Local destruído pelos rejeitos após o rompimento da barragem da mina do Feijão, em Brumadinho, Minas Gerais - RODNEY COSTA/ELEVEN/ESTADÃO CONTEÚDO
Local destruído pelos rejeitos após o rompimento da barragem da mina do Feijão, em Brumadinho, Minas GeraisRODNEY COSTA/ELEVEN/ESTADÃO CONTEÚDO
Por GUSTAVO RIBEIRO

Belo Horizonte - Omissões de todos os lados contribuíram para o desastre na barragem da Vale em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte. Segundo especialistas, medidas preventivas vêm sendo desprezadas por governantes, parlamentares e empresas para evitar outras tragédias após o rompimento da barragem da Samarco, em novembro de 2015, em Mariana (MG).

O movimento Baía Viva, do Rio, denunciou que alertou ao MPF, em julho de 2018, sobre "elevado risco de novos desastres" em 600 barragens em MG com 123 milhões de toneladas de rejeitos depositados precariamente, mas não soube de providências. O MPF ainda não comentou.

"Só na Região Metropolitana de BH, ao longo de 20 anos tivemos quatro rompimentos de barragens de mineração. É uma tragédia que se repete. Tivemos omissão do Governo do Estado, dos empreendedores e da sociedade, que não fez as pressões devidas para que atitudes fossem tomadas", diz Ricardo Mota Pinto Coelho, professor do Departamento de Geociências da Universidade Federal de São João del-Rei.

Para Mota, o governo de Minas peca em fiscalização precária e em falta de informação e treinamento de risco à população das áreas críticas. As mineradoras, diz ele, erram em esconder os riscos: "A população tem direito de saber onde estão as barragens com problemas". Ele também critica a falta de punição aos responsáveis pelos crimes ambientais em Macacos (2001), Itabirito (2014) e Mariana (2015), todos com vítimas fatais.

Coordenador do projeto Manuelzão, da UFMG, que monitora as bacias hidrográficas mineiras, Marcus Vinícius Polignano fala em ganância das mineradoras. Segundo ele, existe tecnologia para se fazer barragens a seco, mas geralmente elas são montadas com água, que umedece e fragiliza a base da estrutura. Foi o que ocorreu em Mariana e pode ter sido o caso de Brumadinho. "As empresas continuam reproduzindo os mesmos erros porque privilegiam o lucro em vez de vidas e do meio ambiente", afirma.

De acordo com Polignano, um projeto de lei de iniciativa popular com 50 mil assinaturas foi apresentado à Assembleia Legislativa de MG para mudar as regras da mineração, mas acabou derrubado no ano passado. A facilidade do licenciamento ambiental pelo governo estadual é outra crítica dele.

Impactos que duram por décadas

Os impactos ao Rio Paraopeba, que foi tomado pela lama e desemboca no São Francisco, podem perdurar por pelo menos uma década. A estimativa é do professor Ricardo Mota Pinto Coelho. Entre os efeitos, ele cita a poluição dos reservatórios subterrâneos de água. "A população usa muitos poços artesianos, e essa água tem que ser analisada."

Segundo Marcus Polignano, não será possível recuperar o ecossistema, com riscos à saúde. "Muda toda a biodiversidade. Não podemos descartar um efeito de doenças como a febre amarela", comentou ele, que é médico sanitarista. Em 2017, a bióloga Márcia Chame, da Fiocruz, disse que o surto da doença pode ter tido relação com o desastre de Mariana, devido à migração de macacos das matas para perto dos humanos. Ao picar um primata contaminado, o mosquito recebe o vetor da febre amarela e transmite o homem.

O rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, em 5 de novembro de 2015, causou o maior desastre ambiental do país até o momento e matou 19 pessoas. Os rejeitos transformaram o Rio Doce em lama. A Vale, uma das controladoras da Samarco, ainda responde na Justiça pelo incidente.

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