Bolsonaro está inelegível por oito anosFilipe ARAUJO / AFP
O tema esteve no centro da condenação do ex-presidente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Ao declarar seu voto, o presidente da Corte eleitoral, ministro Alexandre de Moraes, frisou que a resposta do TSE confirmará “nosso grau, enquanto poder judiciário, de repulsa ao degradante populismo renascido a partir (...) dos discursos que propagam infame desinformação” por “verdadeiros milicianos digitais”.
O ex-presidente foi condenado a oito anos de inelegibilidade por dar informações falsas sobre o sistema eleitoral durante uma reunião com embaixadores em julho de 2022, a três meses do pleito no qual disputava a reeleição. Bolsonaro ainda pode recorrer da decisão.
O julgamento do TSE, porém, já teve um “efeito pedagógico” para a sociedade e para a classe política brasileira, disse à AFP Ivan Paganotti, doutor em Ciências da Comunicação e professor da Universidade Metodista de São Paulo.
O docente recorda que esta não foi a primeira decisão desse tipo no país. Em 2021, o TSE já havia tornado inelegível e cassado o mandato do deputado estadual pelo Paraná Fernando Francischini (PSL), por propagar desinformação sobre as urnas eletrônicas nas eleições de 2018.
Intocáveis
Desta forma, prosseguiu o professor, a condenação de um ex-presidente não apenas reforça a jurisprudência anterior, mas acaba com a sensação de que existem “intocáveis” na política brasileira quando se trata de desinformação.
Esta decisão se torna ainda mais significativa em um país como o Brasil, onde a circulação de notícias falsas atinge maciçamente uma população altamente conectada às redes sociais. Trata-se de um ambiente no qual a produção e disseminação de desinformação é fortemente dependente de representantes políticos.
De acordo com o pesquisador, uma informação falsa surge primeiro em um grupo social específico. Em determinado momento, porém, integrantes da classe política disseminam esses conteúdos, que passam a ter mais visibilidade.
Vitória da democracia
"A condenação é um passo importante no combate à desinformação, pois condena alguém que utilizou a desinformação como uma estratégia narrativa durante todo o seu governo", disse ele à AFP.
Antes da reunião com embaixadores pela qual foi condenado, o então presidente já havia feito alegações falsas sobre a covid-19 e promovido remédios ineficazes para combater a doença. Em 2020, citando possíveis efeitos colaterais da vacina contra o coronavírus, chegou a associar tomar a vacina a "virar um jacaré".
Na ONU, Bolsonaro também mentiu sobre temas ambientais em 2020 e sobre dados de feminicídio em 2022. Estas e outras declarações polêmicas renderam a Bolsonaro o apelido de “Trump dos trópicos”, em referência ao ex-presidente norte-americano Donald Trump.
Nesse sentido, Barbabela chamou atenção para o ineditismo da condenação de Bolsonaro. “Não me recordo de nenhum outro país que tenha enfrentado um problema de desinformação em massa e tenha adotado uma medida semelhante à condenação de um político de alto escalão por propagar desinformação em massa”, pontuou.
O cientista político fez a ressalva, porém, de que Bolsonaro não deveria ser o único julgado por propagar desinformação. “Enquanto ele for o único conhecido por ter sido condenado, seu discurso de mártir e vítima do sistema continua sendo reforçado”, advertiu.
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