Juliana Maciel ao lado de Jair Bolsonaro, Jorginho Mello e Mauricio José EskudlarkReprodução / Instagram

Brasília - É enganoso um post viral em que a prefeita de Canoinhas (SC), Juliana Maciel (PL), culpa o "governo do PT" e a Lei Rouanet pela Mundoteca e pela escolha de livros para crianças e adolescentes que não teriam "os valores que a gente acredita". A Mundoteca é um programa da empresa FGM Produções, que atua na criação de projetos sociais e culturais, e não do governo federal, como informou ao Comprova a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República.
De fato, o projeto foi aprovado pela Lei Rouanet em 2018, ano em que o presidente era Michel Temer (MDB), e executado de 2019 a 2023 — ou seja, durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o primeiro ano do presidente Lula (PT).
Conteúdo investigado: Vídeo publicado no Instagram mostra a prefeita de Canoinhas (SC), Juliana Maciel (PL), jogando no lixo livros do projeto Mundoteca. Ela diz que "a Mundoteca é um programa do governo federal e da Lei Rouanet. Mais uma vez o governo do PT faz esse tipo de coisa: bota o adolescente, bota a criança, induz a coisa que não é dos valores do que a gente acredita".

Onde foi publicado: Instagram.

Conclusão do Comprova: A Mundoteca, projeto de bibliotecas comunitárias, não é uma iniciativa do governo federal, diferentemente do que afirma a prefeita de Canoinhas. Em post viral, ela joga livros no lixo, dizendo que os títulos não são adequados para crianças e adolescentes, e acusa o governo do PT de induzir "a coisa que não é dos valores que a gente acredita". Ela também critica a Lei Rouanet, que apoiaria o projeto.

Após a publicação repercutir, a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da Presidência da República afirmou, em nota, que o projeto "não é uma ação do governo federal" e que o post é uma "peça de desinformação". A Mundoteca teve, de fato, apoio da Lei Rouanet, mas não tem mais. A Secom explicou que o programa foi aprovado para captar recursos por meio da lei em 2018, e que o projeto foi executado entre 2019 e 2023. Ou seja, se fosse do governo federal — o que, como explicado, não é —, o programa teria sido aprovado na gestão de Michel Temer (MDB) e implementado na de Jair Bolsonaro (PL), e não na de Lula (PT), a quem a autora do post critica.

A Mundoteca foi idealizada pela FGM Produções, que atua na criação de projetos sociais e culturais, segundo página da empresa no YouTube. Em nota divulgada no Instagram após o post da prefeita, a empresa informou que o objetivo da Mundoteca é "proporcionar às comunidades o acesso gratuito e cotidiano aos livros" e que o programa é voltado para todas as idades — não apenas crianças e jovens.

No documento, a empresa afirma que, para que a Mundoteca funcione, deve haver um contrato com as prefeituras das cidades onde ela será implementada e que, após um período (não determinado na nota), a biblioteca passa a ser gerida pelos órgãos municipais. Ao Comprova, a Prefeitura de Canoinhas afirmou que, "assim como outras cidades do Brasil, recebeu acervo da Mundoteca como doação" e que "tem autonomia para retirar títulos do espaço".

Os livros que aparecem sendo jogados no lixo pela prefeita são "Aparelho Sexual e Cia", de Zep e Hélène Bruller, e "As melhores do Analista de Bagé", de Luis Fernando Verissimo. De acordo com a nota da FGM, essas obras nunca foram indicadas ou emprestadas para crianças. "O livro 'Aparelho Sexual e Cia' tem indicação para público juvenil e foi emprestado para somente uma pessoa adulta na biblioteca em questão. E o livro 'As melhores do Analista de Bagé' é recomendado para o público adulto e nunca foi emprestado", afirma o texto.

O Comprova procurou a Prefeitura de Canoinhas que, em nota, declarou que "as duas obras trazem desenhos e textos de cunho sexual. Não tratam sobre práticas educacionais, muito pelo contrário. E por não condizerem com o que a Secretaria Municipal de Educação preza e ensina às crianças e adolescentes, foram retirados do acervo. Os livros serão encaminhados aos responsáveis pela criação do projeto da Mundoteca." O G1 noticiou que o MPSC instaurou, em 19 de abril, uma notícia de fato para apurar o descarte de livros.

Enganoso, para o Comprova, é todo conteúdo retirado do contexto original e usado em outro de modo que seu significado sofra alterações; que usa dados imprecisos ou que induz a uma interpretação diferente da intenção de seu autor; conteúdo que confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Alcance da publicação: O Comprova investiga os conteúdos suspeitos com maior alcance nas redes sociais. Até 24 de abril, o vídeo tinha 179 mil visualizações no Instagram.

Fontes que consultamos: Por e-mail, contatamos a Secom, que nos enviou a nota. Consultamos a nota da FGM no Instagram e reportagens sobre o assunto. Também tentamos contato com a Prefeitura de Canoinhas, que enviou o contato de uma assessora de imprensa, e com o MPSC, mas não houve retorno.

Por que o Comprova investigou essa publicação: O Comprova monitora conteúdos suspeitos publicados em redes sociais e aplicativos de mensagem sobre políticas públicas, saúde, mudanças climáticas e eleições no âmbito federal e abre investigações para aquelas publicações que obtiveram maior alcance e engajamento. Você também pode sugerir verificações pelo WhatsApp +55 11 97045-4984.

Outras checagens sobre o tema: Outro livro foi alvo de desinformação nas redes sociais recentemente. No mês passado, o Comprova trouxe informações sobre polêmica envolvendo o livro “O Avesso da Pele”, de Jeferson Tenório, criticado por uma diretora de Santa Cruz do Sul (RS). Já a Lei Rouanet é assunto frequente de posts com desinformação. O Comprova já mostrou que um produtor cultural não foi a Portugal com dinheiro recebido do mecanismo e publicou também que tuíte engana ao dizer que Ludmilla receberá R$ 5 milhões por projeto que leva seu nome.