O presidente Luíz Inácio Lula da Silva anunciou na manhã desta sexta-feira, 9, os primeiros nomes do seu ministério. O ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad comandará a economia. O ex-governador da Bahia Rui Costa assumirá a Casa Civil, principal área de articulação política da Presidência. José Múcio, ministro aposentado do Tribunal de Contas da União (TCU), será o ministro da Defesa e fará a interlocução com as Forças Armadas. Mauro Vieira foi indicado para chefiar o Itamaraty e liderar o processo de recuperação da imagem brasileira à frente do Ministério das Relações Exteriores. Já o senador eleito Flávio Dino vai ocupar o Ministério da Justiça.
O anúncio aconteceu no Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) em Brasília, onde atua a equipe de transição de governo. De acordo com o presidente eleito, nas próximas semanas será feito o anúncio dos nomes de mais ministros.
Lula adiantou que, embora não tenha anunciado mulheres nem negros neste momento, o ministério contará com a participação desses segmentos da sociedade. "Vai chegar uma hora que vão ver mais mulheres do que homens e participação de afrodescendentes", disse. Ele ainda acrescentou que o governo mantém a ideia de recriar o Ministério da Segurança Pública e que as Forças Armadas devem proteger o povo e não "fazer política".
O petista classificou a transição como a "mais democrática" já feita. "Me impressionou a quantidade de voluntários na transição. Não utilizamos o dinheiro disponibilizado", afirmou.
Na ocasião, o presidente eleito afirmou que a tarefa incumbida aos escolhidos "será sempre mais difícil do que as que já cumpriram". "Haddad sabe da responsabilidade dele. O Dino sabe. O Rui sabe", afirmou Lula, acompanhado dos ministros anunciados, acrescentando que o governo eleito não tem o direito de "não fazer a coisa correta".
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"Se fosse perguntado (sobre se o governo vai dar certo) eu diria 100% de chance de dar certo", disse o petista a jornalistas. "Esses companheiros anunciados hoje, espero que passem a trabalhar como jamais trabalharam", acrescentou.
"Não temos direito de frustrar expectativa de grande parcela da sociedade", apontou Lula, afirmando ser necessário "respirar" mais democracia, salário e liberdade de expressão, garantindo ainda que no seu governo "ninguém vai negar informações para a imprensa".
Lula também afirmou que o Brasil precisa voltar a ter política externa como protagonista, citando o ex-ministro Celso Amorim. "Como diz Celso Amorim, (política externa) ativa e altiva", apontou.
Fernando Haddad no Ministério da Fazenda
A Pasta retomará o antigo nome que foi alterado durante o mandato de Jair Bolsonaro (PL) para se tornar um superministério, o da Economia, e conceder mais poderes a Paulo Guedes. "Preciso que algumas pessoas comecem a trabalhar para montar o governo e para que nossa estrutura comece a funcionar", disse Lula.
O ex-prefeito de São Paulo, Haddad sempre esteve na lista de favoritos de Lula. Tudo dependia da disputa nas eleições deste ano pelo governo de São Paulo. Apesar de derrotado, Haddad obteve a maior votação do partido em solo paulista desde a redemocratização, o que embalou a eleição do presidente eleito e praticamente carimbou o passaporte do aliado para a Esplanada dos Ministérios.
O nome do ex-prefeito ganhou ainda mais força após ele acompanhar Lula em viagem à Conferência do Clima (COP-27) no Egito e a Portugal. Para reduzir resistências do mercado ao seu nome, Haddad voltou a circular entre agentes do setor, de olho no comando da Fazenda.
Economistas do mercado preferiam alguém mais liberal a Haddad na Fazenda. Mais recentemente, ele foi substituir Lula em um evento da Febraban e, a mando do presidente eleito, passou a acompanhar a equipe econômica da transição. Na quarta-feira, 7, esteve reunido com representantes do Banco Mundial (Bird) e, na quinta-feira, 8, se encontrou com Paulo Guedes no Ministério da Economia.
Haddad foi ministro da Educação durante as gestões de Lula e Dilma Rousseff, entre 2005 e 2012. Ele também disputou a reeleição na prefeitura de SP em 2016, as eleições presidenciais de 2018.
O novo ministro nasceu em 25 de janeiro de 1963, em São Paulo. É formado em direito pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco, da Universidade de São Paulo (USP). Possui mestrado em economia, com doutorado em filosofia, ambos pela USP.
Sua vida pública teve início em 2001, quando foi nomeado chefe de gabinete da Secretaria de Finanças e Desenvolvimento Econômico da capital, durante a gestão de Marta Suplicy.
Ele deixou a secretaria no primeiro semestre de 2003, quando assumiu a Assessoria Especial do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, a convite de Guido Mantega, ministro do Planejamento do governo de Lula. No posto, foi um dos responsáveis pela formatação da Lei da Parceria Público Privada (PPP).
Em 2004, migrou para o Ministério da Educação, na época comandado por Tarso Genro, ocupando o cargo de secretário-executivo. No ano seguinte, assumiu o comando da pasta, onde permaneceu até 2012.
