Vice-presidente Geraldo AlckminMarcelo Camargo/Agência Brasil

Documentos de uma transportadora, o livro de hóspedes de um hotel em Moema e o depoimento gravado de três ex-funcionários da Odebrecht deram sobrevida a uma ação de improbidade administrativa que mira o vice-presidente Geraldo Alckmin. Ante essas provas, consideradas 'independentes', a Justiça de São Paulo negou trancar um processo sobre supostos repasses - não declarados à Justiça Eleitoral - para Alckmin, ao tempo em que ele ocupava o Palácio dos Bandeirantes e exercia mandato de governador.
O Estadão pediu manifestação de Alckmin. O espaço está aberto. Quando a Promotoria ingressou com a ação, o ex-governador alegou que a conclusão do Ministério Público sobre o caso era "equivocada".
O pedido para interromper a ação teve como suporte decisão do ministro Dias Toffoli, do STF, que decretou a anulação das provas decorrentes do acordo de leniência da empreiteira no processo da Operação Lava Jato.
A decisão que mantém viva a ação foi publicada no último dia 25, após análise de um pedido de Marcos Antonio Monteiro, ex-secretário de Desenvolvimento Econômico no governo Alckmin em São Paulo.
Monteiro requereu que a 13.ª Vara da Fazenda Pública da Capital decidisse sobre a viabilidade da continuidade da ação de improbidade na qual ele é citado.
A ação cita Alckmin e mais sete pessoas considerando a decisão do ministro Dias Toffoli que anulou todas as provas obtidas com o acordo de leniência da Odebrecht.
"Entendo que não estão presentes, desde logo, circunstâncias que permitam afastar a suposta prática de atos de improbidade administrativa, devendo-se dar prosseguimento ao processo, sob pena de se negar acesso à Justiça. Vale ressaltar que, em se tratando de Ação Civil Pública, basta a existência, em tese, de ato danoso e, assim, como na área criminal, aplica-se o princípio in dúbio pro societate", registrou o despacho judicial
Ainda cabe recurso da decisão.
A avaliação da Justiça é que, mesmo com a exclusão das provas coletadas dos sistemas do Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht - a máquina de propinas da empreiteira - "subsistem outras provas independentes que amparam a continuidade da marcha processual".
Na ação de improbidade, o Ministério Público de São Paulo destaca planilhas onde constam supostos repasses a Marcos Monteiro e a Alckmin.
O juízo da 13ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo cita documentos entregues ao Ministério Público por Rogério Martins - que teria sido contratado para entregar propinas -, pelo doleiro Álvaro José Galliez Novis e pela Transportadora de Valores Transmar.
Segundo a Justiça, os documentos indicam que Martins, funcionário de Novis, se hospedava em um hotel de São Paulo e lá recebia da transportadora valores em espécie para pagar propinas, de acordo com senhas recebidas da Odebrecht.
A retirada dos valores ocorria, segundo os autos, no quarto do hotel em pacotes de dinheiro vivo.
"As provas obtidas pelo Inquérito Civil demonstram que as quantias recebidas nas datas de 7 de agosto de 2014 e 11 de setembro de 2014 foram efetivamente pagas por Rogério Martins a portador indicado pelo requerido Marcos Antonio Monteiro, funcionário público, em benefício do co-réu Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, nas dependências do hotel Mercure Privilege, em Moema, conforme se depreende da análise da relação de hóspedes que ali se registraram nos respectivos dias", registrou o despacho da 13.ª Vara da Fazenda que nega trancar a ação de improbidade.
O juízo entendeu que o inquérito que baseia a Ação Civil Pública revelou o modo em que os supostos atos de improbidade teriam sido operados. "O réu Marcos Antonio Monteiro, no exercício de função pública e em benefício de Geraldo José Rodrigues Alckmin Filho, auferiu vantagem indevida, recebendo dinheiro da Construtora Norberto Odebrecht S/A que, por intermédio dos réus Luiz Bueno e Benedicto Júnior, reconheceram que tinham relação direta com as obras mantidas com o Governo do Estado de São Paulo, o que, ao menos em tese, caracteriza ato de improbidade administrativa", diz o despacho.
O documento ainda contém revelações em vídeo de três ex-funcionários da Odebrecht. Segundo a Justiça, eles confirmaram o conteúdo de reportagens divulgadas à época. O juízo da 13ª Vara de Fazenda Pública também observa que as provas que constam do inquérito civil "são imunes de contaminação, uma vez que não têm nenhuma relação, seja direta, seja por derivação, com o acordo de delação premiada".