Abertura do 2° Encontro Nacional de Mulheres QuilombolasAntônio Cruz/Agência Brasil
Cerca de 350 lideranças quilombolas, de 24 unidades da federação e de países latino-americanos, estarão reunidas até domingo (18) para discutir e avaliar com autoridades do governo federal políticas públicas consideradas relevantes para aumentar a qualidade de vida de mulheres quilombolas e enfrentar desigualdades raciais, sociais e de gênero, nestes espaços. Neste primeiro dia do encontro, a questão mais reivindicada foi a titulação de terras.
O ministro do Desenvolvimento Agrário e da Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira, anunciou que todos territórios quilombolas terão certidão que atesta que existem agricultores familiares ali e, assim, participarão do Cadastro Nacional da Agricultura Familiar (CAF) “Com isso, vamos incluir todas as áreas quilombolas, indígenas e povos tradicionais no Programa de Aquisição de Alimentos [PAA]”.
O ministro fez uma convocação às quilombolas para participar do edital do PAA já publicado. “Vocês podem ver que não é exigido o CAF, nem o DAP [Declaração de Aptidão ao Pronaf]. Peço a vocês já se habilitarem no edital e, depois, verificarem quais cooperativas têm o CAF ou não, e passar essa lista ao ministério [MDA] para fazer a checagem das cooperativas, uma por uma, para vocês venderem ao PAA.”
Paulo Teixeira disse ainda que o MDA vai ajudar as comunidades quilombolas a se organizarem em cooperativas para participar do Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), que oferece alimentação aos estudantes de escolas públicas e compra produtos, sobretudo, da agricultura familiar.
“Estabelecemos que todos os remanescentes de quilombos, que estejam demarcados ou não, e que tenham produção agrícola, podem tirar o certificado de agricultor familiar e, assim, já poderão vender ao PAA [Programa de Aquisição de Alimentos] porque temos um edital na rua e a gente quer comprar os produtos das comunidades quilombolas, também, para alimentação escolar, com o PNAE”, anunciou o ministro do MDA, Paulo Teixeira.
Para promover a autonomia econômica das mulheres rurais quilombolas, cidadania e superar desigualdades de gênero e raça, o ministro do MDA, Paulo Teixeira, relembrou que a pasta abriu edital específico para Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) destinada a mulheres rurais, no mês de abril, e que agora, o MDA fará um recorte no Ater Mulher para contemplar as quilombolas. “É destinado àquelas famílias que tenham gente com capacidade de fazer assistência técnica e extensão rural para o desenvolvimento dessas economias. Queremos desenvolver a agroindústria nas comunidades quilombolas”.
Além disso, Anielle Franco reforçou que o Ministério da Igualdade Racial tem uma secretaria especialmente voltada às comunidades quilombolas. A ministra listou medidas do pacote pela igualdade racial, lançado no Dia Internacional pela Eliminação da Discriminação, em março]
“Que, nesses dias [do II Encontro Nacional de Mulheres Quilombolas], a gente possa colher os frutos do trabalho secular das mulheres quilombolas em defesa de seus territórios e plantar novas sementes”, desejou a ministra da Igualdade Racial.
Em discurso, a ativista Givânia Maria ainda exigiu condições de vida melhores para mulheres urbanas e rurais aquilombadas. “Não aceitamos mais o silêncio sobre nossas pautas, nem reivindicações. Precisamos de um posicionamento mais firme do governo junto aos estados e municípios para que esses, em regime colaborativo, possam efetivar políticas públicas voltadas para mulheres quilombolas”.
“Somos guardiãs de ciência, de saberes ancestrais, em nossos territórios. Por isso, nossos rios, nossas matas, nossas florestas não poderão ser envenenadas, muito menos destruídos”, ressalta Givânia Maria.
Outra representante da Contaq, Sandra Maria da Silva, destacou os percalços vividos durante cinco anos para realização deste segundo encontro, o Resistir para Existir. "Serão dias de trabalho e construção, mas que valerão a pena, no futuro, para deixar caminhos melhores para nossos jovens e crianças que ainda virão”.
Para Sandra, o momento é de dar visibilidade às lutas quilombolas por direitos territoriais, culturais, ancestrais e de desenvolvimento. Sandra Maria aponta que a questão primordial é a defesa da titulação de territórios quilombolas. “Com a volta da democracia para o país para nos reconhecer como sujeitos de direito”.
Já a secretária de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Mazé Morais, e coordenadora da Marcha das Margaridas, convocou as mulheres presentes no encontro para participar da 7ª edição da Marcha, a ser realizada em 15 e 16 de agosto, na Esplanada dos Ministérios, em Brasília.
"Nós resistimos! Estamos aqui. Somos parte de uma história de luta de resistência contra o capitalismo, o machismo, o racismo, neste país. Somos nós que seguimos parindo a resistência e lutando para continuarmos vivas”, lembrou Mazé Morais.
Segundo a primeira-dama, o Brasil está em penúltimo lugar na representação feminina nos parlamentos. “Esse é um assunto que tenho me preocupado bastante. Sinto que as mulheres estão desistindo da política e não podemos desistir, porque a política é que nos movimenta e pode nos dar garantias de políticas públicas e de todos os direitos.”
É por isso que a gente luta para ter mais e mais mulheres nos espaços de poder. Às vezes, me perguntam: ‘você se não se mete demais?’ Não me meto, apenas falo. Seria mais fácil se eu fosse apenas fútil, mas eu não consigo! E eu falo na hora do almoço também”, frisou Janja Lula da Silva.
Ao público majoritariamente feminino do encontro, Janja enfatizou, ainda, que é necessário combater a misoginia, o ódio e os discursos machistas, no Brasil. “A fofoca não me incomoda. O que me incomoda é a reprodução de um discurso machista e misógino contra outra mulher. Isso me incomoda com isso. E é contra esse discurso de ódio e misógino que nós, mulheres, temos que nos unir e lutar, em qualquer espaço que elas estejam. É esse discurso de ódio que algumas mulheres acabam reproduzindo e estão contribuindo com o discurso machista e sendo instrumento, sendo usadas pelos homens para isso”.
Os comentários não representam a opinião do jornal e são de responsabilidade do autor.