Ícone da cultura popular brasileira, J. Borges deixa um legado na arte pernambucanaDivulgação/Museu do Pontal

O xilogravurista, poeta e cordelista pernambucano, José Francisco Borges, mundialmente conhecido como J. Borges, morreu na manhã desta sexta-feira (26), aos 88 anos, na casa onde morava na cidade de Bezerros, Agreste de Pernambuco. De acordo com os familiares, o artista morreu de "causas naturais".
O artista será velado nesta sexta no Centro de Artesanato, que fica localizado no município de Bezerros, em Pernambuco. A data e horário ainda não foram definidos. O enterro será no sábado, 27, no Cemitério Parque dos Eucalipitos, também em Bezerros.
J. Borges, referência na arte popular brasileira, nasceu em 20 de dezembro de 1935 em Bezerros, no Agreste de Pernambuco. Ele só frequentou a escola por um ano. Aprendeu a ler, escrever e fazer contas. Na juventude, foi lavrador, marceneiro, vendedor de colher de pau e pedreiro, até descobrir a literatura de cordel.  
Com 21 anos, começou a escrever cordéis e fez "O Encontro de Dois Vaqueiros no Sertão de Petrolina", que foi xilogravada por Mestre Dila. O cordel vendeu mais de cinco mil exemplares em apenas dois meses.

O trabalho do artista foi descoberto por colecionadores e marchands e ganhou visibilidade nacional. As gravuras de J.Borges foram utilizadas na televisão na década de 1970 e ele começou a gravar matrizes dissociadas dos cordéis, de maior tamanho. Com isso, o xilogravista chegou a expor suas obras em outros países, como Suíça, México e Estados Unidos. Além disso, deu aulas de xilogravura, técnica artística de gravura em madeira, e entalhamento na Europa e nos Estados Unidos.

Ele também ilustrou a capa de livros de escritores como Eduardo Galeano e José Saramago, inspirou documentários e o desfile da escola de samba Acadêmicos da Rocinha, em 2018.

Suas xilogravuras ganharam admiradores de peso, como o escritor Ariano Suassuna. O artista tem vários prêmios, como a comenda da Ordem do Mérito Cultural, o prêmio da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) na categoria Ação Educativa/Cultural.

Em Bezerros, foi inaugurado o Memorial J. Borges, com exposição de parte de sua obra e objetos pessoais. Em janeiro de 2022, o artista teve as obras expostas no Museu de Arte do Rio. A exposição "J. Borges – O Mestre da Xilogravura", reuniu 40 xilogravuras, sendo 10 obras inéditas, 10 matrizes inéditas e as 20 obras mais importantes da sua carreira, com temas que retratam a trajetória de vida do artista.
O artista também ganhou um mural em homenagem durante a celebração do Arraiá do Museu do Pontal, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio, inaugurada em junho, com um painel de 24 m² baseado na Asa Branca, um dos seus temas preferidos. 
Sua arte está reunida em uma exposição gratuita no no local até 30 de março de 2025. "É uma das pessoas que ajudou a moldar uma ideia visual sobre o Nordeste e sobre a xilogravura brasileira", afirma Lucas Vandebeuque, curador da exposição. J.Borges também recebeu o título de cidadão honorário do Rio de Janeiro, cidade em que já fez mais de 50 mostras.
O painel foi pintado pelo filho do artista, Pablo Borges, 30 anos, que esteve presente no lugar do pai. Em conversa com O DIA, ele elogiou o evento.
"Infelizmente, por questões de saúde, ele [J. Borges] não pode vir, mas está bem, em casa. É uma das maiores exposições já feitas com as obras dele. Vários colecionadores cederam obras para essa exposição. Além disso, o Museu do Pontal está organizando essa festa totalmente ilustrada por ele. É de uma importância muito grande e ele recebe isso com muito orgulho", celebrou na época.
"No Nordeste, no Brasil e no mundo inteiro, o legado dele aterrissou. Ele rompeu fronteiras e eternizou o próprio nome para os outros seguidores e xilógrafos que o tem como referência", disse Pablo, que herdou do pai o interesse por xilogravura. O artista tinha sete anos quando fez a sua primeira obra.
O Arraiá do Museu do Pontal busca resgatar as origens das festas juninas, com a presença de barracas que vendem comidas típicas do Nordeste, como a canjica e bolo de milho.
"O sol do sertão", maior retrospectiva já dedicada à sua produção, com 200 obras, está dividida por temas na disposição que traz a retrospectiva de xilogravuras produzidas por J. Borges dos anos 1970 até hoje, algumas acompanhadas de suas matrizes em madeira talhada, e um amplo conteúdo documental. 
Em 2023, o presidente brasileiro Luís Inácio Lula da Silva presenteou o Papa Francisco com o quadro Jesus, Maria e José. A Sagrada Família, de J. Borges, quando fez uma visita ao Vaticano.