Julgamento no STF pode interferir na tramitação do PL das Fake NewsValter Campanato/Agência Brasil
Entenda o caso que chegou ao STF
Em primeira instância, o juiz determinou a remoção do conteúdo, o que foi cumprido pelo Facebook, mas negou a indenização com base no artigo 19 do Marco Civil da Internet, alegando que a rede social não poderia ser responsabilizada por não agir sobre um conteúdo antes da determinação judicial.
Em segunda instância, porém, a Justiça condenou o Facebook a pagar indenização à mulher, citando as garantias constitucionais à honra, intimidade, imagem e privacidade.
O Facebook, então, recorreu da decisão, e o caso chegou ao STF ainda em 2017, mas não foi julgado desde então. A repercussão geral do caso foi reconhecida, o que significa que o que a Corte decidir sobre esse caso tem validade geral para julgamentos que envolvam o artigo 19 do Marco Civil da Internet.
Para o pesquisador, a ideia do STF é dar uma resposta à sociedade a respeito da crescente discussão sobre a responsabilização das plataformas digitais no que diz respeito à propagação de conteúdos com desinformação, ódio e violência.
"O Supremo quer ser uma das instituições a dar uma resposta para a população brasileira a respeito disso, e vai usar essa discussão do artigo 19 como veículo para entregar essa mensagem", opina João.
No julgamento previsto para esta quarta-feira, o STF pode decidir por três caminhos: considerar o artigo 19 do Marco Civil da Internet inconstitucional; considerá-lo constitucional; ou ter uma interpretação conforme do artigo 19.
Atualmente, o Marco Civil da Internet já prevê uma exceção ao artigo 19, que é o caso de divulgação de conteúdos pornográficos sem a autorização do cidadão. Nesse caso, se um usuário solicitar a remoção de um conteúdo pornográfico publicado sem sua autorização, a rede social é obrigada a removê-lo imediatamente, mesmo sem que o caso chegue a Justiça antes.
"O Supremo pode decidir que não é só em caso de pornografia que pode haver esse tipo de exceção, mas também em casos de violação da honra e da imagem, que é a discussão nesse caso concreto que chegou para o Supremo. Mas o STF pode eventualmente expandir isso e abrir exceções para ataques às escolas e crimes contra o estado democrático de direito", explica João.
O PL das Fake News prevê, portanto, responsabilização administrativa (como multa ou advertência) para plataformas que não cumprirem algumas obrigações, como publicar relatórios de transparência sobre moderação de conteúdo e seguir determinações de auditorias externas.
Essa nova legislação é compatível com o Marco Civil da Internet, que prevê responsabilização civil em relação a conteúdos individuais, como o pagamento de indenização por descumprimento de determinação judicial, por exemplo. Ambas as regras, portanto, devem se complementar.
Se o STF decidir por determinar uma interpretação do Artigo 19, adicionando exceções a ele, a discussão sobre o PL das Fake News pode mudar um pouco, sobretudo no que diz respeito à responsabilização das plataformas.
"Se isso acontecer, o Congresso vai ter que se limitar a uma regulação focada em transparência, em questão de processo de moderação de conteúdo e direitos dos usuários. Aquelas partes do texto que falam sobre responsabilidade das plataformas talvez já não façam mais sentido, porque o Supremo já teria dado uma resposta para essa questão", afirma João.
"Essa decisão do Supremo pode mudar um pouco os incentivos e os cálculos políticos do PL. Como é uma matéria muito sensível, eu consigo vislumbrar o Congresso deixando isso [responsabilização das plataformas] um pouco de lado caso o Supremo venha e dê uma resposta para esse ponto específico", completa o pesquisador.
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