Durante sua gestão, foi implementado o Programa Universidade Para Todos (ProUni). Haddad colocou em prática o Plano de Desenvolvimento da Educação e criou o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). Ele também foi um dos idealizadores do Sistema de Seleção Unificada (Sisu), que permite que estudantes de escolas públicas usem a nota do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) para acessar o ensino superior.
Em 2012, foi eleito prefeito de São Paulo, após derrotar José Serra (PSDB) no segundo turno, com 55,57% dos votos válidos contra 44,43%. Um dos principais focos de seu mandato foi a mobilidade urbana. Haddad promoveu mudanças nos itinerários de ônibus da capital e criou 200 km de corredores exclusivos para estes veículos.
Enquanto esteve no cargo, o então prefeito enfrentou forte rejeição, impulsionada pelo impeachment de Dilma Rousseff e sentimento antipetista, que crescia diante dos avanços da Operação Lava Jato.
Em 2016, Haddad disputou a reeleição, mas foi derrotado por João Doria (PSDB) no primeiro turno. O tucano teve 53,29% dos votos válidos, contra 16,70% de Haddad. Em 2018, substituiu Luiz Inácio Lula da Silva na disputa presidencial, depois que o ex-presidente foi preso no âmbito da Operação Lava Jato.
Inicialmente, Haddad era o candidato a vice-presidente na chapa de Lula. O petista foi para o segundo turno com Jair Bolsonaro (então, PSL) e foi derrotado. Haddad obteve 44,87% dos votos válidos, contra 55,13% do atual presidente.
Rui Costa como Ministério da Casa Civil
O PT tem uma espécie de "dívida" com Rui Costa, que abriu mão de disputar o Senado para manter a aliança com o PSD na Bahia. Após dois mandatos, Costa lançou o afilhado político Jerônimo Rodrigues para concorrer ao governo e apoiou a reeleição de Otto Alencar ao Senado. Os dois saíram vitoriosos.
Homem da confiança de Lula, Rui Costa é visto com reservas no PT por sua postura "pouco à esquerda", na avaliação de filiados, e favorável a discutir privatizações. A expectativa é que ele assuma uma postura essencialmente "gerencial" no Ministério responsável por acompanhar os projetos do governo.
A articulação para levar Costa à Esplanada dos Ministérios foi feita pelo senador Jaques Wagner (PT-BA), amigo pessoal do presidente eleito e padrinho político do governador da Bahia.
O economista formado pela Universidade Federal da Bahia (UFBA) nasceu em Salvador no dia 18 de janeiro de 1963. Rui Costa é o atual governador da Bahia, eleito em 2014 e reeleito, no primeiro turno, quatro anos depois.
Iniciou sua trajetória política, com atuação no movimento sindical, no Polo Petroquímico de Camaçari, na década de 1980. Ele foi vereador em Salvador e ganhou destaque como secretário estadual durante a gestão de Jaques Wagner (2007-2014) do estado da Bahia.
O político foi secretário de Relações Institucionais, elegeu-se deputado federal e, depois, assumiu a Casa Civil do governo de Jaques Wagner, que o indicou para concorrer ao governo da Bahia. Rui Costa foi eleito governador da Bahia em 2014 e em 2018.
José Múcio como ministro da Defesa
O favoritismo de José Múcio aumentou ao longo do mês de novembro, devido à resistência de setores das Forças Armadas a um nome petista à frente da Pasta, como o senador Jaques Wagner, ex-ministro da área no governo Dilma e até então o preferido de Lula. Também chegaram a ser considerados para o cargo os ex-ministros da Pasta Nelson Jobim, e Celso Amorim, além do coordenador técnico da transição, Aloizio Mercadante.
Cortejado por Bolsonaro, bem visto pelos militares, amigo de Lula e ex-defensor de Roberto Jefferson, Múcio não é um "esquerdista raiz" e é reconhecido em Brasília por sua habilidade em transitar em todos os pólos da política nacional. Um perfil adequado, na avaliação tanto do entorno do presidente eleito quanto na caserna, para pacificar a relação entre o grupo político do PT e as Forças Armadas.
As Forças Armadas (Exército, Marinha e Aeronáutica) integram a estrutura do ministério, que voltará a ser comandado por um civil. Desde 2018, ainda no governo de Michel Temer (MDB), que o titular da pasta é um general do Exército.
Nascido em Recife (PE), José Múcio Monteiro é engenheiro civil. Ele foi deputado federal, secretário estadual, ministro de Estado e ministro do TCU — entre 2019 e dezembro de 2020, quando se aposentou.
Múcio iniciou a carreira política na década de 1970 e, ao longo dos anos, passou pelos pelas siglas PFL, PSDB e PTB. Já foi vice-prefeito e prefeito da cidade de Rio Formoso (PE). Na sequência, foi secretário de Transportes, Comunicação e Energia de Pernambuco.
Múcio teve cinco mandatos de deputado federal por Pernambuco. No período, se licenciou para assumir a Secretaria de Planejamento, Urbanismo e Meio Ambiente de Recife. Também se licenciou em 2007, no segundo mandato de Lula como presidente, para ser o ministro-chefe da Secretaria de Relações Institucionais da Presidência da República.
