Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar MendesMarcelo Camargo / Agência Brasil

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu ontem à noite todos os processos judiciais — em curso em qualquer instância do Judiciário — que tratem da lei do marco temporal, editada pelo Congresso, em janeiro deste ano, após a Corte máxima declarar inconstitucional a espécie de linha de corte para orientar a demarcação de terras indígenas.
A decisão foi proferida no âmbito de cinco ações no STF, que questionam a lei. Apontando necessidade de "pacificar conflito judicial" em torno da tese do marco temporal, o ministro decidiu abrir um processo de conciliação e mediação sobre o assunto.
O decano do Supremo intimou todas as partes das ações — as entidades que ajuizaram os processos, os chefes dos Poderes Executivo e Legislativo, além da Advocacia-Geral da União e da Procuradoria-Geral da República — para que, em 30 dias, "apresentem propostas no contexto de uma nova abordagem do litígio constitucional discutido nas ações, mediante a utilização de meios consensuais". O despacho foi submetido para referendo do plenário do Supremo.
Ao fundamentar a decisão de suspensão das ações sobre o marco temporal, o decano se disse preocupado com a possibilidade de "sinais aparentemente contraditórios" — teses fixadas pelo Supremo e a lei aprovada pelos parlamentares — "gerarem situação de severa insegurança jurídica".
Prejuízos
"Preocupa-me, em especial, a situação dos processos judiciais que discutem a constitucionalidade da Lei 14.701/2023, pois a indefinição quanto à adequada interpretação constitucional acerca do tema pode levar à prolação de decisões judiciais cuja eventual depuração do ordenamento jurídico, após pronunciamento futuro do Supremo Tribunal Federal, venha a se mostrar impossível, com graves prejuízos às partes envolvidas (comunidades indígenas, entes federativos ou particulares)", afirmou o ministro.
Em janeiro, o Congresso promulgou o complemento da lei do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, de 2023. O texto contém trechos que tinham sido vetados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A nova lei só admite a demarcação de terras indígenas que já estavam ocupadas ou eram disputadas pelos povos originários até 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição. A lei é defendida pela Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA).
Depois da derrubada pelo Congresso dos vetos presidenciais, Lula afirmou que já esperava pela reação dos parlamentares. Ele disse, no entanto, que a medida não precisava ter sido vetada por "questões políticas". "Obviamente que (o Congresso) ia derrubar o veto, é só ver qual é a maioria do Congresso. Era preciso que a sociedade, que a humanidade soubesse que eu vetei o marco temporal que eles aprovaram."
Em 14 de dezembro, o Congresso derrubou o veto de Lula ao tema. Ao todo, o presidente tinha vetado 47 trechos da lei aprovada pelos congressistas. No dia 14, 41 vetos foram rejeitados e seis, mantidos.
O julgamento no Supremo do marco temporal para demarcação de terras indígenas, em setembro do ano passado, foi o estopim para uma crise entre os Poderes.