Atualmente, muitas crianças já crescem acostumadas com smartphonesPixabay
Sem tempo de preparar atividades e brincadeiras, muitos pais aderem aos celulares e videogames para o entretenimento dos filhos nesse período. Celulares, tablets, computadores, videogames e televisores são os novos companheiros das crianças nos horários livres.
É o que conta a última pesquisa divulgada pelo Comitê Gestor da Inte no Brasil: houve um aumento significativo no percentual de crianças, na faixa etária de 9 a 10 anos, que acessam a internet. O aumento foi de quase 15 pontos percentuais, passando de 79% em 2019 para 92% em 2021.
“Desde o início da infância, tem sido observado que as telas têm efeitos negativos”, explica o pesquisador e neuroeducador Fernando Henrique Lino. O especialista cita a pesquisa da Universidade da Califórnia que demonstra que crianças que passam mais de duas horas na frente de telas têm a probabilidade de desenvolver problemas como hipertensão, diabetes, sedentarismo e obesidade.
“Já quando se trata da saúde mental, as telas podem agir como catalisadores. Por exemplo, se uma criança já tem dificuldades em socializar com outras crianças, as redes sociais podem intensificar sentimentos de solidão e levá-la a se isolar socialmente, entrando em bolhas digitais. Isso foi comprovado por vários artigos, que mostram que o relacionamento entre pais e filhos influencia bastante o comportamento deles nas redes sociais”, complementa.
Lino detalha que se o relacionamento dos filhos com os pais são menos saudáveis e há menos tempo de qualidade com eles, as crianças tendem a buscar mais contato online com outras pessoas, o que pode resultar em envolvimento em dinâmicas perigosas.
O uso excessivo de telas também pode afetar profundamente a autoestima das crianças. Elas são ainda mais vulneráveis à comparação e aos efeitos da distorção de imagem promovida pelas redes sociais. “Elas tendem a se comparar com os outros, o que pode levar a uma distorção da autoimagem e baixa autoestima”, diz a educadora parental com especialização em Análise de Perfil e Neurociência Comportamental, Stella Azulay.
“O tempo excessivo de tela retira a criança do mundo real, limitando sua capacidade de criatividade e interação com o ambiente ao seu redor. O uso de telas pode se tornar viciante”, complementa.
E, nas férias, sem a interação social promovida pela escola, as crianças deixam de brincar com amigos e se envolver em atividades ao ar livre, coisas que são extremamente importantes para sua formação e saúde mental.
O que fazer?
“Uma coisa é colocar em prática uma estratégia para reduzir o tempo de tela de uma criança de 7 anos, e outra coisa é lidar com um adolescente de 15 anos. Obviamente, eles estão lidando com ferramentas muito diferentes, e os adolescentes têm demandas de independência, enquanto as crianças de 7 anos precisam de supervisão quase integral enquanto estão nas telas. Para isso, existem ferramentas diferentes”, aconselha Lino.
Já que a sociabilidade oferecida pela escola deixa de ser possível em julho, para crianças mais novas, vale incentivar a interação com amigos do condomínio, prédio, rua ou da escola, convidando-os para brincar ou visitar um ao outro, além de levar as crianças para parques ou espaços ao ar livre.
Brincadeiras ao ar livre, jogos de tabuleiro e leituras são ótimas opções para qualquer criança aproveitar o recesso escolar. “Tudo depende da estrutura familiar e dos hobbies que eles têm. É importante considerar a cultura da família e suas preferências”, complementa Karla Lacerda, pedagoga e diretora do Colégio Progresso Bilíngue Santos.
Para filhos mais velhos, incentivar a busca por hobbies também é algo positivo. Seja música, pintura, escrita, fotografia ou culinária, ter um hobby mantém a mente ocupada e faz muito bem à saúde mental.
O voluntariado também é uma opção. Seja em um abrigo de animais, uma instituição de caridade ou uma ação comunitária, o voluntariado oferece uma oportunidade valiosa para seu filho se conectar com os outros e fazer a diferença na comunidade.
Antes de aplicar essas mudanças, é preciso conversar com as crianças e deixar muito claro o que elas significam, afirma Lacerda. “É muito interessante estabelecer limites e ter conversas sobre isso. Não adianta impor limites sem que sejam entendidos e absorvidos por todas as partes. Portanto, é importante ter muitas conversas e entender como o seu filho e a sua família se relacionam com o uso das telas.”
Lino afirma que, quanto antes os pais estabelecerem limites para a utilização da tecnologia, melhor para toda a família, já que eles enfrentarão menos resistência dos filhos.
“No cenário em que os pais esperam o máximo para dar um celular para a criança, é recomendado fazer um termo de compromisso. Eu inclusive sugiro que os pais o escrevam e deixem claro quais serão as responsabilidades do filho em relação ao aparelho. Fazê-lo assinar esse compromisso cria um marco e ajuda a criança a entender que, ao receber o aparelho, ela ganha novas responsabilidades. Isso diminui a probabilidade de situações saírem do controle”, conta o especialista.
Vale lembrar que as telas podem sim ter benefícios nesses momentos, mas é preciso ter cuidado. Para Lino, tudo depende dos hábitos de consumo de telas e da interação com a tecnologia que a família já tem durante o período escolar.
“É importante lembrar que muitos jogos utilizam telas e videogames, e possuem uma dinâmica social importante, especialmente para crianças. É comum que eles joguem juntos durante as férias com seus colegas de classe. Portanto, é importante considerar esses aspectos”, diz. Não é necessário excluir as telas da vida dos pequenos, mas sim usá-las com consciência e responsabilidade.