O ex-diretor adjunto da Abin, Alessandro MorettiTânia Rêgo / Agência Brasil

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu nesta terça-feira (30) o diretor adjunto da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), Alessandro Moretti. A dispensa ocorreu um dia após a operação da Polícia Federal que fez buscas em endereços do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho de Jair Bolsonaro. Moretti é muito ligado ao ex-presidente. Diligências da PF indicaram que tanto ele como outros integrantes da cúpula da Abin dificultaram as apurações e estariam agindo em conluio com servidores investigados.
O novo diretor adjunto será Marco Cepik, diretor da Escola de Inteligência da Abin, responsável pela formação, capacitação e aperfeiçoamento dos profissionais da agência.
No relatório enviado ao Supremo Tribunal Federal que serviu de base para a Operação Vigilância Aproximada, a PF diz que Moretti, ainda no governo Bolsonaro, se reuniu com servidores e afirmou que a investigação sobre "Abin paralela" tinha "fundo político e iria passar".
Com sua saída, é cada vez mais forte a pressão para que Lula demita toda a cúpula da Abin e reformule radicalmente a instituição. Nos bastidores, ministros do STF cobram do presidente a substituição do diretor da agência, Luiz Fernando Corrêa. Os magistrados dizem não ver explicação para o fato de Corrêa ter escalado Moretti, conhecido por suas ligações com Bolsonaro, para ser seu braço direito na Abin. Dois desses ministros fizeram chegar ao Palácio do Planalto a avaliação de que Corrêa tem "responsabilidade política".
Movimento semelhante ocorre também no Congresso. "É uma situação política grave", admitiu o líder do governo na Câmara, José Guimarães (PT-CE). "A Abin deve passar por uma profunda reformulação e deixar de ser polícia política, que fica bisbilhotando adversários. Do jeito que está, a agência virou um SNI secreto", emendou o deputado, numa referência ao Serviço Nacional de Informações, que funcionou na época da ditadura militar.
General Heleno é intimado a depor
A PF intimou o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), para prestar depoimento no caso. A Abin fez parte da estrutura administrativa do GSI enquanto Heleno esteve no cargo. A agência passou para a Casa Civil em março de 2023, já no governo Lula. O Estadão entrou em contato com o general, que não se manifestou sobre a intimação.
Influência
A PF investiga se, mesmo fora da Abin, o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) tinha acesso aos sistemas da instituição e atendia a pedidos da família Bolsonaro. A apreensão com o parlamentar de um notebook e um celular da agência é vista como indício desse fluxo de informações.
Ramagem chefiou a Abin de julho de 2019 a março de 2022, quando deixou o cargo para se candidatar a deputado. A Abin disse ao Estadão que não deu falta dos equipamentos e que a responsabilidade de devolver o material era do então diretor. A agência alega que ele perdeu acesso aos sistemas quando se desligou. Ramagem disse em entrevista à 'GloboNews' que os dispositivos não eram usados há mais de três anos.
Outro indício, de acordo com os investigadores, é o pedido feito por uma assessora de Carlos Bolsonaro para conseguir dados de inquéritos. A servidora diz a uma auxiliar de Ramagem que precisa "muito de uma ajuda", informa o número das investigações e acrescenta que elas envolveriam o "PR (presidente da República) e 3 filhos".
A conversa ocorreu em 11 de outubro de 2022, mais de seis meses após Ramagem deixar a Abin. Por isso, a PF busca descobrir se ele usou clandestinamente suas credenciais para acessar os sistemas de inteligência. Outra hipótese é de que ele tenha se valido de aliados na Abin para conseguir informações. Sete policiais federais que auxiliavam Ramagem no órgão foram afastados por determinação do STF.
Peça central das investigações, o programa espião First Mile foi usado 60.734 vezes no período alcançado pela apuração. O relatório do ministro do STF Alexandre de Moraes afirma que, em outubro de 2020, mês em que se realizaram eleições municipais, foram realizadas 30.344 consultas ao sistema, mais da metade do total.
Vídeo
Carlos Bolsonaro prestou depoimento nesta terça-feira (30) por uma hora na superintendência da PF no Rio. A audiência atendeu a pedido do diretor-geral da PF, Andrei Rodrigues. O depoimento não teve relação com a "Abin paralela", mas com postagem que ele fez em agosto do ano passado com críticas à atuação da PF.
O vereador postou vídeo no X mostrando como ficou sua casa no Rio após as buscas e apreensão. Nas imagens, é possível ver móveis com portas e gavetas abertas e itens em cima do aparador e do sofá, como cabos e caixas de equipamentos eletrônicos.