Apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro durante a invasão ao prédio do Congresso NacionalMarcelo Camargo/Agência Brasil
Publicado 14/02/2024 09:03
A Polícia Federal (PF) reuniu provas que apontam o planejamento e financiamento dos atos golpistas do 8 de janeiro de 2023, o que contraria declarações de espontaneidade dos protestos. Na semana passada, o Supremo Tribunal Federal (STF) e a PF conduziram buscas e prisões de agentes que compunham um núcleo próximo ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), planejando a execução de um golpe de Estado, que resultou na invasão e depredação das sedes dos três Poderes.
Decisões do STF, pareceres da Procuradoria-Geral da República (PGR) e relatórios da PF apresentaram documentos, mensagens e outras evidências que contradizem a narrativa de uma mobilização espontânea desses atos, defendida pelos investigados.
De acordo com a investigação, os atos partiram da "arregimentação e do suporte direto" do grupo ligado a Bolsonaro, suspeito de participar da tentativa de ruptura constitucional. A linha foi reforçada por conversas e áudios obtidos pela Polícia Federal.
Um dos diálogos mostra o major Rafael Martins de Oliveira, que foi preso, pedindo orientações ao tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, sobre recursos financeiros para levar "pessoas" do Rio a Brasília e locais para a realização das manifestações. A conversa ocorreu dias antes de atos bolsonaristas convocados em novembro de 2022.
Em uma das conversas, Cid menciona a realização do ato em frente ao Quartel-General do Exército, indicando consentimento das Forças Armadas. Em outro momento, ele discute a possibilidade de destinar R$ 100 mil para cobrir despesas relacionadas ao evento, destacando o apoio de empresários do agronegócio.

A PGR destacou em seu parecer que Martins desempenhou um papel direto na direção dos manifestantes e na coordenação financeira para apoiar os atos antidemocráticos. A suspeita é que os R$ 100 mil mencionados tenham sido destinados a oficiais das Forças Especiais do Exército, chamados de "kids pretos", que supostamente incitaram as invasões e direcionaram a multidão.
O major solicitou direcionamentos para Mauro Cid: "A pedida é ir para o CN (Congresso Nacional) e STF??", Cid respondeu afirmativamente. O tenente-coronel, em outra ocasião, também solicitou uma estimativa de gastos nos auxílios aos manifestantes, como estadia, comida e materiais.
A defesa de Bolsonaro afirma que ele nunca "atuou ou conspirou" contra a democracia, enquanto os advogados de Cid alegam que nenhum valor foi pago e que ele explicará as mensagens à PF se for intimado para um novo depoimento. A defesa de Oliveira não foi localizada. Em nota no dia da operação, o Exército disse que acompanha o caso "prestando todas as informações necessárias às investigações".
As investigações também apontaram para o envolvimento de empresários do agronegócio no financiamento dos protestos, com bloqueio de bens e convocação para depoimentos. Mensagens interceptadas revelaram discussões sobre o apoio desses empresários, inclusive na logística de transporte de manifestantes.
Uma agente investigada, que esteve no QG do Exército, abordou o apoio de empresários do setor para três mil ônibus direcionados a Brasília às vésperas do 8 de janeiro: "Pessoal do agro lá de Goiânia, dos arredores de Brasília e tudo. O agro botou aí um apoio aí pra três mil ônibus. Não sei como que eles vão sair. Pessoal tá combinando de chegar em diversos horários... O negócio tá grande. Tá bonito".
Em outra operação, um empresário do setor logístico também foi alvo. De acordo com as investigações, ele teria financiado ônibus para levar manifestantes a Brasília e participado ativamente da orientação de movimentos golpistas junto a outras lideranças.

A participação de empresários no apoio aos golpistas acampados nos quartéis também foi apontada pela Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) dos Atos Golpistas. O relatório final apresentado pela comissão relatou o financiamento por meio do fornecimento de alimentos, água e até banheiros químicos.
Segundo o colegiado, um relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) identificou que 103 ônibus que chegaram a Brasília foram contratados por 83 empresários e 13 organizações empresariais, principalmente das regiões Sul e Sudeste. Em outro exemplo, um pastor de Santa Catarina também chegou a ser preso, suspeito de financiar os atos, mas depois foi solto por decisão do STF.

Esses desdobramentos alcançaram diversas figuras públicas, como o deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ), líder da oposição na Câmara, e empresários do setor logístico. Contudo, até o momento, as condenações relacionadas aos atos antidemocráticos têm se limitado aos executores, enquanto as investigações continuam avançando para identificar os financiadores e mentores por trás desses eventos.
 
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