Imagens mostram o momento em que o policial atirou no jovemReprodução: vídeo

Espírito Santo - A Vara de Auditoria Militar de Vitória manteve a prisão preventiva de cinco policiais militares envolvidos na morte de um adolescente, de 17 anos, que já estava rendido durante uma abordagem em Pedro Canário, no Espírito Santo. A decisão acolheu um pedido do Ministério Público Militar (MPM) e partiu do juiz Getúlio Marcos Pereira Neves, durante audiência de custódia na quinta-feira, 2. Segundo o magistrado, "não há dúvida de se tratar de crime militar".
Os cinco agentes foram presos na última quarta-feira, 1º, e ouvidos na sede do 13º Batalhão de São Mateus, de onde seguiram até o presídio da PM em Vitória. A defesa dos acusados solicitou "liberdade mediante aplicação de medidas cautelares", sob o argumento de que eles possuem "diversos elogios nas fichas funcionais, como destaque operacional".
"No primeiro momento, os acusados usaram o direito ao silêncio, o que não traz prejuízo a eles, porque os fatos serão todos investigados. Mas neste momento, para resguardar a investigação e inclusive a vida dos indiciados, em virtude da comoção que o caso gerou, o MP entende que há elementos para converter o flagrante em prisão preventiva", manifestou o MPM.
Já a defesa dos agentes pediu a liberdade com a aplicação de medidas cautelares. A defesa declarou que os cinco policiais possuíam "diversos elogios nas fichas funcionais, como destaque operacional".

Após ouvido o MPM e a defesa dos militares, o juiz "homologou o flagrante e considerou que os fatos merecem rigorosa apuração". O magistrado entendeu que a "ocorrência atenta contra a garantia da ordem pública, que cabe aos policiais militares assegurar com sua atuação" e que a prisão preventiva seria necessária para a elucidação dos fatos". Por isso, determinou a "prisão preventiva dos acusados na forma do artigo 254 do Código de Processo Penal Militar".
"Trata-se de uma guarnição em serviço, portanto, não há dúvida se tratar de crime militar, que apenas não é julgado nesta AJMES (Auditoria da Justiça Militar do Espírito Santo), como determina a Constituição Federal. A critério deste juízo, a ocorrência atenta contra a garantia da ordem pública, que cabe aos policiais militares assegurar com sua atuação", declarou o juiz.

O magistrado ainda destacou que até aquele momento não havia uma certeza sobre qual dos militares foi o autor dos disparos. "Ademais, a surpresa geral e também no seio do efetivo com o resultado dessa diligência contribui para se colocar em dúvida os preceitos de hierarquia e disciplina que devem nortear a ação policial militar, porque neste momento não se tem certeza, por exemplo, sobre quem efetuou os disparos, cabendo aos mais antigo da guarnição a obrigação legal de evitar o dano", afirmou.
Crime
A morte do adolescente foi registrada por câmeras de segurança. As imagens que circularam nas redes sociais mostram o rapaz algemado e encostado em um muro. Três policiais participaram da cena, mas os disparos partiram de apenas um deles.
No vídeo, é possível ver um policial de frente para o adolescente, que está sentado em uma calçada. Um segundo militar pula o muro e se aproxima, enquanto o primeiro PM caminha em direção ao carro de polícia que estava estacionado.

É possível ver ainda que o militar que pulou o muro, fica de frente para o jovem, que levanta e permanece com as mãos para trás. O militar encosta no adolescente, que dá três passos para trás, momento em que o PM atira à queima roupa, ao menos duas vezes, sem possibilidade de defesa da vítima.

A polícia afirma que os PMs que cometeram o assassinato teriam apreendido uma arma usada por Carlos Eduardo para trocar tiros com os policiais no quintal de um imóvel que aparece no vídeo.

As imagens mostram ainda que o policial que estava caminhando até o carro da polícia, após ouvir os disparos, não esboçou nenhuma reação. O militar que atirou se aproxima do adolescente e, logo em seguida, um terceiro PM sai de dentro da residência.

O registro da câmera também mostrou que o policial que atirou arrasta o corpo de Carlos Eduardo para dentro do imóvel de onde o terceiro militar saiu.

Depois de ferido, ele foi levado ao Hospital Menino Jesus, na mesma cidade da ocorrência, mas já chegou na unidade hospitalar morto.
Apuração sobre o caso
Após a execução do jovem, o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande, disse nas redes sociais que havia recebido as imagens e que determinou que sejam tomadas as providências imediatas à apuração do caso.

"Recebi imagens de uma aparente execução em abordagem de policiais militares em Pedro Canário que não condizem com o dever da PM. Determinei que sejam tomadas as providências imediatas à apuração do caso", escreveu.

Em nota enviada à imprensa, o Ministério Público do Espírito Santo (MPES) informou que, por meio da Promotoria de Justiça junto à Auditoria da Justiça Militar Estadual e da Promotoria de Justiça de Pedro Canário, que está fiscalizando e acompanhando com" rigor as apurações do caso, para a posterior adoção das medidas cabíveis e previstas em lei, ao final das investigações".

Em ofício encaminhado à Secretaria de Segurança Pública do Espírito Santo, a Defensoria Pública do estado (DPES) requereu o imediato afastamento dos policiais envolvidos na morte do adolescente, além dos “dados funcionais dos policiais; a instauração de processo administrativo e os dados dos familiares da vítima”, para que seja feito o acompanhamento jurídico.

A Secretaria de Segurança tem 24h para repassar as informações. Caso o prazo não seja cumprido, a Defensoria adotará as medidas extrajudiciais e judiciais cabíveis. Além disso, a DPES, também recomendou que o estado adote, em "caráter de urgência", a instalação de câmeras de videomonitoramento nos uniformes dos agentes.

"A Instituição, por meio de diversas ações civis públicas, pede o uso de câmeras corporais em agentes penitenciários, policiais militares e civis. Para a Defensoria, o equipamento pode garantir a integridade do cidadão, da pessoa presa e dos próprios profissionais de segurança, durante as abordagens", disse em nota.
Ordem dos Advogados aponta diferença entre boletim e vídeo

O secretário-geral da Ordem dos Advogados do Brasil no Espírito Santo (OAB-ES), Alberto Nemer Neto, afirmou na quinta que existe uma "discrepância" entre o narrado pelos policiais militares no boletim de ocorrência e o vídeo que mostra a execução do adolescente. Ele ainda declarou que colocará duas comissões à disposição para tratar do caso.

"No boletim de ocorrência há uma narrativa de que houve resistência, tentativa de puxar uma arma da cintura, e pelas câmeras nada disso ocorreu, então, é de forma bem pontual que a gente verifica uma discrepância entre o que o vídeo nos mostra e o que foi narrado pelos policiais", declarou Alberto Nemer Neto em entrevista para a "TV Gazeta".

"Independentemente se a vítima tem ou não uma ficha criminal extensa, nada justifica o que as imagens nos mostram. A diferença entre o que foi narrado no boletim de ocorrência com as imagens é gritante. (...) Vamos cobrar uma posição firme das autoridades, para que os relatos sejam fiéis ao que ocorre, não só desse caso obviamente, mas de todos os outros nos quais, às vezes, não têm câmera, para que seja evidenciado algo contrário do narrado no boletim de ocorrência", acrescentou.

O secretário-geral ainda explicou que a instituição possui comissões temáticas e, neste caso específico, designará duas delas para acompanhar o caso: a de direitos humanos e a de segurança pública. "Neste momento, nós queremos ser mais um braço para que este crime, esta barbárie, não fique impune", concluiu.