espetaculares debacles da vida política brasileira - saindo da condição de candidato a presidente com 51 milhões de votos e líder inconteste da oposição para a de réu no Supremo e colecionador de inquéritos -, no entanto, não está morto. Aécio ainda tem influência e poder a nível nacional e estadual - além de amigos poderosos. Na quinta-feira, 21, um jantar reuniu os presidentes da República, Michel Temer (PMDB-SP), e da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ). O interlocutor dos dois, no encontro fora da agenda, foi justamente Aécio.

"Ele continua sendo uma liderança com poder de articulação em Brasília, importante na aliança que dá sustentação ao governo Temer no Congresso. Foi o PSDB do Aécio que articulou e criou as condições para o impeachment e foi a boa articulação entre PMDB e PSDB em Brasília, arquitetada por ele, que garantiu a manutenção de Temer na presidência", diz o cientista político Felipe Nunes, do Centro de Estudos Legislativos da UFMG.

A escolha de Aécio como o interlocutor tucano dos dois líderes, em vez do presidente e candidato do PSDB, Geraldo Alckmin, tem um motivo claro: os três discutiam o desempenho pífio da campanha do próprio Alckmin. Em momento nenhum, o fato de o tucano ser réu por corrupção no Supremo Tribunal Federal e responder a outros sete inquéritos entrou no cálculo. A possibilidade de um 'golpe' no ex-governador paulista, com a troca pelo ex-prefeito paulista João Doria, que poderia juntar os partidos do centro, foi o prato principal da noite. "Aécio tem todo o interesse em eliminar Alckmin da disputa. Ele e José Serra são os seus principais adversários no partido", diz o cientista político Rudá Ricci, que acabou de escrever um livro sobre a carreira de Aécio, que será lançado ainda esse ano. "O ódio entre Alckmin e Aécio é visceral. E aumentou com o impeachment. O PSDB de São Paulo acha que o Aécio exagerou demais na ânsia de derrubar a Dilma, que o derrotou nas urnas numa eleição que era considerada ganha. O PSDB hoje tem uma péssima imagem. Isso está na conta do Aécio. Para os paulistas, ele é um carreirista que se utiliza do partido".

De toda forma, a última semana trouxe duas boas notícias para o senador. Na sexta-feira, o ministro Gilmar Mendes, do STF, arquivou o inquérito que investigava o envolvimento de Aécio em propinas na estatal Furnas. A Polícia Federal não achou provas contra o senador. Gilmar foi gravado numa famosa conversa com Aécio na qual se comprometia a influenciar a opinião do "amigo em comum", senador Flexa Ribeiro, para que ele apoiasse a posição do mineiro em um projeto contra abuso de autoridade, que tentava conter o ímpeto dos procuradores da Lava Jato.

LÍDER NAS PESQUISAS

Antes, na terça-feira, uma pesquisa do DataPoder360 mostrou o tucano embolado no primeiro lugar na preferência do eleitor mineiro para a eleição ao Senado. Junto com ele, um emedebista (Bruno Siqueira) e, numa ironia do destino, uma adversária já conhecida: a petista Dilma Rousseff. Uma disputa que promete.

No entanto, Aécio ainda não definiu se vai disputar a reeleição. Geraldo Alckmin tem arrepios só de pensar na ideia. "É uma decisão de foro íntimo. O senador Aécio tem um capital político que deve ser respeitado, diz o presidente do PSDB em Minas, deputado Domingos Sávio. "Mas não é novidade que o senador está voltado para a defesa nos processos que pesam contra ele. A nossa prioridade é a eleição de Anastasia".

"Aécio detém o controle do partido, pelo menos em Minas. É compreensível que esteja fazendo um cálculo regional de manutenção de poder deixando em segundo plano a disputa nacional. É quase uma questão de sobrevivência", diz Nunes.

