Estudo reúne casos coletivos de remoção forçada de pessoas e de comunidades inteirasAgência Brasil
O mapeamento reúne casos coletivos de remoção forçada de pessoas e de comunidades inteiras, que foram expulsas de seus locais de moradia. Isso inclui não só os casos judicializados, mas também processos administrativos promovidos pelo poder público.
O aumento verificado no período, explicou Raquel Ludermir, gerente de Incidência Política da organização Habitat para a Humanidade Brasil, pode estar relacionado ao fato de que, durante a pandemia de covid-19, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou a suspensão dos despejos e a reintegração de posse contra famílias vulneráveis. A medida acabou durando até o final de outubro de 2022.
Outro fator que pode ter contribuído para esse aumento, explicou Raquel, é o custo de vida elevado como reflexo da pandemia. “A gente sabe que, durante a pandemia, houve um empobrecimento muito sério das pessoas e o custo de vida aumentou bastante. Então é possível que muitas pessoas tenham recorrido a ocupações”, lembrou. “Se a família já está morando de forma precária, está morando de favor, às vezes está tendo que comprometer alimentação e segurança alimentar para pagar o aluguel no final do mês, aí ela pode recorrer a uma ocupação urbana”.
Perfil
Do total de vítimas dessas remoções e despejos, cerca de 267 mil são crianças e mais de 262 mil, pessoas idosas. “Sabemos que apesar de a moradia ser um direito constitucional e um direito humano, ainda estamos em um país em que existem pelo menos 6 milhões de pessoas em situação de déficit habitacional e mais 26 milhões em condição de inadequação habitacional. A pesquisa indica a ponta do iceberg de um problema histórico no Brasil. Estamos falando aqui da moradia, do problema da luta pela terra e de como isso está atrelado às questões da pobreza e de interseccionalidades”, disse Raquel Ludermir.
Números subestimados
O que o levantamento conseguiu apontar é que, do total de vítimas de despejos ou remoções forçadas, 333.763 correspondem a famílias ameaçadas, 42.098 a famílias despejadas e 78.810 a famílias vivendo com o despejo suspenso.
Entre as regiões mais afetadas, São Paulo lidera o ranking com o maior número de famílias ameaçadas (90.015) e despejadas (9.508). O estado de Pernambuco aparece na segunda posição no ranking de famílias ameaçadas (43.411) e em quinto no de despejadas (2.194). Já o estado do Amazonas aparece na segunda posição em número de despejados (5.541) e em terceiro no de ameaçados (31.902).
Reintegração de posse e grandes obras
Como segunda principal razão estão as remoções forçadas impulsionadas pelo poder público, principalmente por grandes obras. “Isso pode estar relacionado a grandes obras - como de sistema de transporte, drenagem ou esgotamento sanitário - ou obras em menor escala, que são supostamente para o benefício da própria população, mas que acabam tendo efeitos contraditórios de remoção”, afirmou.
É por isso que, neste momento em que as grandes obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) estão sendo retomadas, Raquel defende que é preciso repensar o quanto elas podem estar afetando também a população mais vulnerável. “É muito importante a gente estar atento para que essas obras não tenham um efeito ainda mais negativo sobre a população vulnerabilizada”, destacou. “A obra pública não pode nunca aumentar o déficit habitacional ou o problema da moradia no país, porque senão a gente está favorecendo apenas um setor de desenvolvimento”.
Soluções
Também é preciso, segundo ela, que se encerrem propostas legislativas que pretendem marginalizar ainda mais essas pessoas. “Há propostas legislativas que estão tramitando e que estabelecem — ou tentam estabelecer — que as pessoas que precisam ocupar imóveis ou terrenos percam também seus direitos a programas sociais, como o Bolsa Família, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) ou o direito de participar de concursos públicos. Existe aqui uma tentativa de punir duplamente a população que já está bastante vulnerabilizada, ou seja, uma pessoa que já não tem direito à moradia, além de tudo, corre o risco de perder o direito a um programa social”.
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