Ele ficou à frente da pasta, responsável pela articulação política do governo, até 2009, quando foi indicado por Lula para o TCU. E permaneceu 11 anos no tribunal.
Flávio Dino no Ministério da Justiça
Elogiado tecnicamente pelos pares, bom de retórica e acessível à imprensa desde que começou a fazer parte do governo de transição, Dino foi um dos primeiros nomes a surgir como praticamente uma unanimidade para comandar um dos prédios da Esplanada dos Ministérios em Brasília. Nos últimos dias, ele já era tratado como ministro informalmente por jornalistas e demais membros do governo de transição.
Vários foram os relatos de que Dino deveria comandar o Ministério da Justiça ou o de Segurança Pública. Poderia ser um terceiro ainda, que consolidasse as duas Pastas. Lula não mencionou Segurança Pública no anúncio.
Dino já adiantou que o relatório da equipe de transição da qual faz parte deve indicar a revogação do decreto que flexibilizou o uso de armas e recomendar que se passe um pente fino nos clubes de tiros abertos no país com uma frequência muito maior durante o governo de Jair Bolsonaro do que em anos anteriores.
Enquanto coordenador do grupo técnico de Justiça, Dino também defendeu uma atuação mais restrita da Polícia Rodoviária Federal. Na avaliação dele, as medidas tomadas ao longo do governo Jair Bolsonaro permitiram que a instituição avançasse em atribuições que, originalmente, não caberiam à força policial.
A frente do ministério mais antigo do Brasil, Dino terá a missão de manter um bom diálogo do Executivo com o Poder Judiciário e lidar com as polícias de todo o Brasil, instituições que sofreram grande influência do bolsonarismo nos últimos anos.
Flávio Dino de Castro e Costa tem 54 anos, é advogado, ex-juiz, professor e político. Ele nasceu em São Luís (MA) e é formado em Direito pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA) e mestre pela Universidade Federal de Pernambuco (UFBE).
Dino foi juiz federal entre 1994 e 2006. Depois exerceu o cargo de deputado federal (2007-2011). Em seguida, assumiu a presidência da Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, entre 2011 a 2014.
Nos anos seguintes, foi eleito governador do Maranhão por duas vezes (2015-2022). Em 2022, renunciou aos meses finais no cargo para concorrer ao Senado Federal.
Nas eleições de 2022, Dino foi eleito senador da República pelo estado do Maranhão com 63,38% dos votos. Ele deve pedir licença do Senado para assumir o Ministério da Justiça.
Mauro Vieira como ministro das Relações
Após anunciar outros quatro ministros mais cedo, Lula fez a indicação do embaixador como chanceler. "Por último, na Croácia, Mauro Vieira será o ministro das Relações Exteriores. Tenho grande relação com Vieira e o escolhi para o Itamaraty", disse o presidente eleito.
Apesar do corpo diplomático estar satisfeito com o fato do presidente eleito ter escolhido um profissional de carreira, a indicação de Vieira não agrada a todos os servidores do Itamaraty. O embaixador anunciado por Lula já foi chanceler durante o governo de Dilma Rousseff (PT).
Vieira é muito próximo de um de seus antecessores, Celso Amorim, um dos conselheiros mais próximos de Lula na política internacional. Esta proximidade incomoda diplomatas, pois temem que o novo ministro seja apenas um "fantoche" no cargo.
Mauro Vieira nasceu em 15 de fevereiro de 195, estudou no Colégio Salesiano Santa Rosa, em Niterói e é bacharel em direito pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Funcionário de carreira do Itamaraty, Vieira se formou na academia diplomática brasileira, o Instituto Rio Branco, em 1974.
Como embaixador, Vieira serviu, entre 1982 e 1985, na Missão do Brasil junto a Associação Latino-Americana de Integração (Aladi) em Montevidéu, Uruguai. Ele também trabalhou na Embaixada do Brasil na Cidade do México, de 1990 a 1992; na embaixada do Brasil em Paris, entre 1995 e 1999.
Em 2000, foi admitido pelo presidente Fernando Henrique Cardoso a Ordem do Mérito Militar no grau de Oficial Especial, sendo promovido pelo presidente ao grau de Comendador em 2001. Após seu período na secretaria, foi embaixador do Brasil na Argentina de 2004 a 2010, já durante o governo Lula. Em 2005, foi promovido pelo então presidente ao grau de Grande-Oficial da Ordem do Mérito Militar. Após a exoneração, foi nomeado embaixador do Brasil nos Estados Unidos de 2010 a 2015.
Em 2015, retornou ao Brasil e foi indicado como Ministro das Relações Exteriores de Dilma Rousseff. Foi exonerado da chefia do Itamaraty após o impeachment da ex-presidente. No ano seguinte, Vieira foi nomeado pelo ex-presidente Michel Temer para o cargo de representante permanente do Brasil na Organização das Nações Unidas (ONU). No governo Bolsonaro, ele foi designado para o cargo de embaixador do Brasil em Zagreb, na Croácia.
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