opina25maiARTE PAULO MÁRCIO

Quando as garras do fascismo fincam as unhas em um país, sabemos que, por um longo tempo, as raízes do ódio e da violência farão companhia a esse povo. O preconceito, o racismo, a misoginia e o machismo são filhos direto do fascismo e impregnam a todos os que vivem sob o jugo do obscurantismo. O “generalíssimo” Francisco Franco foi ditador na Espanha de 1936 a 1975 e, obviamente, a desgraça fascista deixou rastros e consequências graves. Um tirano por 39 longos anos produz enorme impacto na formação de uma nação. Em todas as frentes, inclusive no futebol.

O episódio repugnante de racismo explícito contra o jogador do Real Madrid Vinícius Júnior, no jogo contra o Valencia, é de revoltar e de levar a uma profunda reflexão. Importante ressaltar que o presidente de La Liga, Javier Tebas Medrano, teve a ousadia de cobrar uma “explicação” do jogador, ao invés de se posicionar clara e fortemente contra a discriminação que vitimou Vini Jr. e a todos nós por tabela. Uma manifestação grotesca que equivale a um apoio explícito ao crime de racismo.
É bom ressaltar que esse dirigente apoia o movimento VOX de ultradireita e alinhou-se ao Fuerza Nova, que defende a volta dos princípios do nazista Franco. Marcas dessa praga do fascismo em uma Espanha que ainda não conseguiu se libertar da dominação malévola.
Esse suporte implícito é que faz com que seja a sexta vez, só neste campeonato espanhol, que a torcida se sinta à vontade para atacar covardemente o jogador do Real Madrid, que acabou expulso após as ofensas. Para homenageá-lo, cito Haile Selassie, imperador da Etiópia, com uma frase que ele, Vinícius, tatuou em seu corpo, “Enquanto a cor da pele for mais importante do que o brilho nos olhos, haverá guerra”.
Essa omissão criminosa não revela somente o fascismo incrustado em La Liga, mas, também, na grande imprensa espanhola. O episódio não ocupou nenhuma capa dos grandes jornais e nem foi objeto de protestos contra essa violência. Como era uma manifestação orquestrada da torcida do Valência, e não um episódio de um torcedor isolado, sendo que já havia ocorrido cinco vezes no mesmo campeonato, era o caso de se paralisar a partida, o Real Madrid sair do campo e o time da casa perder não só os pontos, mas o mando nos próximos jogos. Sem obstar, óbvio, as necessárias providências para responsabilizar criminalmente os fascistas torcedores.

Foi muito digna a postura elegante do treinador do time, Carlo Ancelotti, após o jogo, ao ser questionado, em entrevista coletiva, sobre a partida. Com incontida irresignação, ele perguntou à jornalista se ela queria falar sobre futebol, pois ele só estava disposto a tratar do episódio de racismo que havia vitimado o jogador do seu time. E, mesmo sendo pressionado, manteve-se, com elegância, na firme disposição de só se manifestar sobre aquelas atitudes odiosas que envergonhava a todos.

O comportamento nobre e corajoso do Vinícius Júnior fez o caso tomar a dimensão merecida. Depois de certa letargia, parece que o mundo acordou. No Brasil, o governo - através do presidente Lula e dos ministros Flavio Dino, Sílvio Almeida, Anielle Franco, entre outros -, teve uma atitude proporcional à revolta das pessoas contra esses atos racistas.

Estamos saindo de quatro anos de um regime fascista e opressor. O ex-presidente Bolsonaro era um cultor do fascismo e desprezava os pretos. Somente após a repercussão internacional, a polícia espanhola prendeu sete suspeitos de ofenderem o jogador. E todos esperam a postura dos grandes patrocinadores de La Liga - como Santander, Puma e Microsoft.

A imagem do Cristo Redentor com as luzes apagadas sob uma lua brilhando falou mais forte do que mil discursos. Obrigado, Vinícius Júnior, a sua postura nos enche de orgulho e a sua luta é a de todos os que abominam as atitudes racistas.

Remeto-me a Maya Angelou: “Você pode me fuzilar com suas palavras, e me cortar com o seu olhar, você pode me matar com o seu ódio, mas assim, como o ar, eu vou me levantar”.
Antônio Carlos de Almeida Castro, Kakay