Roberto Guilherme relembra amizade e bastidores de 'Os Trapalhões' - Ligia Pontes / divulgação
Roberto Guilherme relembra amizade e bastidores de 'Os Trapalhões'Ligia Pontes / divulgação
Por Juliana Pimenta

Rio - Se para muita gente fazer comédia é uma questão de vocação, para Roberto Guilherme, esse chamado é ainda mais forte. Aos 81 anos, o eterno Sargento Pincel confessa que recebeu do Universo a missão de atuar. "Eu sou vidente e vejo o outro mundo tranquilamente. Eu vejo desde os oito anos de idade. Eu ainda era sargento paraquedista quando descobri que era comédia o que eu deveria fazer", completa ele, que estreia com a peça 'Boteco da Rodada', nesta sexta-feira, no Teatro dos Grandes Atores, na Barra.

Roberto diz ainda que essa percepção em relação ao futuro vai além do seu próprio destino. "Eu olho para as pessoas e sei exatamente o que vai acontecer com elas. Não é sonho. Eu enxergo com clareza".

Por ter ciência do seu destino e de quais direções tomar, Roberto garante não temer sua sina. "O caminho é esse aí e estou nele até hoje. Cumprindo a missão que é levar alegria e felicidade ao ser humano. Eu não tenho medo de nada. Inclusive, não tenho e nem nunca tive medo da morte, porque a gente já nasce com a morte lá no útero da mulher. Você pode até nem nascer, mas você já pode morrer", filosofa.

Além da relação saudável com a morte, o comediante afirma que mantém até contato com os mortos. "Eu sempre converso com o outro mundo. Todo dia à noite, eu me deito no escuro do meu quarto para dormir e converso com os amigos do outro lado. As pessoas vão dizer que eu sou maluco, mas podem dizer à vontade. Eu não ligo".

Começo de carreira

Apesar de demonstrar conhecimento sobre seu futuro, Roberto Guilherme confessa que percorreu um longo caminho antes da fama. "Depois que eu larguei a patente, meu primeiro trabalho foi na TV Rio, em 1962. Eu fui lá porque tinha vontade de conhecer o pessoal, fiz o teste e passei.Trabalhava como figurante, ganhando um dinheirinho que não dava nem pro pão com ovo que eu e Altemar Dutra lanchávamos quando nos conhecemos", lembra.

Segundo ele, a caminhada, apesar de difícil, compensou. "Era difícil chegar ao topo, mas muitos companheiros chegaram e, graças a Deus, a gente se deu bem. Eu não posso reclamar e não me arrependo da minha profissão. Hoje eu sou felicíssimo. Nunca fui um cara doente e brinco até com topada", comemora.

Trapalhões

A partir daí, uma vida de estudos e trabalho duro resultaram no papel mais marcante da carreira do comediante, um militar linha dura. "O Sargento Pincel foi uma criação minha, eu tinha uma cabeleira linda, mas decidi que o personagem seria careca. Falei para o [Renato] Aragão e o Dedé rasparem minha cabeça em cena. O problema é que as máquinas estavam cegas e, enquanto os dois cortavam o meu cabelo, minha cabeça sangrava", lembra, aos risos.

A relação entre ele e os demais Trapalhões, aliás, ainda é lembrada com muito carinho por Roberto. "Nós éramos uma família. Não tinha ninguém que fosse melhor que o outro, nem dentro e nem fora do palco. E assim eram 'Os Trapalhões'. Nós continuamos no topo e fomos líderes de audiência no Brasil e fora", destaca. O sucesso do trabalho, de acordo com Roberto, era justamente a consequência dessa boa interação entre os colegas de elenco. "Com o pessoal da antiga, o estrelismo fica no palco. A pessoa no mundo era como outra qualquer, a estrela maior era o programa, como foi o caso dos 'Trapalhões', que continua no ar pelo canal 'Viva'".

E de acordo com o Pincel, a amizade com os colegas de trabalho permanece forte mesmo depois de tanto tempo. "O Aragão mora aqui perto, não dá nem 15 minutos aqui de casa e a gente tá sempre jantando junto. Com o Dedé também, que aliás está com temporada no teatro".

Roberto aproveita a oportunidade para criticar o atual cenário da comédia no Brasil. "E isso aí é que o povo está sentindo falta no humor. Você não pode estar com a família na sala, porque já é agredido com palavras obscenas na sala e até sexo virou arte. Então a programa 'feijão com arroz', que tem uma entrada tranquila no país todo, está fazendo falta".

O Sargento Pincel ainda pondera que o circuito humorístico até poderia ser melhor, porque existem bons profissionais no mercado. "Para o meu modo de pensar, não está legal, mas infelizmente o lado contrário tá superando. Antes, você tinha vários ídolos, mas hoje eles estão lá em cima esperando os poucos que estão aqui embaixo para aumentar o humor celestial. Já subiu quase todo mundo e ficaram poucos. Eu sou um deles", destaca.

Na mesa do bar

Reconhecido nas ruas pelo trabalho na TV e no cinema, Roberto destaca que o próximo trabalho é no teatro, com o espetáculo 'Boteco da Rodada', estreia na próxima sexta-feira, no Teatro dos Grandes Atores, na Barra da Tijuca. "A ideia de fazer a peça foi do Edilson Silva e ele me convidou para fazer o Seu Durval, o dono do boteco", explica.

A peça conta a história de dois amigos que resolvem assistir ao clássico Flamengo x Vasco no Bar de Seu Durval e ainda recebem a visita do jornalista e apresentador Edilson Silva, que faz ele mesmo na peça. "Desde pequeno, eu era fã dos 'Trapalhões' e, quando surgiu a ideia de fazer essa peça com um humorista mais experiente, a vontade que eu tive foi de trazer o Roberto e, para mim, foi um encontro emocionante', lembra o apresentador do 'Donos da Bola', que também é produtor executivo da peça.

Roberto comenta que o espetáculo ficou ótimo e está feliz de poder colaborar. "Eu ajudo ao dar um pouquinho da minha experiência de 59 anos nesse mercado", comenta.

Torcedor do América, Roberto, relembra a época em que jogava futebol pelo Vasco. "Eu não era bom, eu era excelente. Naquela época, para jogar futebol, você tinha que ser, no mínimo maravilhoso. O 'bom' ficava em segundo plano ou no banco. Não é igual a hoje em dia em que qualquer pé de chinelo veste a camisa da Seleção Brasileira e todo mundo diz que é craque", alfineta.

 

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