REENCONTRO QUASE MARCADO
Aécio Neves abandona disputa com Dilma Rousseff ao Senado por Minas Gerais
Aécio Neves abandona disputa com Dilma Rousseff ao Senado por Minas Geraisdivulgação
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A ex-presidente Dilma Rousseff será candidata ao Senado por Minas Gerais. Com isso, caso se confirme a candidatura de Aécio Neves, haverá uma reedição em nível local da campanha de 2014 à presidência. A decisão de Dilma teve um forte patrocinador: o ex-presidente Lula.
O cálculo do ex-presidente é que Dilma poderá polarizar não só com Aécio Neves, como também Antonio Anastasia, candidato a governador tucano e relator do impeachment da ex-presidente no Senado. "A estratégia é nacionalizar a campanha e a Dilma vai seguir essa linha. Dessa maneira, ela libera Fernando Pimentel (governador petista e candidato à reeleição) para fazer uma campanha mais leve, voltada para os problemas locais", diz o cientista político Rudá Ricci.
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"Minas terá a eleição mais nacionalizada de sua história. O cenário não me parece ser de vantagem pra ninguém. Vai ganhar a eleição quem conseguir convencer o eleitor mediano, aquele que tem saudade dos anos Lula, está preocupado com o desemprego, a falta de perspectivas e com a queda na sua qualidade de vida", diz Felipe Nunes, da UFMG. "O apoio do Aécio prejudica a estratégia de Anastasia, mas não há como discutir o projeto do PSDB em Minas sem pensar nas duas figuras".
Com as pesquisas indicando uma boa posição, mas uma disputa acirrada, Aécio se arrisca a perder a eleição, como perdeu no estado a disputa com Dilma em 2014. "Não podemos desconsiderar que o PT sabe desconstruir candidatos", lembra Ricci. "Ele tem problemas. Mas tem apoios locais, conquistados no tempo de governador. Não há dúvida de que ele vai ter voto".
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'Aécio apareceu como figura inovadora, não é verdadeiro'
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O cientista político Rudá Ricci se debruçou sobre os oito anos do governo Aécio Neves em Minas para escrever 'Conservadorismo político em Minas Gerais'. A obra revela o senador mineiro como um "facilitador", alguém que nunca exerceu liderança nos municípios mineiros, mas construiu acordos com chefes locais, por meio de arranjos clientelistas. Essa base, espalhada por diversas regiões do estado, ainda pode lhe garantir uma base política e a sobrevivência, acredita o pesquisador.
Aécio ainda manda muito em Minas, apesar de tantos problemas na Justiça? A posição dele na pesquisa para o Senado é boa, mas ele perdeu a eleição para presidente no estado em 2014.
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Na verdade, o problema do Aécio em Minas Gerais não vem da situação atual, dos processos que destruíram a imagem e a influência dele em nível nacional. Ele cumpriu oito anos de governo aqui em Minas Gerais apoiado pelo Lula. A bancada do PT evitou críticas porque Lula queria que o Aécio rachasse o PSDB. Em 2014, Aécio enfiou o Pimenta da Veiga como candidato a governador para atender o PSDB de São Paulo, quando havia candidatos melhores na base dele, que é mais à direita do que o PSDB nacional. Pimenta perdeu no primeiro turno para o Fernando Pimentel (PT). Esse erro rachou a base do Aécio, que é o DEM e o PP mais do que o PSDB. Ele perdeu influência. Mas tem acordos em vários níveis. Pode competir.
Ele vai ser candidato ou não? Não seria mais fácil uma cadeira na Câmara?
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A composição aqui em Minas é muito complexa, mas fez o Aécio voltar a cena política, não exatamente pelos braços do PSDB, mas pelos braços do DEM e do PP. Mas a situação continua instável. Como deputado, claro que ele seria eleito, mas não é a mesma coisa. Na verdade, a maioria do eleitorado brasileiro não vota em deputado federal, estadual e senador, o eleitorado brasileiro não vê a importância do Congresso. O Aécio Neves tem apoios locais. Vou te dar um exemplo: em São João Del Rei, o apoio vem dos médicos, que utilizam dois hospitais privados para cirurgias. O hospital é uma máquina fundamental para conseguir votos, porque os aliados do Aécio fazem emendas parlamentares destinando recursos.
Como o Aécio construiu a liderança dele?
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O Aécio se elege pela primeira vez como deputado federal logo depois da morte do Tancredo e ele se elege com mais de 140 mil votos. Na reeleição dele, faz apenas 47 mil. Mas, depois,ele começa a aparecer no cenário nacional como figura inovadora, o que não é verdadeiro. Ganha o governo de Minas, assumindo muitos compromissos. Ele monta uma gestão que tem uma face de modernidade na face aparente, enquanto, por trás, deixa espaço para as velhas lideranças tirarem proveito da máquina. A Cidade Administrativa (obra grandiosa, que virou alvo de inquérito) é um símbolo desse modo de agir.
 
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