Gastão Reis, colunista de O DIA divulgação
Ao longo da História, há momentos em que alguém consegue sintetizar o futuro com precisão cirúrgica. Foi o caso do presidente venezuelano Raúl Rojas, homem de visão, ao tomar conhecimento da proclamação da dita República no Brasil, em 1889. Foi direto e certeiro como a visão de uma águia: “Pronto, lá se foi a única república de fato da América Latina”. A singularidade brasileira em termos institucionais (e com ampla liberdade de imprensa) era admirada na época por nossos vizinhos e mesmo internacionalmente.
Ele obviamente estava se referindo à capacidade de um regime político ser capaz de preservar o bem comum. Sem dúvida, tanto monarquias quanto repúblicas podem, em princípio, construir sociedades inclusivas, aquelas capazes de beneficiar toda a população e não apenas ao andar de cima. A aguda desigualdade, que marca o Brasil de hoje, deixa claro que a república não quis caminhar nessa direção.
E isso em 136 anos de existência, mais que o dobro do tempo que durou o Império, que combateu a desigualdade social com as leis abolicionistas, coroadas pela Lei Áurea de 1888. Quem pensa na república como fato consumado deveria levar em conta o caso da Holanda, que foi uma república por cerca de dois séculos e acabou optando pela monarquia parlamentar. E vem mantendo um padrão de vida democrático e superlativo.
O atual quadro brasileiro vem criando certo consenso entre analistas da cena política brasileira no sentido de que o país necessita de uma reforma política em profundidade. As instituições vigentes têm sido incapazes de gerar um clima de estabilidade necessário para o crescimento em bases sustentadas a longo prazo. Este diagnóstico impõe um reexame de nossas falhas político-institucionais geradoras da marcha lenta a que estamos submetidos, inclusive com perda de posição relativa face aos demais países, desde a década perdida de 1980. As décadas posteriores foram medíocres em termos do crescimento da renda real per capita.
Reina certo preconceito sobre a possibilidade de incluir entre as opções em aberto a volta à monarquia constitucional parlamentar. O debate em torno desta questão crucial deveria fazer parte de uma agenda política civilizada. Alguns poderiam objetar que isto já foi resolvido no plebiscito de 1993 em que a República presidencialista se saiu vitoriosa. Por que, então, recolocar a questão em tela novamente? Exatamente pelas razões expostas a seguir.
É legitimo levantar a questão do grau de informação com que a população votou em 1993. A história republicana brasileira buscou se consolidar na base de um apagão da memória monárquica brasileira. Não só isso, a historiografia econômica consolidada nos informava que o crescimento da renda real per capita ao longo do Império teria sido pífio. As novas pesquisas, aliás, muito bem fundamentadas, desmentem essa visão.
Um argumento sólido nessa linha é o fato de que o orçamento do Brasil decuplicou ao longo do II Reinado enquanto a população apenas dobrou. E isto num quadro de estabilidade político-institucional, visto hoje pelos economistas em geral como um requisito básico para o crescimento sustentado. Portanto, seria um contrassenso um país capaz de atender este requisito e ficar congelado no tempo em termos de crescimento de sua renda real per capita.
Outra linha de argumentação é a congênita instabilidade institucional da República. Foram vários golpes de Estado e duas longas ditaduras, a de Vargas e a de 1964 até 1985, 21 anos, ao longo do século XX. Uma situação muito diferente do que se passou no nosso século XIX sob o Império.
No século XXI, em especial nos últimos anos, teve início um protagonismo do poder judiciário, em especial do STF, que vem exercendo um papel que não lhe cabe com a desculpa de proteger a democracia. E isso sem mencionar a farra dos salários de juízes que vão muito além do permitido por lei. Lançam mão das verbas indenizatórias em valores elevadíssimos para burlar a lei. E foi assim que o país atingiu o que foi denunciado como ditadura do judiciário, aquela que Ruy Barbosa dizia ser a pior delas por não se ter a quem recorrer. Entretanto, não é bem o caso, pois a população, de algum modo, tem sempre a capacidade de dar um basta às exorbitâncias do poder.
No século XXI, em especial nos últimos anos, teve início um protagonismo do poder judiciário, em especial do STF, que vem exercendo um papel que não lhe cabe com a desculpa de proteger a democracia. E isso sem mencionar a farra dos salários de juízes que vão muito além do permitido por lei. Lançam mão das verbas indenizatórias em valores elevadíssimos para burlar a lei. E foi assim que o país atingiu o que foi denunciado como ditadura do judiciário, aquela que Ruy Barbosa dizia ser a pior delas por não se ter a quem recorrer. Entretanto, não é bem o caso, pois a população, de algum modo, tem sempre a capacidade de dar um basta às exorbitâncias do poder.
O melhor alerta (e diagnóstico) nos vem de Hen Fei Tzu (280-233 a.C.). Ele foi um pensador chinês que defendia o rigor da Lei acima dos governantes de plantão. Em relação à república brasileira, cabe relembrar suas palavras quanto ao futuro: “Se maus ministros desfrutam de segurança e lucros, então é o começo do fim”. Concordemos que é a cara do Brasil desigual de hoje em que a população se sente desrespeitada e extorquida pelos governantes. E deveria abrir espaço a alternativas como a monarquia parlamentar constitucional.
Além de ministros, cabe acrescentar também a palavra políticos, sempre focados no próprio umbigo. Aqueles que não dão a mínima para o interesse público. Tal situação tende a levar a algum tipo de ruptura, que pode ser revolucionária ou dentro da legalidade através de eleições livres capazes de levar ao poder, nas eleições de 2026, políticos comprometidos com o bem comum. Esta parece ser a saída que o Brasil deverá encontrar para pôr fim aos desmandos reiterados que cobrem de indignação o povo brasileiro.
O lado surrealista brasileiro é constatar que a Carta de 1824 dispunha de mecanismos capazes de impedir que chegássemos ao ponto lamentável em que estamos. O dispositivo constitucional do poder moderador, sempre ouvido antes o Conselho de Estado, impediria qualquer arbítrio dos poderes constituídos. Seria impensável que ministros do STF, como Carmen Lúcia ou Alexandre de Moraes, dentre outros, tivessem a ousadia de fazer o que vêm fazendo cientes de que poderiam ser suspensos pelo poder moderador e submetidos a um tribunal para exarar uma sentença definitiva sobre seus atos. Tínhamos controle do andar de cima e deixamos de tê-lo. Regredimos!
Mas o verde de nossa bandeira nos diz que a esperança está viva.
Nota: Digite no Google: “Dois minutos com Gastão Reis: O cheiro desagradável do poder ”. Ou link: https://www.youtube.com/watch?v=Zl2UTiGi-JQ&t=2s
E-mails: gastaoreis@smart30.com.br
Nota: Digite no Google: “Dois minutos com Gastão Reis: O cheiro desagradável do poder ”. Ou link: https://www.youtube.com/watch?v=Zl2UTiGi-JQ&t=2s
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